Título: Técnicos desaprovam método da AES Tietê para vender créditos de carbono
Autor: Marta Watanabe
Fonte: Valor Econômico, 17/02/2005, Brasil, p. A2

Sob plena vigência do acordo de Kyoto, a AES Tietê está sofrendo os impactos práticos das indefinições relacionadas às condições para participação de projetos brasileiros de reflorestamento no Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL). O painel de metodologia do MDL, formado por técnicos de vários países do setor privado e do setor público, recomendou a desaprovação do método desenvolvido pela AES para seu projeto de reflorestamento do entorno da usina hidrelétrica instalada em São Paulo. Este foi o primeiro projeto com metodologia para reflorestamento apresentado por empresa brasileira e o segundo do mundo. A companhia espera captar pelo menos US$ 1,4 milhão com a venda de créditos de carbono. Ao recomendar a desaprovação da metodologia, o painel tocou no tratamento das chamadas áreas de preservação permanente, um ponto que ainda está indefinido e que poderá viabilizar ou não a participação de projetos de reflorestamento brasileiros no mercado de créditos de carbono. A recomendação diz que não está clara a voluntariedade do projeto. A empresa só poderia vender créditos de carbono dentro do MDL caso seu plano seja considerado voluntário. Se estiver sendo atendida apenas uma obrigação legal, não existiria voluntariedade. Um dos aspectos levantados pela recomendação foi justamente baseado em obrigações previstas pelas leis brasileiras. Segundo a legislação ambiental do país, as empresas são obrigadas a conservar a vegetação de áreas de preservação permanente. São consideradas dessa forma a área de 100 metros contados da linha d'água de represas de hidrelétricas. O projeto da AES prevê o reflorestamento de uma área que está a uma distância de 30 metros da linha d'água, explica Demóstenes Barbosa da Silva, diretor de gestão e meio ambiente e mercado de carbono do grupo AES no Brasil. O diretor sustenta, porém, que a legislação determina apenas que a empresa não intervenha de modo a prejudicar a recuperação natural da vegetação. "O nosso projeto não quer prejudicar isso, quer apenas acelerar essa recuperação da natureza com um reflorestamento que usará 80 espécies nativas da mata atlântica." Pelos cálculos da empresa, o projeto duraria aproximadamente nove anos, período no qual poderá capturar 367 mil toneladas de carbono. A um valor de US$ 4 a tonelada de carbono, a empresa espera conseguir valor superior a US$ 1,4 milhão com a venda dos créditos. O investimento total previsto é de R$ 15 milhões. Silva diz que todas as críticas feitas pelo painel de metodologia são bem-vindas pela AES e que estão sendo levadas em consideração para aprimorar o projeto. A empresa também está reunindo pareceres jurídicos para defender a sua interpretação da legislação. O especialista em meio ambiente Fernando Tabet, do escritório Mattos Filho Advogados, lembra que há uma outra discussão a respeito de obrigações previstas na legislação ambiental. "Não se sabe ainda qual será o tratamento dado quando as empresas simplesmente não seguem a legislação. Ainda se discute se o que deve prevalecer para definir a voluntariedade é a previsão legal ou a prática de mercado." Se for a prática, diz ele, mesmo que simplesmente atendam às previsões legais, muitos projetos poderão participar do MDL.