Título: Executiva visa à candidatura própria
Autor: Jorge, Danilo
Fonte: Valor Econômico, 28/04/2008, Política, p. A10

Sem um nome com o carisma de Lula para colocar na urna eletrônica, em 2010, o PT aposta as fichas no fortalecimento do partido para atravessar com sucesso a primeira eleição presidencial que vai disputar sem Luiz Inácio Lula da Silva como candidato, desde 1989.

Essa é a avaliação que permeia o veto da Executiva Nacional petista à aliança entre o PT do prefeito Fernando Pimentel e o PSDB do governador tucano Aécio Neves, na eleição para prefeito de Belo Horizonte. A linha dura petista aparece no placar da votação: 13 votos a 2.

Pimentel considerou "deselegante" e até "grosseira" a nota expedida pela Executiva Nacional, em relação a Aécio Neves. Mas o endurecimento em relação às alianças é praticamente unanimidade na Executiva. "Quisemos deixar claro que existe um grupo de partidos que defende o nosso projeto de governo e outros que são contrários, como o PSDB e o DEM", diz o secretário-geral do PT, José Eduardo Cardozo (SP). "Contra esses, devemos estar contra".

Em resumo, o PT acha que não pode se confundir agora com quem deve enfrentar em 2010, caso do PSDB e de Aécio Neves. A decisão deixa claro também a intenção do partido de ter um candidato puro-sangue à sucessão de Lula, apesar dos acenos do presidente a aliados como Ciro Gomes, o PMDB e o próprio Aécio Neves, um tucano aliado.

O fato de que o veto da cúpula está impregnado pela sucessão não passou despercebido de Fernando Pimentel. Mas as suspeitas do prefeito de Belo Horizonte vão mais longe, pois ele vê no episódio também uma reação a seu apoio à candidatura da ministra Dilma Roussef (Casa Civil). Dilma fez política no Rio Grande do Sul, mas é mineira de nascimento.

O ânimo da Executiva Nacional já era contrário ao acordo mineiro, mas o ambiente incendiou de vez quando foi lido um documento aprovado pelo Diretório Municipal de Belo Horizonte, escrito por Pimentel. No texto, o prefeito conta que ele havia procurado Aécio para negociar a aliança. Mais ainda, que a parceria PT-PSDB seria boa e significaria um novo marco nas relações entre os dois partidos.

Para os presentes, aprovar a aliança era o mesmo que dizer que o PT se rendeu a Aécio Neves, que disputa com o governador José Serra (SP) a indicação do PSDB para disputar a Presidência da República. Depois disso, segundo avaliaram integrantes da Executiva, ficaria mais difícil construir uma candidatura própria para 2010. Sempre seria lembrado que o PT se aliou ao PSDB no início da caminhada de Aécio para se tornar candidato ao Palácio do Planalto.

Não é a primeira vez que a cúpula do PT interfere em assuntos internos de uma de suas seções, mas é provavelmente a de maior repercussão e a primeira tomada preventivamente: a convenção do PT só ontem aprovou a aliança com o PSB, que entrará com o candidato, mas é a indicação comum de Aécio e Pimentel. "Não somos contra a aliança com o PSB, que é nosso irmão. O que não queremos é que ele traga junto o PSDB", diz o secretário José Eduardo Cardozo.

Em 1998, a direção nacional interveio no Rio de Janeiro para retirar a candidatura de Vladimir Palmeira ao governo estadual. No ano em que Lula concorreu tendo Leonel Brizola como candidato a vice, o partido foi obrigado a apoiar no Rio a chapa Anthony Garotinho, então no PDT, e a petista Benedita da Silva. Em 2004, a cúpula cogitou intervir em Fortaleza, onde Luizianne Lins se apresentou como candidata apesar da decisão partidária de coligar com o PCdoB.

A questão mineira deve ter desdobramentos nas instâncias partidárias e talvez até no Judiciário. Mas se o comando do PT impõe a linha dura em relação aos companheiros de Minas Gerais, por outro lado não tem conseguido atar com eficiência outra ponta de sua estratégia eleitoral de 2010: segurar o PMDB numa aliança para a sucessão de Lula - o partido, que é o de maior capilaridade nacional, não teria candidato próprio ou indicaria o vice na chapa.

O maior golpe sofrido pela cúpula petista, nesse sentido, foi a decisão do ex-governador Orestes Quércia de apoiar a reeleição do prefeito Gilberto Kassab, em São Paulo. O ex-ministro José Dirceu, arquiteto das alianças forjadas pelo PT até chegar o poder, lamentou a decisão: "Continuamos a colher os frutos amargos de nossa indecisão com relação ao PMDB no passado e dos erros de nossa estratégia aliancista", escreveu no blog que mantém na internet.

Na atual cúpula pemedebista, o deputado Michel Temer, presidente do partido, e o ministro Geddel Vieira Lima (Integração Nacional) são os principais fiadores da aliança que elegeu Arlindo Chinaglia presidente da Câmara, deu estabilidade parlamentar ao governo na Câmara e tenta alinhavar o acordo em relação às eleições de 2010.

A adesão de Quércia a Kassab, o que na prática significa um alinhamento com a candidatura do tucano José Serra a presidente, foi o maior golpe na planejada parceria, pois se deu justamente no campo de Temer, o maior colégio eleitoral do país. Em Salvador, o PT também não conseguiu abrir mão de disputar a prefeitura, que é comandada pelo PMDB de Geddel Vieira Lima.