Título: De olho no futuro, Embrapa reforça "poupança genética"
Autor: Zanatta , Mauro
Fonte: Valor Econômico, 23/04/2008, Agronegócios, p. B14

Para além das preocupações com o impacto dos alimentos sobre a inflação mundial, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) consolida a estratégia de reforçar a "poupança genética" nacional contra mudanças climáticas, secas, novas pragas e doenças com a substancial ampliação do banco de material genético de grãos, plantas e pólens de várias partes do mundo.

Para assegurar aos pesquisadores "munição" adicional de novas variedades agrícolas, a estatal acaba de acrescentar 40 mil materiais genéticos ao seu banco de germoplasma. Cedidas pelos Estados Unidos, as variedades transformam a coleção brasileira, agora com 150 mil amostras, no quarto maior repositório de espécies vegetais do mundo. No jogo internacional da "poupança genética", o Brasil está atrás só dos conjuntos reunidos por EUA (490 mil), China (390 mil) e Alemanha (160 mil).

Os pesquisadores brasileiros terão, a partir de agora, acesso ao acervo integral do material genético americano derivado de arroz (17 mil amostras) e de soja (23 mil itens). Também estão incluídos outros nove mil variedades de diferentes espécies. "Estamos garantindo munição de longo prazo à rede de pesquisadores brasileiros. Assim, poderemos trabalhar de olho no futuro com materiais novos, de características já estudadas e mapeadas por nossos parceiros, para agregar as particularidades exigidas em cada região produtiva do Brasil", resume o geneticista Luciano Nass, coordenador do programa de intercâmbio do Labex com o Serviço de Pesquisa Agrícola (ARS) americano.

O material armazenado no banco de germoplasma brasileiro será adaptado às condições do Brasil para melhorar a proteção contra doenças, pragas, resistência a altas temperaturas, tolerância à seca, além de avançar em índices de produtividade mais elevados e ciclos de produção mais curtos.

Nascido em Curitiba (PR), o pesquisador Luciano Nass mora há dois anos em Fort Collins, no Colorado, onde atua pela Embrapa em parceria com o Centro Nacional de Conservação de Recursos Genéticos, um dos principais "armazéns" de variedades animais e vegetais do mundo, que usa avançadas técnicas de preservação criogênica de materiais. Nesse período, negociou a ampliação do acervo brasileiro por meio de um acordo de intercâmbio entre o laboratório virtual da Embrapa (Labex EUA), que completa dez anos de atividade, e o Departamento de Agricultura dos EUA (USDA).

Nass lembra que a troca de materiais ficou complicada após a assinatura, em 1992, da Convenção da Biodiversidade (CDB). Os países se fecharam apostando em futuros ganhos financeiros com a genética. Mas a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) conseguiu um tratado para permitir a troca de espécies. Ainda restrito, o intercâmbio beneficia estudos com 35 espécies (milho, arroz, feijão, trigo), mas não inclui importantes materiais, como soja e cana, por resistência dos países de origem das variedades (China e Índia). Os EUA, entretanto, não ratificaram a CDB. "Por isso, seguem promovendo o intercâmbio genético sem restrições".

Na agenda de uma nova fase da cooperação bilateral da Embrapa, estão a ampliação do intercâmbio na área vegetal e a expansão das trocas para os acervos genéticos animais. "Temos conversas para a troca de material de bovinos e peixes", revela Luciano Nass. Em jogo, estão variedades brasileiras armazenadas no Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, com sede em Brasília, coletadas nos Estados de Mato Grosso do Sul e Roraima.

O coordenador do Labex Embrapa nos EUA, o entomologista Félix França, informa que os pesquisadores brasileiros começarão a trabalhar com a "criopreservação", técnica que protege materiais genéticos a 196ºC negativos para avaliar as condições de longevidade das variedades. Duas pesquisadoras foram selecionadas para a nova fase do desenvolvimento da preservação de espécies de mandioca, abóboras, amendoim, fruteiras tropicais, abacaxi, mamão, entre outras. "Vamos desenvolver materiais futuros para casos de calamidades naturais", afirma.