Título: Déficit com a China pode triplicar este ano
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 06/05/2008, Brasil, p. A3

Emiliano Capozoli/Valor Rodrigo Tavares Maciel, do conselho empresarial Brasil-China: pauta do país ainda é fraca em manufaturados O Brasil - que em 2007 concentrou 70% de suas exportações à China em minérios, sementes, oleaginosas e combustíveis - têm chances de continuar aumentando suas vendas aos chineses em ritmo maior que para o resto do mundo, mesmo que o país asiático desacelere seu ritmo de crescimento. O aumento das vendas de manufaturados chineses ao Brasil (de US$ 3 bilhões em 2001 para US$ 23 bilhões em 2007), contudo, transformou em déficit de US$ 1,87 bilhão, no ano passado, o que era, até 2006, um constante superávit comercial. Neste ano, o déficit até abril já chegou a US$ 2,09 bilhões e pode triplicar, prevêem analistas.

"Neste ano devemos ter um déficit bem maior, de US$ 5 bilhões a US$ 6 bilhões", prevê o secretário-executivo do Conselho Empresarial Brasil-China, Rodrigo Tavares Maciel. Mais de 50% das importações de produtos da China são de máquinas, peças e equipamentos para a indústria brasileira, o que indica aumento de investimentos na produção. Porém, além do forte crescimento na compra de bens de consumo chineses, o Brasil vem perdendo espaço para os concorrentes asiáticos em seus principais mercados - Argentina e EUA.

Não há sinais de que o enfoque no mercado interno adotado pela China vá trazer alívio para os concorrentes dos chineses nos mercados externos. Enquanto espera que o lançamento da política industrial possa dar fôlego aos setores mais afetados pela concorrência chinesa, o governo criou um grupo de trabalho para permitir às empresas brasileiras aproveitar as oportunidades daquele mercado.

Há problemas logísticos, de cadeias de distribuição, burocracia e exigências de associação na China, mas isso, para os especialistas, não justifica a pequena presença do Brasil em um mercado com tamanho potencial de crescimento, argumenta Tavares Maciel. "A China é o maior comprador de máquinas do mundo, importou mais de US$ 400 milhões no ano passado, mas nossa pauta para lá é fraca em manufaturados", lamenta.

Baseado em pesquisas com empresários brasileiros, ele aponta, como principal motivo desse desempenho a falta de iniciativas das empresas. "Nossa maior barreira para entrar no mercado chinês é o desinteresse no Brasil."

O mercado chinês pode sofrer abalos, porém, sob efeito da crise iniciada nos Estados Unidos, por problemas no mercado imobiliário. Os técnicos do Fundo Monetário Internacional (FMI) e outros especialistas já prevêem uma desaceleração de até dois pontos percentuais no crescimento da economia da China. Parte dessa queda é atribuída à decisão das próprias autoridades chinesas, que adotaram medidas de desaquecimento econômico e desestímulo aos investimentos para enfrentar a pressão inflacionária e o risco de excesso de capacidade no parque produtivo do país.

Há quem afirme que a redução pode embutir boas notícias até para os países da América Latina beneficiados pela voracidade do consumo chinês. "Ainda que a China desacelere dois a três pontos, terá um crescimento enorme", diz o economista-chefe e diretor-adjunto do Centro de Desenvolvimento da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), Javier Santiso.

A resistência da China cria um centro adicional de dinamismo econômico, capaz de impedir que a desaceleração americana tenha os mesmos efeitos negativos que no passado sobre as economias latino-americanas, diz ele. A sustentação da demanda chinesa e a prioridade do governo à estabilidade garante o mercado para mercadorias como grãos, oleaginosas e carnes, e deve garantir preços altos para as mercadorias que têm sustentado bons resultados no comércio exterior da maior parte da América Latina.