Título: Cresce a guerra por talentos nos países latino-americanos
Autor: Campos , Stela
Fonte: Valor Econômico, 07/05/2008, EU & Carreira, p. D12

Maria Paula Mendieta, do RH do Banco Mundial, diz que hoje precisa ter pacotes mais agressivos para contratar na AL Desde que ingressou na companhia de serviços financeiros americana Stanford Financial Group há um ano, a brasileira Elisabete Schaffler, que hoje vive em Miami, passou a mudar constantemente de endereço. Morou em Bogotá (Colômbia), prepara-se para mudar nos próximos meses para Buenos Aires (Argentina) e em outubro aportar em sua cidade natal, São Paulo. Sua missão em território latino-americano é encontrar talentos e arrumar a casa nas aquisições planejadas pela instituição este ano. Seu banco opera no Panamá, Equador, Peru, Venezuela, México e Colômbia. "Estou sempre pronta para arrumar as malas", diz.

Ela é um exemplo de um movimento inédito de migração de talentos que está crescendo na América Latina. Executivos com boa formação, domínio do idioma inglês e disposição para adaptar-se a qualquer país da região hoje estão supervalorizados e difíceis de encontrar. "A disputa por talento local é enorme", diz Elisabete. A prosperidade da América Latina e o aumento do investimento estrangeiro, particularmente no Brasil, Colômbia e Peru, têm criado boas oportunidades de negócios e de carreira para os latinos.

Na briga pelos melhores profissionais estão as companhias participando de fusões e aquisições na região, as chamadas "multilatinas" expandindo operações além de suas fronteiras e as multinacionais interessadas em deixar suas operações locais nas mãos de executivos latino-americanos. Além, é claro, das companhias instaladas nos próprios países. Encontrar maneiras criativas para segurar os mais talentosos em suas companhias tem sido o grande desafio para os responsáveis pelas áreas de recursos humanos da região. Praticamente todos os 200 representantes de empresas com atuação na América Latina, que participaram do XI Mercer Latin American and Caribbean HR Forum, em Miami, há duas semanas, acreditam que o maior problema hoje é que todos estão disputando os mesmos talentos. Mesmo com pacotes de compensação cada vez mais agressivos é preciso mais que isso para vencer essa guerra .

Nesse cenário a dificuldade á ainda maior para quem é pequeno na região mas pretende expandir suas operações. É o caso da Orange Business Services, braço da gigante France Telecom, que atua em 14 países na AL, onde emprega 820 funcionários na região, sendo 450 no Brasil. Como precisa contratar profissionais certificados em determinadas tecnologias para manter a competitividade junto aos fornecedores, a companhia vem sofrendo para preencher suas vagas abertas. E como a intenção é crescer na AL, encontrar pessoal qualificado tornou-se uma questão crítica. "São poucos profissionais com certificação e temos que brigar por eles com competidores de peso como a Telmex", conta Maida Ocasio, responsável pela área de recursos humanos na América Latina.

O desafio da Orange Business Services na região não está apenas em enfrentar a concorrência de uma multilatina como a mexicana a Telmex, mas também em encontrar profissionais com o perfil desejado. Isso acontece tanto no nível técnico como na sua porta de entrada, os "call centers". No Brasil, são 30 novas vagas abertas nessa área todo mês. E o tempo para preenchê-las vem crescendo. "A falta do inglês é um problema", diz Maida. "Por esta razão, buscamos parcerias com universidades e estamos investindo forte em formação".

Mesmo caminho tem seguido a Tenaris, gigante fornecedora de serviços para a área de energia, com 23, 5 mil empregados, em 30 países. Como está difícil encontrar talentos na AL para preencher postos na área de engenharia, a empresa decidiu ampliar seu programa de trainees e apostar na formação de novos talentos. "Agora temos 300 vagas por ano", conta Martín Pérez Menéndez, responsável pelos benefícios globais na área de recursos humanos da empresa.

No primeiro escalão, a guerra também está acirrada. Nesse cenário altamente competitivo, em especial, nos momentos de fusões e aquisições, segurar um bom executivo tem sido uma tarefa árdua para os departamentos de RH. "Pelo menos 20% dos melhores talentos vão embora na hora de uma aquisição", diz Maria Barato, gerente sênior de compensação internacional do Scotiabank, que emprega mais de 50 mil pessoas no mundo, sendo 20 mil na América Latina. No ano passado, o banco de origem canadense, adquiriu dois bancos no Chile e um na Guatemala. Há dois anos, comprou outros dois no Peru.

Maria, que é portuguesa, diz que hoje seu maior desafio numa aquisição é não perder uma pessoa local. "Oferecemos um plano de retenção focado em oportunidade de carreira e treinamento logo nas primeiras semanas, só o dinheiro não segura mais os executivos", conta. O perigo nas operações na AL é que o número de profissionais com experiência e estudo é bem menor do que em outros continentes. "No Canadá, todos têm um nível parecido", diz. "Na América Latina o talento é raro".

Outra questão relevante é que a média de idade dos latino-americanos que chegam ao nível gerencial é bem menor. "Como eles são mais jovens, estão menos preocupados em trocar de emprego ou país por apenas um pouco mais de dinheiro", diz. Culturalmente, os latino-americanos sempre foram mais difíceis na hora de deixar seu país em razão de um desafio profissional. "Com a entrada de uma nova geração no nível gerencial, isto está mudando", diz o consultor Daniel Nadborny, responsável pela Mercer na Argentina. Ele lembra que o número de fusões e aquisições na região subiu 20% apenas no primeiro trimestre deste ano. No ano passado, foram registradas cerca de 1,5 mil transações internas na região, que movimentaram US$ 126 milhões. Nesta conta, não estão incluídos os movimentos feitos além das fronteiras como, por exemplo, uma aquisição da Vale no Canadá. "Reter os melhores nesse cenário é uma tarefa cada vez mais complicada", diz.

O grande número de ofertas de emprego para os mais qualificados na região latino-americana têm feito, inclusive, muitas subsidiárias adotarem planos de retenção diferenciados de suas matrizes. Existe hoje uma forte tendência de se conectar o pagamento à performance na região. No Brasil, por exemplo, a maioria das empresas que abriu o capital no último ano adota incentivos de longo prazo. A argentina Maria Paula Mendieta, responsável por compensação e benefícios na área de recursos humanos do Banco Mundial, diz que na AL a instituição está vivendo um grande desafio para segurar os executivos na sua área privada. "Especialmente no Brasil, tivemos que criar pacotes de remuneração bem mais agressivos para competir com o mercado local onde o setor financeiro está bem aquecido", diz. A instituição emprega 12 mil pessoas na região.

Companhias de serviços financeiros interessadas em aumentar sua participação no Brasil, como a americana Franklin Templeton Investments, estão apreensivas com essa guerra por pessoal qualificado. "Temos que competir por quem têm o conhecimento local", diz Natalie Bushman, responsável pela área de compensação e recursos humanos. "Não será fácil", diz. A empresa tem vagas abertas no Brasil, Argentina e México.

A jornalista viajou a convite da Mercer