Título: Montadoras temem perder investimentos em novos carros
Autor: Raquel Landim
Fonte: Valor Econômico, 17/02/2005, Especial, p. A16

Os dirigentes da indústria automobilística no Brasil estão preocupados não apenas em perder para os chineses os contratos de exportação para Europa e Estados Unidos, como, mais grave ainda, ver as matrizes das multinacionais do setor optarem pelo país asiático para os investimentos nos projetos dos automóveis a serem lançados daqui para a frente. "Hoje já estamos disputando com China e países do Leste Europeu clientes de exportação e também a locação dos investimentos", afirma o presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Rogelio Golfarb. Ao comparar os dois países, as direções mundiais das montadoras percebem, lembra Golfarb, que as tendências de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) e de exportações da China "são mais sólidas que as nossas". Embora os executivos da indústria automobilística sustentem que os chineses estão ainda longe de atingir o nível de qualidade do Brasil nesse setor, os números mostram que a indústria de autopeças brasileira começa a sofrer concorrência de produtos fabricados na China. O superávit do setor automotivo brasileiro na balança de comércio com a China diminuiu no último ano. As exportações de produtos automotivos do Brasil para o país asiático passaram de US$ 394,5 milhões em 2003 para US$ 273,3 milhões em 2004, segundo dados da Anfavea. No mesmo período, as importações praticamente dobraram, de US$ 48,2 milhões para US$ 98,6 milhões. Como o Brasil não importa carros chineses, o valor praticamente refere-se a componentes. A queda no valor das exportações mostra também que a indústria automobilística chinesa começa a ganhar independência. O Brasil é ainda fornecedor de conjuntos de componentes. Mas o Brasil também ensinou os chineses a fabricar carros, principalmente os compactos, uma tecnologia que sempre destacou a engenharia brasileira. Depois de passar anos fabricando modelos de luxo para atender sobretudo governo e embaixadas, a explosão econômica permite agora o ingresso da classe média no mercado de veículos. A Volkswagen , que já investiu mais de US$ 4 bilhões na China, deslocou funcionários da fábrica de Taubaté (SP) para Xangai para ajudar no treinamento do projeto do Gol. A subsidiária brasileira da Fiat também envia conjuntos de peças do Palio para a China. O Brasil ainda tem fôlego nessa concorrência, na opinião do presidente do Sindicato Nacional da Indústria de Componentes Automotivos (Sindipeças), Paulo Butori. O presidente da General Motors do Brasil, Ray Young, lembra, ainda, que, por ora, as montadoras estão mais interessadas no mercado interno chinês do que em instalar no país bases para exportação. No ano passado, a China passou à frente da Alemanha e assumiu o terceiro lugar entre os maiores mercados de veículos do mundo, com mais de 5 milhões de unidades vendidas - mais de três vezes o mercado do Brasil. "Ainda estamos na frente porque já temos um parque de fornecedores enquanto que os chineses ainda estão erguendo o seu", afirma Golfarb. "Mas as nossas exportações estão sofrendo um grande risco por pressão de aumento de custos e câmbio", completa o executivo, que aponta uma política setorial como alternativa para a manutenção do crescimento sustentável e competitividade mundial. Para ele, a China é "mais perigosa" em termos de competitividade que os demais países asiáticos justamente por ter um mercado interno muito maior. Durante visita às fábricas da companhia no Brasil, no início do mês, o presidente mundial da General Motors, Rick Wagoner, avisou que, para ganhar contratos de exportação para a Europa, a filial brasileira "precisa ser mais competitiva que China, Coréia e Índia". Recentemente, a GM, a maior do mundo, anunciou que pretende duplicar a capacidade de produção na China, para 1,3 milhão de veículos por ano - volume quase igual a todo o mercado brasileiro. O plano faz parte de um programa de investimentos que totalizará US$ 3 bilhões em três anos.