Título: Previdência emperrada
Autor: Fariello , Danilo
Fonte: Valor Econômico, 12/05/2008, EU & Investimentos, p. D1

Dois anos depois da criação do sistema eletrônico pelas seguradoras para acelerar os processos de migração de Planos Geradores de Benefícios Livres (PGBLs), Vida Gerador de Benefícios Livres (VGBLs) e tradicionais entre instituições, os participantes ainda têm dificuldades em transferir recursos. Nesse período, segundo a Federação Nacional da Previdência Privada e Vida (Fenaprevi), R$ 2,5 bilhões mudaram de uma empresa para outra. Mas apenas 72% dos 82 mil pedidos até março foram plenamente liquidados e o participante já pode acompanhar sua aplicação na seguradora nova e fazer aportes. Além da falta de eficácia em mais de um em cada quatro pedidos de portabilidade, os investidores também sofrem com a demora de meses para o pleno encerramento desses processos. Um deles até conseguiu na Justiça indenização por danos morais pela demora.

Os fatores que dificultam esse processo podem ser muitos. O principal deles está em questões burocráticas. Diferentemente de uma simples transferência entre fundos ou contas, a migração de planos de previdência exige ainda papéis e assinaturas das partes envolvidas. Por se tratar de um processo que envolve o preenchimento de requerimentos e com diversas variáveis, ele fica mais vulnerável a erros. Se é feito um pedido de transferência de PGBL para VGBL, por exemplo, a migração emperra, já que isso não é permitido por lei. Também não é possível mudar a forma de recolhimento de imposto de renda, de regressiva para a progressiva, por exemplo. Como as diferenças gramaticalmente são tênues, surgem os problemas.

O ambiente automatizado, denominado Sistema para Intercâmbio de Documentos Eletrônicos (Side), criado em abril de 2006, conseguiu melhorar essa situação. O prazo médio total para migrações foi reduzido de 55 dias, no lançamento, para 16 em março, último dado disponível. Segundo Marco Antonio Rossi, presidente da Bradesco Vida e Previdência e vice-presidente da Fenaprevi, o tema era motivo de reclamações dos participantes para a Superintendência de Seguros Privados (Susep), mas agora essas queixas são menos freqüentes. "Os números de reclamações reduziram-se drasticamente." Porém, norma da Susep, que regula o setor, exige prazo de apenas cinco dias úteis para que isso ocorra, embora seja discutível quando exatamente esse prazo começa a ser contado.

As dificuldades para migração podem crescer quanto mais distante estiver o investidor dos grandes centros urbanos, diz Rossi. Também será mais provável o participante encontrar obstáculos ao migrar quanto mais antigo tiver contratado seu plano. Mas ele lembra que, independentemente do prazo do processo de migração, o investidor não fica sem ter rentabilidade sobre os recursos investidos nenhum dia. O patrimônio só deixa de render no primeiro plano quando o dinheiro for para o segundo, explica.

O Side foi criado justamente para tentar sanar o problema com a migração dos dados, comenta Renato Russo, vice-presidente de Previdência e Vida da SulAmérica e também integrante da Fenaprevi. Vale destacar que a média de R$ 130 mil em transferências mensais registradas no Side nos últimos 12 meses está ainda distante de incomodar os sistemas operacionais de um setor que tem patrimônio de R$ 129 bilhões, embora o excesso de burocracia dificulte. Em números absolutos, a média foi de 3.574 portabilidades cadastradas por mês nos últimos 12 meses, segundo a federação. No mesmo período, foram recusados 622 pedidos por mês.

Há poucas dúvidas de que os pedidos de transferência tendem a aumentar por conta do crescimento do setor, que avança a ritmo percentual de dois dígitos por ano, ou pelo aumento do patrimônio dos participantes. A idéia é que, quanto mais recursos acumulados, mais o participante vai se preocupar com o retorno e migrar. A média de saldo nas migrações é de R$ 45 mil.

"O crescimento das migrações é ótimo, porque significa um mercado mais concorrido e mais maduro", diz Rossi. Nessa linha, Russo acredita que, à medida que o mercado amadureça, os investidores tenderão a procurar com mais cuidado o seu prestador de serviço e, daí, irão migrar com mais freqüência.