Título: Finalmente, protocolo de Kyoto entra em operação
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Fonte: Valor Econômico, 17/02/2005, Opinião, p. A14

Sete anos atrás, quando foram aprovados os termos do Protocolo de Kyoto, as questões ecológicas estavam no centro do debate internacional. O risco de rompimento da camada de ozônio com as emissões do famoso CFC - cloro fluor carbono - mobilizou as empresas, que passaram a usar técnicas apropriadas para evitar aquele efeito, um dos responsáveis pelo aquecimento da temperatura na Terra. As geladeiras feitas à base daquele gás, utilizado então no processo de refrigeração, já praticamente desapareceram do planeta. A iniciativa mostrou que a proteção ao meio ambiente deve estar acima de tudo, inclusive dos interesses empresariais mais imediatos. Por isso mesmo, não se entende a posição do governo dos Estados Unidos, que prefere manter-se afastado do protocolo de Kyoto, como uma espécie de guardião da poluição mundial que afeta a toda a humanidade. São os principais poluidores do mundo, responsáveis por quase um quarto da emissão do total de gases poluentes que explicam o chamado efeito estufa. O documento, que entrou em vigor na quarta-feira, teve adesão de 141 países, entre os quais 30 industrializados. O objetivo é reduzir em 5,2%, em média, entre 2008 e 2012, as emissões dos seis gases que provocam o efeito estufa: dióxido de carbono, metano, óxido nitroso, hidrofluorcarbono, perfluorocarbono e hexafluorocarbono de enxofre. Ainda que a ratificação do documento envolva países responsáveis por pouco mais da metade (apenas 55%) da emissão de dióxido de carbono - esse é o mínimo necessário para que o protocolo tivesse validade jurídica - e apesar de vir com algum atraso (só pôde entrar em vigor depois da adesão da Rússia, no final de 2004), a iniciativa é prova da crescente conscientização da necessidade de se preservar o meio ambiente para o benefício das futuras gerações. Por sorte, essa preocupação também existe nos Estados Unidos, a despeito do posicionamento do governo do presidente George W. Bush. Do total de 50 estados da federação norte-americana, 28 estão tomando providências que ajudam a reduzir a produção de gases poluentes. Várias empresas multinacionais daquele país estão atentas à problemática da proteção ambiental e têm investido no desenvolvimento de técnicas para aplacar e até eliminar a poluição provocada por suas unidades de produção. Do ponto de vista concreto, mesmo que limitado em termos de abrangência, a vigência do protocolo de Kyoto vai obrigar os países da União Européia a cortar em 8% as emissões de gases. O Japão está comprometido com um corte de 5%. Os países em desenvolvimento não precisaram firmar compromissos para a redução da emissão de gases poluentes e essa é uma questão sempre levantada pelos críticos da forma como o acordo foi montado. Alega-se que a poluição tende a aumentar nos próximos anos justamente nos países que ainda estão em processo de industrialização, sendo a China o principal vilão. Sem dúvida essa é uma relevante preocupação e já se prevê que dentro de alguns anos o protocolo tenha de ser reavaliado de modo a acomodar metas para os países em desenvolvimento, tratados até aqui mais como vítimas do que propriamente como causadores da poluição. Por enquanto, uma importante válvula de escape vai ajudar os países industrializados signatários a cumprir seus compromissos ao mesmo tempo em que permitirá aos menos desenvolvidos manter-se dentro de limites admissíveis de poluição. Trata-se do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, ou MDL, criado em 1997 a partir de uma proposta brasileira apresentada na Conferência de Kyoto. Este instrumento prevê que os industrializados possam cumprir suas metas através de "créditos de carbono", papéis que vão contabilizar os resultados de projetos não poluentes implementados nos países menos desenvolvidos com investimentos que contribuem para o desenvolvimento sustentado. Esses papéis poderão ser comercializados no mercado secundário, abrindo assim espaço para que a proteção ao meio ambiente também seja motivo de interesse do mercado financeiro. Isso tende a ampliar o interesse pelo Brasil no exterior, além de contribuir para a melhoria da infra-estrutura sanitária no país.