Título: Receita teme pressão de lobbies na votação da MP 413 hoje na Câmara
Autor: Galvão, Arnaldo
Fonte: Valor Econômico, 28/04/2008, Política, p. A6

A conversão da Medida Provisória 413 em lei será mais difícil do que imaginam governo, usineiros e distribuidoras de combustíveis. Depois de complicada negociação para redistribuir a carga tributária de PIS e Cofins na cadeia produtiva do álcool, dois tradicionais "lobbies" ameaçam sua votação, prevista para hoje no plenário da Câmara. O primeiro deles é o que procura mudar a tributação sobre refrigerantes. Os pequenos produtores alegam que é injusto cobrar sobre quantidades e defendem que a base de cálculo seja o preço. A segunda recorrente pressão é a que procura premiar o pagamento de dívidas tributárias parceladas trazendo a valor presente o débito parcelado a perder de vista.

Apesar de não haver relação entre esses temas e as normas publicadas em janeiro na MP 413, esse tipo de mistura jurídica tornou-se comum no Congresso e, não raro, tumultua a aprovação em plenário. A medida provisória perderá validade em 4 de junho e ainda terá de passar pelo Senado.

A Receita Federal e outros setores do governo resistem a esses dois "lobbies" que tentam pegar carona na MP 413. No dos refrigerantes, a mudança da tributação sobre quantidade ("ad rem") para a que incide sobre o preço ("ad valorem") é considerada um retrocesso porque abre brechas ao sub-faturamento e à sonegação. A proposta de trazer a valor presente dívidas tributárias parceladas significa, para a Receita, dar descontos de até 90% a contribuintes já incluídos em generosos programas de refinanciamento, como o Refis.

O relator da MP 413, Odair Cunha (PT-MG), diz que o pleito dos pequenos produtores de refrigerantes - apelidado de lobby das tubaínas - foi apresentado pela bancada do PMDB e liderada pelo deputado Tadeu Filipelli (DF). Ele é sócio da Refrigerantes Cerradinho, fabricante do popular Pocotó.

Cunha considera que, nas contribuições PIS e Cofins, o pedido de Filipelli é justo. Mas os 31 artigos que tratam de refrigerantes podem atrasar ainda mais a votação e a matéria ainda tem de ir ao Senado. Quanto ao Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), Cunha diz ser contrário à mudança.

O vice-líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), também pondera que o pleito do PMDB é justo mas "veio na última hora". O mais adequado, diz, seria apresentá-lo no Senado. "É uma reivindicação justa, mas o governo ainda não tem posição", afirma. Na sua avaliação, o maior problema para aprovar a MP 413 é a proposta de quitação das dívidas tributárias. Ele revela que a idéia é defendida por líderes de vários partidos, consta do relatório de Cunha, mas a negociação não está "ajustada".

As duas "novidades" que podem aparecer no texto da conversão da MP 413 preocupam a Receita. Não é a primeira vez que os parlamentares tentam aprová-las e, certamente, não será a última. O Valor procurou ouvir Filipelli e a Receita, mas não obteve comentários.

O superintendente do Sindicato Nacional das Indústrias de Cerveja, Marcos Mesquita, alerta que o lobby das tubaínas é idêntico ao das pequenas cervejarias e ameaça o equilíbrio do mercado ao abrir espaço para sub-faturamento, sonegação e concorrência desleal. "Querem a tributação sobre o preço para lançarem valores fictícios nas notas fiscais. É uma verdadeira reforma tributária que querem passar numa MP", critica.

Na opinião de Mesquita, repor alíquotas "ad valorem" é voltar 20 anos no tempo e confronta o esforço da Receita e das secretarias de Fazenda dos Estados para aperfeiçoar os controles sobre a arrecadação. O objetivo do governo com a MP 413 é exatamente concentrar nas maiores empresas da cadeia produtiva do álcool, as usinas, a cobrança de PIS e Cofins. Como a resistência foi forte na Câmara, um acordo foi fechado para deixar com as distribuidoras 60% do recolhimento dessas contribuições.