Título: Fraga comemora, mas sugere que país ataque deficiências
Autor: Vieira , Catherine
Fonte: Valor Econômico, 02/05/2008, Finanças, p. C6
Armínio Fraga: "O investment grade é muito bom, mas é apenas uma etapa no caminho para acelerar o desenvolvimento" Ao ser surpreendido pela notícia do grau de investimento para o Brasil, no aeroporto de São Francisco, onde tomava um vôo para retornar ao Rio, o economista Armínio Fraga comemorou e se lembrou de quando, ainda em 2000, época em que era presidente do Banco Central, mencionou pela primeira vez num seminário que deveríamos ter como objetivo buscar essa classificação de risco. "Naquela época ninguém levava muita fé nisso", lembra. Mas se acredita que o momento é, sem dúvida, para se orgulhar e comemorar, Fraga também lembra que atingir esse feito não significa que é hora de cruzar os braços.
"O investment grade é uma coisa muito boa, sem dúvida, mas não é a única, é apenas uma etapa cumprida num caminho para acelerar o desenvolvimento", observa o ex-presidente do BC, hoje sócio da gestora Gávea Investimentos. Para ele, o país ainda precisa nos preocupar com questões nas quais ainda não somos tão graduados quanto deveríamos. "Ainda precisamos buscar essa excelência em áreas como a educação, a infra-estrutura e no controle de gastos do governo", resume Fraga.
Embora até ontem ele ainda não tivesse trocado idéias com os investidores estrangeiros com quem se relaciona, para o economista, sem dúvida a certificação concedida pela Standard & Poor's vai ajudar a atrair capital e interesse dos estrangeiros para os ativos brasileiros. Porém lembra que alguns efeitos disso já estavam nos preços e nos indicadores de mercado. Com isso, Fraga avalia que, o câmbio, por exemplo, apesar do forte impacto sofrido na última quarta, já vinha, de certa maneira embutindo uma expectativa da reclassificação de risco. Do ponto de vista estritamente financeiro, diz, o spread do Brasil já se aproximava do ponto indicativo do grau de investimento.
Ele lembra, no entanto, que muitas vezes a ausência dessa certificação de investimento mais seguro não significava a restrição fundamental para investimentos como no segmento de infra-estrutura. "Há questões como a da incerteza jurídica, regulatória. A promoção ajuda, mas não devemos perder de vista os demais pontos."
O crescimento dos gastos deve ser uma outra preocupação importante para continuar no caminho virtuoso, na avaliação do ex-presidente do BC. "O crescimento do gasto público precisaria ser revertido ou, no mínimo, contido", afirma. Com essa postura, acredita Fraga, o governo daria uma ajuda extra ao BC para manter a estabilidade da economia, que deve continuar sendo um objetivo constante.
Na visão de Fraga, a questão do juro hoje preocupa mais que a do câmbio. Uma taxa de juro real de 7%, diz ele, assusta mais do que um câmbio de R$ 1,66 no momento atual, em que as commodities estão com preço muito superior ao de um ou dois anos atrás. Fraga avalia que um cenário em que o BC tem de lidar com um aumento mais veloz da inflação após um período de expansão nos gastos públicos e de crescimento acelerado do volume de crédito no país parecem gerar uma equação mais delicada na política monetária do que na questão cambial.
Feitas todas as considerações, porém, o ex-presidente do BC retoma um clima de quem não quer estragar a hora da festa. "É um momento de comemorar, sim, é algo muito bom, fico feliz e, entre muitíssimas outras pessoas, é claro, também me sinto parte dessa história", conclui.