Título: Fundo soberano não é instrumento de política cambial , diz Tesouro
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 07/05/2008, Finanças, p. C2

Augustin: "Não é uma opção de curto prazo, ligada à conjuntura econômica" A perspectiva de, graças ao grau de investimento, o déficit nominal ser eliminado antes de 2010 cria os fundamentos macroeconômicos para o Brasil montar o seu fundo soberano. O secretário do Tesouro, Arno Augustin, diz que essa iniciativa não está voltada a evitar a apreciação da taxa de câmbio. "Não é uma opção de curto prazo, ligada à conjuntura econômica", afirma. "O fundo soberano é uma decisão estratégica para o país."

A principal crítica apresentada ao fundo soberano é que o país não apresenta as condições macroeconômicas mínimas para criá-lo. Na experiência internacional, economias criam fundos soberanos quando o governo têm receitas em dólar. É o caso do Chile, que exporta cobre, e de países árabes, que vendem petróleo ao exterior. Países também criam fundos soberanos quando têm, ao mesmo tempo, superávit em conta corrente e superávit fiscal, combinação que permite ao governo comprar dólares sem provocar a expansão do endividamento público bruto.

Augustin, que trabalha na formatação do fundo soberano brasileiro, diz que é precipitado julgar a iniciativa brasileira antes de serem divulgados os seus detalhes, que ainda não foram definidos. E sustenta que é injusto criticar o fundo soberano sem levar em consideração a profunda transformação, que, segundo ele, ocorre nas contas fiscais.

O secretário diz que a política fiscal foi contracionista no primeiro trimestre, com uma redução de 13,7% nas despesas correntes, aumento de 21% nos investimentos e um superávit primário de R$ 3,043 bilhões. "Mostra uma contribuição fiscal importante em um momento em que o Banco Central se preocupava com a aceleração da inflação", afirma. Para ele, os dados fiscais do primeiro trimestre, que ao mesmo tempo registram um corte no consumo do governo e a ampliação dos investimentos, ajudando no aumento da formação bruta de capital fixo (FBCF), são o resultado de "uma equação fiscal" que levará o país ao fim dos déficits nominais a partir de 2010. "Ou antes disso, já que o grau de investimento reduz o custo de financiamento do Tesouro", disse.

O secretário não quis dizer se o forte superávit no início de ano é um sinal de que o governo irá perseguir uma meta maior do que 3,8% do Produto Interno Bruto (PIB) já anunciada. "Esse é um valor mínimo definido pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO)", afirmou. "O governo já dá uma contribuição importante para a solvência fiscal ao cumprir a meta de 3,8%." Ele admitiu a possibilidade o governo cumprir exatamente 3,8% do PIB, sem descontar desse percentual 0,45% do PIB referente ao plano piloto de investimento (PPI). "No ano passado, não descontamos o PPI."

Segundo ele, o fundo soberano não deve ser entendido como instrumento de política cambial. "As reservas internacionais atendem aos objetivos de política cambial", disse. Augustin não antecipou detalhes sobre a operação do fundo, mas autoridades que acompanham as discussões informaram que a tendência é que o Tesouro faça as compras de moeda estrangeira no mercado de câmbio. Se esse for o modelo seguido, lembra uma fonte, a ação do Tesouro não concorreria necessariamente com os leilões de compra de moeda estrangeira do BC, a quem cabe a política cambial.

Hoje, Tesouro e BC já atuam simultaneamente no mercado, com objetivos distintos, e há interação entre os dois. No ano passado, o Tesouro comprou US$ 13,986 bilhões em mercado para fazer pagamentos de juros e principal de sua dívida externa; para esse ano, a previsão é que compre US$ 6,840 bilhões, sem contar aquisições de moeda estrangeira para fazer a recompra antecipada de dívida, dentro do programa de melhoria do perfil do passivo externo. Quando atua, o Tesouro informa previamente o BC, que faz também uma pesquisa sobre oferta e demanda de dólares entre os agentes privados. É com base nesse conjunto de informações que o BC faz suas intervenções, quando há sobra de moeda estrangeira no mercado.

Ontem, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, afirmou que o fundo não tem o objetivo de conter a valorização da taxa de câmbio. Mas reconheceu que esse é um fator a mais para conter o enfraquecimento do dólar, já que representa um acréscimo na demanda por moeda estrangeira. "É difícil ter um instrumento único para conter a alta do dólar", afirmou.

Augustin disse que o fortalecimento dos fundamentos fiscais foi um dos elementos que permitiram que, na semana passada, o país fosse elevado para o grau de investimento pela Standard & Poor's. Segundo ele, o Tesouro mantém seus objetivos de fazer nova captação soberana proximamente, cumprindo seu plano anual de financiamento. "O grau de investimento aconteceu há poucos dias", afirmou. "Precisamos ainda avaliar a situação do mercado para decidir o melhor momento para captar."