Título: Mendes busca consenso para reduzir MPs
Autor: Basile , Juliano
Fonte: Valor Econômico, 25/04/2008, Política, p. A10

Gilmar Mendes: "A atividade política é lenta porque é complexa" Em sua primeira entrevista como presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) o ministro Gilmar Mendes disse compreender o fato de o governo federal editar medidas provisórias em excesso e o Congresso demorar a votá-las, mas enfatizou que a Corte não se furtará a derrubá-las, quando achar necessário.

Mendes lembrou que o governo chegou a editar MP apenas para destravar a pauta do Congresso e, com isso, permitir a votação da prorrogação da CPMF. Ele disse que o STF acolheu a edição dessa primeira MP, mas não aceitou quando, após o destrancamento da pauta, o governo reeditou outras com o texto idêntico ao daquelas que haviam sido derrubadas pelo próprio governo. "Nós admitimos em nome da governabilidade e da funcionalidade, inclusive meu voto foi neste sentido", disse sobre a primeira votação. "Mas o que aconteceu em seguida? O presidente acabou por reeditar uma MP com o teor idêntico àquela e nós dissemos não".

O tribunal está por um voto de derrubar MPs que concederam créditos extraordinários ao Orçamento deste ano. Ao todo, foram concedidos R$ 25,1 bilhões em créditos deste tipo. O novo presidente do STF reconheceu que o Palácio do Planalto muitas vezes é praticamente obrigado a atender às demandas de vários ministérios e editar várias MPs. Já o Congresso tem dificuldades de chegar a um consenso e, por isso, demora a votá-las. "Muitas vezes temos a tendência de criticar a atividade política e dizer que ela é muito lenta. É lenta porque é complexa. É difícil produzir o consenso e o fato de ser lenta não significa que seja errada".

A solução, segundo Mendes, deve ser obtida num consenso. Uma alternativa seria reduzir o número de MPs para 12 ao ano. "Não sou muito seguro quanto a isso porque podemos entrar num quadro de crise econômica, financeira, que demande uma exceção para esse número", disse o ministro. Outra saída seria manter apenas três MPs em curso para evitar o trancamento da pauta do Congresso. "Seria outro bloqueio", advertiu Mendes. Por último, o fim do trancamento de pauta causaria, segundo ele, outro problema: a indefinição do Congresso que deixaria de apreciar as MPs a tempo.

"Não vamos fingir que o problema seja exclusivo da responsabilidade do Executivo. Há uma crise do processo decisório. Isso é de responsabilidade do Congresso e é preciso que se encontre uma equação."

Gilmar Mendes também reclamou que o Supremo está sendo constantemente chamado para dar respostas em assuntos de competência do Congresso. Ele citou o exemplo da fidelidade partidária e da reforma política. Por outro lado, enfatizou que quando o Congresso demorar a agir ou ficar inerte, o STF irá atuar. Foi o que aconteceu no julgamento das paralisações do funcionalismo. Após 19 anos de espera pela aprovação de uma Lei de Greve para o setor público, o STF mandou aplicar as regras do setor privado.

O ministro também considerou importantíssimo o fato de o STF proteger o direito de a minoria parlamentar abrir CPIs, como ocorreu nos casos das CPIs dos Bingos e do Apagão Aéreo. "Se ficasse nas mãos da maioria não teria havido a instalação da CPI dos Bingos", lembrou. "Então, neste caso a judicialização foi correta porque diante do impasse ou do massacre que a maioria teria sobre a minoria, o STF deu uma resposta."

O ministro criticou a judicialização de todos os problemas do país, sejam nacionais ou individuais. "Vamos tentar quebrar essa cultura exclusivamente judicialista. Vamos usar o Procon, as associações de inquilinos, como mediadores e realizadores do direito. Se a matéria já é pacífica, porque levar ao Judiciário?"

Mendes condenou mais uma vez o abuso de movimentos, afirmou ser inaceitável a invasão de prédios públicos. "Não podemos ter uma repartição pública impedida de funcionar, nem sequer por um dia."