Título: Fazenda traz desconforto a clima favorável pós-Copom
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 28/04/2008, Opinião, p. A14
A ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) que elevou a taxa básica de juros (Selic) trouxe poucas novidades em relação às mensagens sobre a conjuntura transmitidas anteriormente pelo Banco Central (BC). O documento, divulgado na quinta-feira, explicita os fatores que estão pressionando a inflação e que justificam, na avaliação do BC, postura de maior cautela na condução da política monetária. A boa notícia é que a ata consolidou a percepção do mercado de que o ritmo do aperto monetário será forte, porém, breve.
Ao justificar a elevação da Selic de 11,25% para 11,75% ao ano, a diretoria do BC explicitou dois objetivos. O primeiro é contribuir para adequar o ritmo de expansão da demanda ao da oferta. O segundo é evitar que pressões originalmente isoladas sobre índices de preços provoquem a deterioração das expectativas e do próprio cenário futuro de inflação.
Na ata, o BC informa que a projeção oficial de inflação para 2009 ultrapassou a meta de 4,5%. Além disso, adverte que é maior hoje a probabilidade de haver uma correção nos preços dos combustíveis ao logo deste ano. Persistindo num movimento de alta que já dura vários anos, o preço do barril de petróleo atingiu US$ 120 na semana passada. Apesar disso, os preços dos combustíveis permanecem inalterados no mercado interno.
A contenção do custo da gasolina e de outros derivados de petróleo tem limite. Na quinta-feira, o presidente da Petrobras, Sérgio Gabrielli, esteve no Palácio do Planalto conversando com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre essa questão. Infelizmente, não há lógica econômica que justifique, num cenário internacional adverso, a manutenção dos preços dos combustíveis nos patamares atuais.
O BC está olhando para esse problema com justificada preocupação. É simples entender por quê. O bom comportamento dos preços administrados tem contribuído sobremaneira para moderar o aumento da inflação. Sem essa contribuição, os índices de preços estariam muito mais elevados. Duas evidências: as tarifas de energia elétrica residencial estão entre os cinco itens que mais contribuíram para a redução do IPCA nos 12 meses concluídos em março. O preço da gasolina está entre os dez que mais ajudaram a segurar a inflação no mesmo período.
Ao mesmo tempo em que chama a atenção para as incertezas da conjuntura, a ata do Copom não sinaliza descontrole inflacionário. A aposta no mercado, embora não haja consenso quanto a isso, é a de que Selic deverá subir mais 1,5 ponto percentual até o fim do ano e que isso será suficiente para trazer as expectativas de inflação de 2009 para a meta de 4,5%, permitindo que a economia siga crescendo, mas num ritmo menor que o atual - a expectativa do BC é que o PIB expanda 4,8% em 2008.
O mercado entendeu perfeitamente a mensagem. Isto significa que o BC, com o comunicado da Selic e a ata do Copom, diminuiu incertezas quanto à intensidade e à duração da alta dos juros, dando previsibilidade ao setor privado. A resposta dos agentes à mensagem foi imediata: os juros futuros declinaram.
O clima de estabilidade só se alterou depois que informações, supostamente originadas no Ministério da Fazenda, deram conta de que o governo, em reação ao aumento da Selic e a uma suposta desvalorização adicional do dólar, prepara novo aumento do IOF incidente sobre investimentos de estrangeiros em títulos públicos. O ministério só desmentiu a informação cinco dias depois de veiculada pela imprensa e, mesmo assim, por um funcionário do terceiro escalão. O ministro Guido Mantega falou sobre o assunto, também para negá-lo, seis dias depois.
O problema é que, quando instituiu o IOF em março, Mantega encheu os pulmões para avisar que, se a dose então aplicada - de 1,5% - não funcionasse, não hesitaria em aumentá-la. Plantou a idéia de que, a partir de agora, o governo "não permitirá" a ocorrência de déficits em conta corrente. Diante da ameaça e dos recentes rumores da Fazenda, os juros futuros aumentaram, revertendo o clima de confiança. Difícil é saber a quem interessa promover a instabilidade.