Título: Fábricas de veículos temem risco logístico
Autor: Olmos , Marli
Fonte: Valor Econômico, 09/05/2008, Brasil, p. A4
As fábricas de veículos alcançaram a média de produção mensal de 300 mil unidades. Segundo as programações da indústria de componentes, deverão continuar nesse ritmo pelo menos nos próximos quatro meses. Multiplicado por 12, esse volume indica que o setor já está no ritmo anual de 3,6 milhões. A indústria tranqüilizou o governo quando anunciou ter capacidade para 3,8 milhões. Mas o que escapou na análise do ministro da Fazenda, Guido Mantega, que se mostrou animado com a perspectiva de as montadoras estarem aptas para sustentar a demanda, é que a logística que envolve a complexa cadeia desse setor está no limite e qualquer interrupção pode colocar a atividade em risco.
A greve dos fiscais da Receita já fez estragos. A TRW, uma das maiores fabricantes de autopeças do país teve de recorrer a aviões para fazer as peças que produz em Limeira (SP) chegarem às fábricas da Ford e Chrysler dos EUA. O transporte aéreo também foi usado para envio de componentes da filial brasileira para a fábrica do México.
A necessidade de não falhar nas entregas é uma aflição diária entre os fornecedores de autopeças do país. "Felizmente não interrompemos nenhuma entrega, mas estamos enfrentando dificuldades tanto na importação como na exportação", conta o diretor da TRW, Wilson Rocha. A empresa tem utilizado os aeroportos de Cumbica e Viracopos (SP), para agilizar o transporte.
Se não tivesse apelado para o transporte aéreo, essa empresa poderia pagar muito caro. Os contratos para fornecimento de suportes de freio para as montadoras americanas são bastante rígidos.
O preço de problemas como esse, enfrentados também por outros fabricantes, está entrando na conta de custos que a cadeia do setor automotivo vem acumulando. Com um ritmo de produção frenético, não sobra muito espaço para negociação de reajustes. O segundo aumento no preço do aço do ano está sendo negociado entre montadoras e fornecedores em meio ao sufoco da necessidade de trabalhar dia e noite para evitar que as linhas parem.
Os investimentos estão sendo feitos. A indústria de peças elevará o volume de investimentos este ano em 18,5%, num total de US$ 1,6 bilhão. As montadoras fazem o mesmo. Este mês, a fábrica de motores da Volkswagen, em São Carlos (SP), passará a operar com capacidade de produção maior, de 2,3 mil motores por dia, o que significa 500 mais. A montadora investiu R$ 123 milhões somente para essa finalidade. Há inúmeros exemplos como esse. Mas o problema é que o ritmo das vendas tem superado as previsões diárias.
As vendas no mercado interno, nos primeiros quatro meses do ano, somaram 910 mil veículos. Isso representa um incremento de 35% em comparação com o primeiro quadrimestre de 2007 e de 66% na comparação com igual período de dois anos atrás.
Representantes da indústria de autopeças encomendaram a uma empresa de pesquisas um trabalho para mapear os gargalos nessa cadeia. A identificação dos pontos mais congestionados servirá para traçar estratégias para novos programas de investimento. Como dizem alguns executivos do setor, há empresas trabalhando "com a corda esticada demais". "Se uma máquina quebrar e o conserto demandar um certo tempo, isso pode representar a necessidade de interromper entregas para as montadoras", afirma um executivo.
Na ponta do varejo, as coisas não estão muito diferentes. Há filas de espera, de 30, 40 e até 60 dias, dependendo do modelo escolhido pelo consumidor. No mês passado, indústria e concessionários conseguiram respirar um pouco melhor porque, graças ao um aumento de produção, houve crescimento no nível dos estoques.
Em março, o estoque de carros disponíveis para a venda estava em torno de 170 mil unidades. Em abril, os volumes subiram para 185 mil. Mesmo assim, essas quantidades não atendem à demanda, que continua sendo estimulada pela facilidade no crédito. No primeiro trimestre, 65% das vendas de carros foram feitas por meio de leasing e financiamento.