Título: Governo estuda aumentar esforço fiscal
Autor: Romero,Cristiano
Fonte: Valor Econômico, 12/05/2008, Brasil, p. A4
O governo estuda aumentar o esforço fiscal neste ano, aproveitando-se do comportamento positivo da arrecadação de tributos federais, que, no primeiro trimestre, cresceu 12,8% em termos reais. A idéia é elevar o superávit primário das contas públicas para atingir dois objetivos: dispor de recursos fiscais para criar um fundo de riqueza soberana e contribuir para a política antiinflacionária do Banco Central (BC).
A meta de superávit primário com a qual o governo se comprometeu para 2008 é 3,8% do PIB, sendo que, desse total, 0,5% pode ser descontado da conta a títulos dos recursos previstos para os projetos-piloto de investimento (PPI). Nos 12 meses concluídos no primeiro trimestre do ano, o setor público consolidado - governo central, estatais, Estados e municípios - apresentou superávit de 4,46% do PIB.
A idéia em análise é manter essa folga fiscal durante o resto do ano. Segundo um ministro próximo do presidente, o governo já decidiu que não utilizará o "excesso de arrecadação" para aumentar gastos. "Sobre isso, já há um consenso", contou o auxiliar de Lula. Por outro lado, o presidente Lula não estaria disposto a formalizar a elevação da meta de superávit. Ele descarta também produzir uma economia de 5% do PIB. "Quem está falando em 5%, está delirando", assegurou o ministro.
A proposta de aumento do superávit primário foi feita ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelo professor Luiz Gonzaga Belluzzo, da Unicamp. Conselheiro informal do presidente, Belluzzo viajou com Lula na última quinta-feira, a bordo do avião presidencial, para Salvador. Durante o vôo, explicou as vantagens do aumento do esforço fiscal neste momento.
Em entrevista ao Valor, na semana passada, Belluzzo defendeu que o governo mantenha o superávit em torno de 4,6% do PIB. A preocupação do professor da Unicamp, compartilhada pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, é que, por causa de pressões inflacionárias, o Banco Central promova novas elevações da taxa básica de juros (Selic), diminuindo o ímpeto de crescimento da economia - na última reunião, o Comitê de Política Monetária (Copom) aumentou a Selic para 11,75% ao ano, depois de quase três anos de alívio monetário, e sinalizou que fará novas elevações nas próximas reuniões, uma vez que o IPCA acumulado em 12 meses já ultrapassou a meta de 4,5% deste e do próximo ano.
Se aumentar o esforço fiscal, o governo ajudará a conter a expansão da demanda agregada, contribuindo, portanto, para a tarefa do BC de controlar a inflação. Em tese, um superávit maior nas contas públicas diminui a necessidade de aumento dos juros, já que a demanda do governo é um dos elementos que compõem a demanda agregada - os outros são os investimentos e o consumo privado.
Além de ajudar o Banco Central a controlar a demanda, a contenção dos gastos públicos daria contribuição para impedir uma valorização ainda maior da taxa de câmbio. Quando eleva os juros, o BC aumenta o diferencial entre as taxas interna e externa, atraindo a entrada de capitais especulativos, movimento que deprime ainda mais, no curto prazo, a cotação do dólar frente ao real.
O governo aumentará o superávit primário, ponderou um ministro ouvido pelo Valor, desde que três grupos de despesa não sejam prejudicados: os programas sociais, o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e o plano de desoneração tributária, de R$ 20 bilhões até 2010, previsto pela nova política industrial, que Lula anunciará hoje, no Rio, na sede do BNDES.
Uma parte do esforço fiscal adicional pretendido pela equipe econômica será utilizada para compor os recursos do fundo soberano. Segundo um assessor do presidente, o novo fundo será anunciado dentro de um mês - para ser criado, ele necessitará da aprovação do Congresso Nacional. O governo quer usar os recursos do fundo para financiar projetos de investimento de empresas brasileiras no exterior.