Título: Divisão nos países do G-20
Autor: Caprioli, Gabriel
Fonte: Correio Braziliense, 18/02/2011, Economia, p. 14

Diante de propostas polêmicas e posições divergentes, é baixa a expectativa de que haja acordo na reunião que começa hoje

A reunião do grupo composto pelas 20 maiores economias do mundo (G-20) começa hoje em Paris e promete uma queda de braço entre os países do bloco. No encontro de ministros de Estado e presidentes de bancos centrais, que se estenderá até sábado, temas como a criação de um sistema de indicadores econômicos anticrise, a arbitragem dos preços de commodities (produtos básicos com cotação internacional) e o controle do fluxo de capitais devem ser colocados na mesa de negociação. Para os analistas, no entanto, o conflito de interesses irá além do antagonismo entre desenvolvidos e emergentes, e a choradeira tem poucas chances de resultar em acordos ou soluções concretas.

¿Os desenvolvidos, provavelmente, vão questionar os emergentes em relação ao equilíbrio de moedas, enquanto estes vão querer discutir a solvência dos mais ricos¿, afirmou o economista-chefe da agência de classificação de risco Austing Ratings, Alex Agostini. Para ele, no entanto, em alguns pontos polêmicos, é possível que emergentes e desenvolvidos se unam em torno de um interesse comum.

Uma dessas questões é a proposta da França, que detém a presidência rotativa do fórum neste ano, de controlar os preços de insumos agrícolas e minerais, negociados no mercado internacional. ¿Chega a ser uma daquelas propostas indecentes. Como você chega para um país cujo principal foco é o agronegócio e tenta convencê-lo de que ele vai precisar ter um limite de preços?¿, questionou Agostini. Neste caso, Estados Unidos e Brasil, ambos grandes produtores de commodities devem se unir contra o projeto. ¿Se os representantes brasileiros forem por outro caminho, só temos a perder¿, completou.

Diante da repercussão negativa da possibilidade do controle de capitais, a ministra das Finanças da França, Christine Lagarde, antecipou o início do encontro e, dirigindo-se diretamente aos brasileiros, afirmou que a intenção francesa não é propor um controle tarifário. ¿Repito aos nossos amigos brasileiros: não queremos administrar preços¿. Entretanto, reiterou que levará ao G-20 a proposta de regulamentação das transações de produtos derivativos financeiros de commodities.

Racha nos Brics O clima de divisão deve colocar em lados opostos até mesmo os Brics (Brasil, Rússia, Índia e China), bloco para o qual já houve a expectativa de uma coordenação de interesses comuns. Além do Brasil, os Estados Unidos também tentam convencer a Índia de aumentar as pressões contra a China, na questão do câmbio. ¿Existe um racha entre os quatro países e isso só mostra que eles não têm e nem nunca tiveram muita coisa em comum. São economias com diferenças tão profundas que acreditar que eles vão atuar juntos no G-20 é mais uma mania do que uma realidade¿, avaliou o professor de economia da Fundação Getulio Vargas (FGV), Robson Gonçalves.

A discussão cambial deverá colocar não só a China no foco das tensões, mas também os Estados Unidos. Gonçalves lembrou que a briga em torno do valor das moedas afeta todos os outros países do bloco, mas é ocasionada basicamente pelas atuais duas maiores economias do mundo. ¿É o resultado da postura de expansão monetária norte-americana e de um protecionismo artificial sobre a moeda chinesa. Ambos os comportamentos partem de interesses locais e não vejo uma solução sendo criada no G-20. Aquele não é um fórum de decisões unilaterais¿, comentou.

Outra proposta polêmica apresentada pela França é uma espécie de termômetro econômico, capaz de identificar futuros desajustes nos mercados globais. Lagarde afirmou, no início da semana, que o índice inclui um conjunto de indicadores aos países do bloco ¿mais amplo do que a única medida de balanço de pagamentos¿, sem detalhar quais índices serão utilizados.

Ontem, a ministra francesa voltou a dizer que estabelecer um acordo em torno de um sistema de indicadores econômicos será um grande progresso realizado pelo G-20. Para ela, os desequilíbrios diminuíram na recessão desencadeada a partir do final de 2008, mas estão voltando conforme as economias se recuperam. "Isso não pode durar muito, pois produz grandes danos", disse. Ao ilustrar um mundo com desequilíbrios, a ministra citou um ¿mundo em que a China economiza e exporta, a Europa consome e os Estados Unidos fazem dívida e consomem.¿