Título: Ingleses querem advogar no Brasil
Autor: Thiago Vitale Jayme
Fonte: Valor Econômico, 16/02/2005, Legislação & Tributos, p. E1

O ministro adjunto de Assuntos Constitucionais do Reino Unido, David Lammy, está no Brasil para uma tarefa árdua. Desde sábado, tenta convencer os grandes escritórios de advocacia de São Paulo e Rio de Janeiro e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de que a liberalização dos serviços jurídicos no país é um bom negócio. O político corre o risco de sair do país sem conseguir articular a aprovação de alterações para permitir a atuação de firmas britânicas em cortes brasileiras. Ontem, Lammy encontrou-se com o presidente da OAB, Roberto Busato. Expôs a reivindicação inglesa. Argumentou que no Reino Unido há liberdade de atuação para escritórios estrangeiros. "Perguntei ao ministro se os advogados estrangeiros podem atuar nas cortes inglesas. Ele disse que não. Então, eu falei que nossa legislação é praticamente igual a deles e que não há no que evoluir", afirma Busato, ao comentar a reunião. Hoje, no Brasil, os advogados de outros países podem atuar como consultores, sem poder representar clientes nos tribunais. No Reino Unido, o procedimento é parecido com o brasileiro e os advogados estrangeiros podem atuar lá como uma espécie de consultores. "A segurança jurídica é um elemento muito importante no Brasil, pois o investimento é fator-chave para o êxito do país em um futuro próximo. E a liberalização dos serviços jurídicos é ponto indispensável para o bom aporte de investimentos", afirma Lammy. Ele apresenta dois benefícios principais que a atuação dos serviços jurídicos poderão render ao país. "São duas as frentes. Primeiro, os escritórios britânicos podem ajudar as empresas brasileiras que quiserem disputar espaço, operar e crescer na economia brasileira e mundial", elenca. E completa: "Além disso, para que as empresas exportem mais e invistam em outras economias, é fundamental que elas possam contratar advogados com profundo conhecimento da legislação internacional. É por isso que Coréia do Sul, Malásia, Índia e o Japão estão implementando a liberalização". Para o ministro britânico, no ambiente globalizado onde a economia mundial se sustenta, é indispensável a "liberalização dos serviços, inclusive dos jurídicos". Lammy reconheceu a dificuldade na missão pelo Brasil. Esteve com advogados cariocas nos primeiros três dias da viagem. Ontem, visitou a OAB. Amanhã, encontra-se com o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, e vai a São Paulo encontrar-se com advogados da capital paulista. Ao comentar a receptividade dos encontros, disse existir "uma mistura nas respostas" recebidas. Ele revelou que, no Reino Unido, atuam mais de 200 firmas de mais de 35 países. O ministro britânico tenta mostrar aos advogados que não haverá disputa dos escritórios do Reino Unido pelo espaço hoje ocupado pelos brasileiros. "Os serviços de interesse dos escritórios britânicos no Brasil representam 1% do trabalho dos mais de 400 mil advogados brasileiros. E o retorno, em termos de investimentos em petróleo, setores financeiros e de títulos públicos é muito mais significativo", diz. Nenhum dos argumentos sensibiliza Busato. "Defendemos o princípio da reciprocidade. Se nós não podemos atuar nas cortes britânicas, não há motivo para permitir a atuação dos advogados estrangeiros nos tribunais brasileiros", diz. Busato defende a manutenção do atual sistema jurídico nacional. Os advogados estrangeiros podem atuar como consultores de empresas brasileiras que queiram atuar em outros países. Esses profissionais são cadastrados na OAB, sem necessidade de participar do exame da Ordem. "Hoje, o Brasil está no mesmo nível de restrições e abertura da Inglaterra", afirma.