Título: Barreira da UE à carne gera bate-boca
Autor: Zanatta , Mauro
Fonte: Valor Econômico, 29/04/2008, Agronegócios, p. B13

As tumultuadas relações comerciais entre Brasil e União Européia ganharam ontem um novo capítulo. Em áspero debate sobre o embargo à carne bovina nacional, pecuaristas do país e parlamentares europeus trocaram acusações, críticas e cobranças mútuas em temas de defesa agropecuária, preservação ambiental e subsídios.

Em visita de uma semana ao país, os 12 deputados do Parlamento Europeu ouviram, em tom nada diplomático, afirmações de que o embargo, anunciado no início de fevereiro deste ano, foi motivado por questões comerciais "de reserva de mercado" e alimentado por disputas políticas internas do bloco europeu. Na reunião, realizada pela Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA), os pecuaristas também apontaram a persistência de focos do mal da "vaca louca" na UE, o alto custo de produção da carne européia e criticaram as medidas protecionistas para a agricultura defendidas na UE.

No mesmo tom hostil, os europeus reagiram às cobranças. O presidente da Comissão de Agricultura do Parlamento da UE, o deputado britânico Neil Parish, disse que o Brasil precisa "cumprir as regras" exigidas pelo bloco, "e não negar os problemas", para retomar as exportações de carne bovina. O vice-presidente da comissão, o alemão Friedrich-Wilhelm Baringdorf, defendeu a "sobrevivência" dos produtores do continente contra uma avalanche de produtos baratos brasileiros e a eurodeputada irlandesa Mairead McGuinness resumiu o espírito dos parlamentares: "O cliente é quem tem razão". Em comum, os três parlamentares têm as raízes no setor rural. Parish e Baringdorf são produtores e a economista agrícola McGuinness cobriu temas rurais na Irlanda.

Desafiado a provar as boas intenções por trás do embargo à carne bovina nacional, Neil Parish, que coordenou os debates pela proibição das importações brasileiras, foi duro: "A melhor forma de resolver é não negar os problemas", disse. "Se vocês querem voltar a exportar (...), que cumpram as normas porque há problemas e sete informes [da UE] provam isso". E concluiu: "Temos normas para a importação de carne e as regras para o Brasil não são tão estritas quanto a que exigimos dos nossos produtores". Parish acusou o Brasil de ter "focos [de aftosa] que não foram informados" à Organização Mundial de Saúde Animal (OIE) e à UE. "Está no relatório do FVO [responsável por inspeções veterinárias no Brasil]". Neil Parish também sugeriu aos pecuaristas brasileiros um questionamento direto aos EUA. "Se colocam a UE, porque não colocam os Estados Unidos no banco dos réus, que também importam a carne de vocês?"

Os europeus atacaram questões ambientais no Brasil. "Sabemos que há boa vontade, mas questiono se há forças na Amazônia que garantam não haver desmatamento", disse Parish. E insinuou que o gado devasta a floresta: "A produção se faz em áreas que poderiam ser de floresta. Nós subsidiamos [o campo] por questões ambientais".

Vice-presidente da comissão, Friedrich-Wilhelm Baringdorf, aproveitou o contra-ataque de Parish e disse que a UE tem conhecimento das "dificuldades do Brasil" em cumprir as regras de rastreamento, mas que a legislação da UE deve ser respeitada. "Quero que os padrões da Europa sejam impostos aos outros países. Vocês têm custos de produção mais baixos, mas queremos sobreviver. Defendemos nosso mercado assim como os senhores defendem o vosso", disse. Para ele, o Brasil "não pode ser demasiado ambicioso" ao acreditar que alimentará o mundo.