Título: Além das fronteiras
Autor: Fariello , Danilo
Fonte: Valor Econômico, 25/04/2008, EU & Investimentos, p. D1

Há um alvoroço no mercado de fundos brasileiro, mas, desta vez, o motivo está além dos limites do país. Com a definição no início deste ano das normas para as carteiras locais investirem no exterior, gestores com atuação internacional começam a olhar para o segmento brasileiro de fundos, de R$ 1,2 trilhão.

As gestoras HSBC e Gems já oferecem fundos multimercados com parte ou todo o patrimônio investido em fundos lá fora. Participantes globais, como a AllianceBernstein, também já indicaram o interesse em parcerias locais que facilitem a aplicação no exterior. E o mais novo integrante desse clube é a Principal Financial Group, que já possui presença no país por meio de parceria com o Banco do Brasil, da qual é sócia na seguradora Brasilprev.

Hoje efetivamente são poucos os estímulos que os investidores brasileiros têm para buscar alternativas em mercados estrangeiros, mas Fernando Torres Karmy, diretor de gestão de fundos na América Latina da Principal, acredita que, em algum momento, a demanda surgirá. Antes da alta dos juros da Selic para 11,75% ao ano, ele previa que, em 2010, de 3% a 5% do total de recursos aplicados em fundos no Brasil estariam alocados no exterior - algo como US$ 25 bilhões. A perspectiva, porém, foi atrasada para 2011 ou 2012 após o ajuste da Selic.

Por conta do juro ainda alto aqui, os fundos brasileiros deverão começar a investir no exterior principalmente em ativos mais agressivos, como forma de diversificação de riscos, diz Karmy. Ele também lembra que, apesar de o Índice Bovespa ter apresentado ótimo retorno nos últimos anos, outros mercados se destacaram ainda mais, como a bolsa de valores da Rússia. "Em 15 anos, a média das bolsas dos mercados emergentes também bate o Ibovespa, com menor volatilidade", comenta.

No entanto, além do juro alto e do vigor na bolsa nacional, outros fatores devem estimular o investidor brasileiro a ficar no mercado doméstico ainda por algum tempo, diz ele. O câmbio não tem apresentado nenhum estímulo a investimentos externos. Pelo contrário, quem investiu no exterior em dólar no início de 2006 viu sua aplicação perder 28,13% apenas pela apreciação do real diante da moeda americana.

Outro fator é a impressão no mercado nacional de que a situação está mais clara por aqui do que no exterior, desde que aflorou a crise do setor imobiliário americano causada pelas hipotecas de alto risco ( "subprime"), diz.

Faltaria, porém, maior educação financeira ao brasileiro em buscar o mercado externo para investimentos de maior risco, diz ele. "A procura por investimentos fora aumentará conforme o aplicador entender as vantagens disso." Hoje, por exemplo, o Japão é considerado um bom lugar para se aplicar por muitos, mas é preciso que se entenda por que, diz ele. Karmy afirma que o processo natural é os fundos voltados a grandes investidores começarem a aplicar no exterior, para, gradualmente, essa possibilidade chegar ao varejo.

Ele reconhece, porém, que há um limite natural para o percentual de recursos do setor de fundos a ser investido no exterior, porque as pessoas aqui têm obrigações em reais e preferem a proximidade com os emissores dos ativos em que investem. Por isso, o limite de percentual do setor de fundos seria tão reduzido, abaixo de 10% de todo o patrimônio.

Apesar do acordo já existente com o Banco do Brasil, a Principal está negociando parcerias tanto com a BB DTVM, gestora do banco estatal, quanto com outros participantes do mercado, diz Karmy. Segundo ele, não há nada acertado ainda com a gestora do BB, que também dá consultoria à Principal na gestão dos ativos nacionais do fundo Bric da multinacional. "Acredito que a tendência de distribuição de fundos segundo uma arquitetura aberta (em que instituições oferecem a clientes fundos de diversas instituições) nos leve a fazer parcerias com mais gestores." A Principal também avalia a possibilidade de lançar um fundo 100% estrangeiro para brasileiros superqualificados. A gestora tem US$ 311,1 bilhões de ativos sob gestão e atende cerca de 18,6 milhões de clientes no mundo.

O mercado brasileiro passou a ser focado pela Principal a partir do momento em que o governo federal permitiu a aplicação de parte dos ativos do fundos no exterior (até 20%, para multimercados) e a criação dos fundos para aplicar 100% fora. Mas o Brasil atrai principalmente porque representa 82% do mercado de fundos da América Latina, além de ser o local de maior avanço do setor na região, diz.