Título: Essa tal sustentabilidade
Autor: Fariello , Danilo
Fonte: Valor Econômico, 18/04/2008, EU & Investimentos, p. D1
Aplatéia deverá sair hoje com mais dúvidas do que quando entrar na palestra do especialista em difusão de informações financeiras e professor da Universidade de Princeton, Harrison Hong, hoje em São Paulo. Isso poderá decorrer da falta de respostas para as perguntas que ele fará, a começar pelo tema de sua apresentação: Qual o valor da responsabilidade social corporativa? "Ainda não temos todas as respostas sobre isso", ratifica, depois de ter produzido extenso estudo sobre o crescimento do volume de investimentos feitos segundo esses princípios.
Ainda que não se saiba direito o que é essa tal responsabilidade social corporativa, muito menos a concepção mais abrangente de sustentabilidade, o dinheiro corre com rapidez para esse caminho. "Definitivamente, esses investimentos (em ativos socialmente responsáveis) são uma tendência."
De 2005 a 2007, os investimentos socialmente responsáveis cresceram no mundo 18%, enquanto os demais, 3%, afirma Hong. Os fundos globais desse perfil cresceram de 55 carteiras em 1995 para 210 em 2005, passando de US$ 12 bilhões para US$ 179 bilhões. Um em cada nove dólares aplicados por investidores institucionais no mundo segue esses princípios. No Brasil, segundo a Associação Nacional de Bancos de Investimento (Anbid) - que coloca governança corporativa e sustentabilidade no mesmo balaio -, já são 31 os fundos nessa linha, com mais de R$ 2 bilhões de patrimônio.
O Brasil é um dos cenários onde esse mercado mais tende a evoluir, diz Hong. Primeiro, por causa das características das maiores empresas daqui, que têm relação próxima com o meio-ambiente por serem produtoras de commodities. Segundo, porque aqui se desenvolve a idéia da seleção das empresas por esses critérios. O Brasil é pioneiro entre os emergentes na criação do Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE), da qual seu colega de Princeton, José Alexandre Scheinkman, participou. Ambos participam hoje do seminário "Mercado de capitais: o cenário atual e desafios para o futuro", promovido por Ibmec São Paulo e Máquina Finance PR.
As pessoas e o mercado não têm noção exata do que está acontecendo quando se trata de responsabilidade social, diz Hong. "Não se compreende a motivação nem os custos e benefícios", diz. Isso traz um perigo, avalia, porque há uma demanda forte por aplicações do tipo. "Por enquanto, não há critério absoluto e consensual para se incluir empresas nessa categoria."
Há justificativa para algumas críticas ao ISE, diz Hong. Segundo ele, os critérios para seleção são subjetivos demais, como ocorre em projetos similares no mundo todo. "Pode ser injusto escolher um grupo e destacá-lo do resto do mercado." Para ele, faria mais sentido um ranking que mostrasse em que pé estão todas as empresas, para se ter noção de qual o papel desempenhado por companhia e como ela atua em seu setor.
Também é complicado misturar governança corporativa - que, para ele, já tem critérios mais objetivos e consensuais - com sustentabilidade, como faz o ISE, diz. Para ele, há temas conflitantes. Os interesses dos acionistas nem sempre são os mesmos das demais instituições que se relacionam com a empresa. Às vezes podem até ser conflitantes, comenta ele, que, embora crítico, reconhece como louvável a iniciativa de criação do ISE.
Quanto à comparação do desempenho do ISE com o dos outros índices da Bovespa, ele reconhece que não haveria como eles apresentarem rumos muito diferentes. Desde dezembro de 2005, até ontem, o ISE apresenta alta de 96,60%, enquanto o Ibovespa sobe 102,26% no mesmo período. "Eles são muito relacionados porque deles constam empresas muito similares", diz Hong. Para ele, no longo prazo, porém, as empresas com bom nível de responsabilidade social podem mostrar algum diferencial positivo no preço das suas ações. Mas não é essa a principal virtude de se adotar determinados critérios, destaca.
A responsabilidade social e ambiental ajudam mais a gestão da empresa do que o valor de sua ação na bolsa, afirma Hong. Uma companhia com bons padrões tem mais acesso a fontes de capital, que vão além do acionista, o que ajuda sua gestão. Há demanda por investimentos nessa linha de todo tipo, conta. Os valores de acesso ao capital ficam mais previsíveis, assim como os riscos na gestão. Para o acionista, isso também pode implicar menos incertezas, comenta.
"Investimentos mais responsáveis são tendência mundial e o mercado de capitais vai ter de aprender a lidar com isso", diz Hong. Há subjetividade excessiva mesmo entre os investidores institucionais, que puxam essa tendência no exterior, diz. Portanto, é preciso cuidado para as pessoas e as empresas terem noção exata do que fazem, sem escolhas estranhas. "Não falta esperança de que haja virtude nesse caminho."