Título: Gripen lança o NG, nova geração de caça
Autor: Rittner, Daniel
Fonte: Valor Econômico, 24/04/2008, Empresas, p. B6

A gigante sueca Saab pôs à mesa uma nova cartada para ampliar sua presença no concorrido mercado internacional de caças supersônicos e expandiu o leque de opções para renovação da frota da Força Aérea Brasileira (FAB). O protótipo do Gripen NG (New Generation) foi apresentado ontem na cidade de Linköping, ao sul de Estocolmo, um pólo de engenharia aeronáutica e base aérea sueca - versão gelada e pós-desenvolvida da paulista São José dos Campos.

O Gripen NG, que deverá voar em teste pela primeira vez ainda em 2008, é um avanço da companhia em direção à quinta geração de caças de combate. Os suecos garantem que as inovações incorporadas pelo jato o deixam tecnicamente superior ao francês Dassault Rafale, ao Eurofighter Typhoon e ao russo Sukhoi Su-35 - aeronaves que despertam paixão em muitos oficiais da FAB.

O caça promete carregar um conjunto de sistemas eletrônicos (aviônica) de vanguarda e um novo radar AESA, desenvolvido com a francesa Thales. As novidades devem aumentar a eficácia do caça na chamada "guerra eletrônica": a transferência de imagens, às bases terrestres e aos demais aviões em combate, poderá ser feita em tempo real. A capacidade de transmissão de dados chega a 1 gigabit por segundo. Ao piloto, será possível comunicar-se por satélite de qualquer parte do mundo.

Outra inovação é de especial interesse dos militares brasileiros: com maior potência do motor, a autonomia de vôo aumentou exponencialmente. Na comparação com a geração prévia de jatos da Gripen, da família JAS 39, o alcance dos caças subiu de aproximadamente 3 mil para mais de 4 mil quilômetros, sem reabastecimento em vôo, graças à capacidade até 40% maior de carregamento de combustível. Isso tende a enfraquecer as críticas ao avião sueco por parte de especialistas brasileiros, que questionavam a adaptação de um caça nórdico em países de dimensões continentais, como o Brasil.

Em tese, o que ainda poderá separar o Gripen NG do americano F-35 Joint Strike Fighter é a menor capacidade de discrição (stealth) frente ao radar inimigo. As primeiras entregas do novo caça só devem ser feitas em 2015, para Dinamarca e Noruega, se esses países confirmarem o interesse na compra.

O vice-presidente de vendas internacionais e marketing da Saab, Bob Kemp, garantiu "total disposição" da companhia em transferir tecnologia e incorporar o Brasil no desenvolvimento do caça. Essas são pré-condições impostas pelo governo brasileiro para seguir adiante em uma encomenda de aeronaves de quarta geração, como o JAS 39 Gripen, no caso de retomada do extinto projeto F-X, ou para trabalhar em conjunto com uma potência bélica na produção de nova família de caças.

"Toda a tecnologia está disponível para transferência", assegurou Kemp, ressaltando o fato de que os códigos-fonte das aeronaves da Gripen são abertos. Isso permite, teoricamente, fazer adaptações livremente à medida que se incorporam tecnologias próprias ou que se quer equipar o jato com armamentos de outros fornecedores. Na prática, por mexer em um conjunto de tecnologias, não é uma tarefa assim tão fácil. "Nos nossos jatos, é relativamente fácil instalar mísseis fabricados por outros países, o que dá uma flexibilidade extraordinária", rebateu o executivo.

Kemp afirma que, se o governo brasileiro quiser participar do projeto do Gripen NG, é bem-vindo e ainda há tempo. "Não é preciso uma quantidade enorme de dinheiro", avisou. Ele citou o exemplo da Noruega, cujo governo procurou a Saab e decidiu colaborar com US$ 25 milhões anuais no desenvolvimento do caça. Pelo entendimento, a empresa sueca teve liberdade em escolher as áreas de cooperação - a única exigência era que firmas norueguesas trabalhassem em conjunto com os vizinhos nórdicos nas áreas selecionadas. Foram escolhidos os segmentos de comunicação por banda larga e o "data link" (transferência de dados dos caças entre si, para a terra e vice-versa).

A Saab propõe algo semelhante ao Brasil. Nomeado formalmente na semana passada, o diretor-geral da Gripen no país, Bengt Janér enumera algumas possibilidades de parceria. Ele vê a possibilidade de cooperação industrial com a Mectron, para desenvolver a integração dos diversos sistemas presentes nos futuros caças NG, e com a Elbit, para componentes aeroeletrônicos.

"Outro ponto importante é que não competimos com a Embraer como fornecedores, mas a complementamos", disse Bengt. "Vemos recursos industriais e humanos suficientes no Brasil para uma parceria benéfica a ambos os lados", completou a embaixadora da Suécia em Brasília, Annika Markovic, dando o aval do governo. Markovic disse que voltará a convidar os ministros Nelson Jobim (Defesa) e Mangabeira Unger (Assuntos Estratégicos) para uma visita ao país.

A Saab é uma empresa privada, controlada por uma tradicional família sueca, com capital minoritário britânico. A direção da companhia afirma que pode antecipar a entrega dos primeiros caças para 2013 e aposta em um argumento geopolítico para seduzir países como o Brasil. "Somos o único país fora do Conselho de Segurança da ONU que fabrica e exporta jatos. Se você quer controlar o seu futuro, a Suécia é a única possibilidade", propagandeia Kemp.

Apesar da empolgação, especialistas em assuntos militares que estavam na apresentação do demonstrador do Gripen NG faziam algumas ressalvas. Elas passavam pelo fato de que, apesar das promessas, uma parte de eventuais transferências tecnológicas pode esbarrar no fato de que quase um terço dos componentes provém dos Estados Unidos. Um observador comentou, em tom irônico, que os avanços demonstrados no evento não podem esconder o fato de que nenhuma aeronave JAS 39 Gripen participou de combates reais - ao contrário de caças americanos usados para bombardeios no Afeganistão e do Iraque.

De fato, os únicos países que já dispõe de caças da Saab, além da Suécia, são Hungria e República Tcheca. A empresa acaba de fechar contrato para fornecer jatos à Tailândia e também entregará aviões para a África do Sul. Na segunda-feira, a Saab apresenta uma proposta de venda de 126 jatos para a Índia, numa compra que pode chegar a US$ 11 bilhões. E, a partir de agora, começa a jogar todas as suas fichas no Gripen NG, que vende como "o único caça monomotor multifuncional do mundo" - ou seja, pode desempenhar funções de combate, bombardeio, negação do espaço aéreo, apoio a forças terrestres, missões de monitoramento e de reconhecimento.

O repórter viajou a convite da Gripen