Título: Indústria automobilística já acumula cinco décadas de apoio oficial
Autor: Olmos , Marli
Fonte: Valor Econômico, 14/05/2008, Brasil, p. A3

A indústria automobilística brasileira tem sido amparada por incentivos governamentais desde o dia em que nasceu. O próprio setor registra 16 de junho de 1956 como a data do surgimento do setor no país. Nesse dia, cinco meses depois de tomar posse, Juscelino Kubitschek assinou um decreto que criava o grupo executivo da indústria automobilística, chamado pela sigla Geia, que trazia o primeiro da série de estímulos que andariam junto com a própria história da produção de veículos no país.

Há quem defenda que essa indústria tem de ser tratada com mais mimos que as demais. Entre os argumentos, fala-se do poder de multiplicação dos empregos na cadeia que envolve a fabricação de um automóvel. O peso desses produtos na balança comercial do país é outra bandeira freqüentemente apontada. De fato, antes de Juscelino assinar o decreto que atraiu o setor, os veículos tinham grande peso nas importações.

Depois que instalaram suas fábricas no Brasil, nas décadas 60 e 70, as montadoras passaram a usufruir de linhas de crédito voltadas à exportação. Mas foi depois do fim do regime militar que começaram a pipocar diversos programas de incentivos fiscais voltados ao crescimento do setor automotivo.

Um dos mais famosos foi a câmara setorial, celebrada depois de um período de estagnação, nos anos 80. Em um cenário de hiperinflação, o então presidente eleito Fernando Collor de Mello havia chamado os carros brasileiros de "carroças". Depois da posse, ele começou a reduzir as barreiras alfandegárias. Em resposta, as próprias montadoras incrementaram a importação de carros.

A câmara setorial nasceu de uma discussão entre empresas, governo e sindicatos. Cada um assumiu sua cota de sacrifício: o governo federal reduziu IPI e os estaduais, o ICMS. Os representantes dos trabalhadores prometeram suspender greves em troca da garantia de emprego. As montadoras se comprometeram a repassar o benefício fiscal nos preços, abrindo mão de margens de lucro.

Dessa vez, os preços dos carros de fato baixaram. À redução de preços média de 22% em abril de 1992 seguiu-se um aumento de vendas de 42% em um único mês. A câmara foi uma iniciativa organizada, surgida de debates. Mas a partir daí, os programas de incentivos vieram muito mais da pressão da indústria e trabalho de convencimento junto ao governo.

Logo depois da câmara, surgiu o decreto do carro popular, resultado de uma conversa mais ou menos informal entre a direção da Volkswagen e o então presidente Itamar Franco, interessado em promover a volta do Fusca. Não apenas a Volkswagen, como todos os fabricantes de veículos foram beneficiados pela redução do IPI a uma alíquota simbólica de 0,1% no carro que custasse o equivalente a US$ 5 mil. Com modificações na alíquota a vantagem fiscal no carro 1.0 permanece até hoje.

O governo de Fernando Henrique Cardoso vai ficar na memória da indústria automobilística. Logo no primeiro mandato foi lançado o regime automotivo, um programa que garantia incentivos fiscais às empresas do setor que se comprometessem a fazer fábricas e exportar. O programa atraiu fabricantes franceses e japoneses, que não se arriscaram a erguer fábricas na leva de benefícios dos tempos de Kubitschek.

O setor ganhou força e continuou a bater à porta do governo para pedir incentivos. Estavam todos até agora muito decepcionados com os resultados frustrados das tentativas nas duas gestões do governo Lula. Agora, as montadoras ganharam prazo para recolher impostos e uma linha de financiamento para projetos de engenharia no valor de R$ 1 bilhão, além das medidas para desoneração do investimento em máquinas e equipamentos.