Título: Gestora vê impacto do aquecimento global nas ações
Autor: Fariello, Danilo
Fonte: Valor Econômico, 09/05/2008, EU & Investimentos, p. D10
As previsões catastróficas sobre os impactos do aquecimento global são muito questionadas, mas hoje é consenso de que algo está mudando no mundo e que outras alterações ainda estão por vir em oceanos, florestas e desertos. E devem chegar também ao bolso do investidor. Pensando nisso, a gestora global de recursos AllianceBernstein fez um estudo sobre os impactos do aquecimento global nas empresas e, por conseqüência, nas ações dos investidores, obtido com exclusividade no Brasil pelo Valor. Nas próximas décadas, riscos e oportunidades surgirão em diversos setores, principalmente nos mais ligados à produção, geração ou transmissão de energia. São tendências a que investidores em ações de todo o mundo devem estar atentos, concluiu o estudo.
O estudo feito ao longo de um ano resultou em um livro de 122 páginas recém-divulgado pela gestora, onde constam os principais fatores que poderão significar maiores custos ou receitas das indústrias que já existem ou das que deverão surgir nas bolsas daqui a algum tempo. Segundo o argentino Miguel Rozensztroch, gestor sênior global da AllianceBernstein, são principalmente decisões regulatórias, como o Protocolo de Kyoto, que podem transformar essas mudanças climáticas em questões financeiras - como o mercado de créditos de carbono, que estimula as empresas a pensar no assunto. Para ele, porém, não há, a princípio, empresas e setores perdedores ou vencedores. "Há aqueles que vão se preparar e aqueles que não."
Os estudo da gestora, que administra quase US$ 800 bilhões globalmente, é pautado em uma série de previsões para 2030 e além. Eles prevêem, por exemplo, uma rápida expansão da geração de energia nuclear e de fontes renováveis. Também esperam um crescimento da produção de carros híbridos, construções de dutos para transporte e reutilização de gás carbônico em refinarias e expansão no uso de controles industriais para emissões. "Não mudaremos nosso modo de vida, portanto teremos de investir para adaptar o que já usamos", diz.
A previsão da gestora é de que haverá uso mais racional de energia principalmente por meio de processos e produtos mais eficientes - mudança similar às novas geladeiras vendidas no Brasil, com consumo menor. Com isso, também aumentam riscos e oportunidades para empresas produtoras de tecnologias mais eficientes em consumo de energia e, obviamente, de seus investidores.
A AllianceBernstein tem boas apostas na geração de energia nuclear e acredita que as geradoras com fontes renováveis também poderão ser uma aposta, embora muitas dependam de alterações regulatórias, porque produzem energia mais cara. A partir dessa perspectiva, Rozensztroch vê com bons olhos as geradoras brasileiras, que têm como matriz energética mais freqüente as hidrelétricas, e também o mercado de etanol.
Apesar do longo horizonte do estudo, Rozensztroch diz que muitos dos impactos previstos já podem ser percebidos no mercado. Exemplo disso, cita, são os carros bicombustíveis que já circulam no Brasil e, paralelamente a isso, o surgimento de empresas do próprio setor sucroalcooleiro na bolsa. Nesse sentido, o estudo também aponta impactos em setores ainda com pouca representatividade nas bolsas globais. Muitos deles ainda são inexistentes na bolsa brasileira, mas podem surgir no longo prazo, como ocorreu com os produtores de cana.
Da avaliação de que haverá impactos das mudanças climáticas sensíveis aos balanços das empresas decorre a dificuldade de se avaliar os investimentos para controle de emissões. Quais mudanças serão viáveis financeiramente? "Difícil dizer, mas é certo que essas mudanças exigirão uma capacidade maior do investidor, ou de seus consultores, em avaliar as atitudes das empresas." Com isso, cresce a importância da diversificação na escolha das ações ao investir, para minimizar tais riscos, comenta.
Para Rozensztroch, os impactos do aquecimento global devem ser levados em conta na avaliação de um papel. "Mas é preciso cuidado, porque as ações podem refletir já algo que vai acontecer ao longo de 15 anos", diz. Por isso, não há como ratificar que determinada empresa ou setor terá sempre boa perspectiva no mercado. Talvez virtudes e problemas muito à frente já estejam nos preços. Porém, outros fatores podem levar décadas para aparecer nas cotações.