Título: BC promete ciclo menor de aperto monetário
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 15/05/2008, Opinião, p. A12

O depoimento do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, na terça-feira, perante a Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal, pode ser considerado uma gota de bálsamo para os milhões de brasileiros que se preocupam - e sofrem - com o atual patamar, muito alto, das taxas de juros do país e com a perspectiva de novas elevações. Meirelles afirmou que o atual ciclo de aperto na política monetária será menor que os anteriores. "Os investimentos e o aumento da capacidade de importação fazem com que a economia tenha outra dinâmica. Não eliminam os ciclos de política monetária, mas os tornam de outra amplitude."

Meirelles não foi explícito sobre o quanto o BC pretende elevar os juros. Mas exibiu um gráfico em que mostra que, ao longo dos últimos anos, os ciclos de aperto monetário têm sido cada vez menores no Brasil. No mais recente, feito entre 2004 e 2005, a taxa básica subiu 3,75 pontos percentuais. "Os ciclos de aperto monetário tendem a ter magnitudes menores", afirmou o presidente do BC. "Estamos caminhando para a normalidade."

A observação do panorama econômico recente no país confirma à primeira vista os comentários do presidente do BC. De fato, os investimentos no Brasil ganharam força e ritmo, por qualquer um dos indicadores existentes. De acordo com os dados do próprio Banco Central, a entrada de investimentos externos diretos nos últimos doze meses (até abril) somou US$ 36,8 bilhões. E o IBGE informa que a taxa de formação bruta de capital fixo (o mesmo que investimento) registrou no ano passado crescimento, de 13,4%, a maior taxa anual desde o início da série, em 1996. A taxa de investimento na economia brasileira, medida pela relação entre essa taxa da formação bruta de capital fixo e o PIB, atingiu 17,6% no ano passado, recorde para a série histórica iniciada em 2000. Também as importações estão, obviamente, aumentando de forma drástica. No período de janeiro a maio deste ano, as compras no exterior tiveram uma expansão de 43,7% em relação ao mesmo período do ano passado.

Até recentemente, a entrada de produtos importados em larga escala no país foi um fator sem dúvida decisivo na contenção dos preços internos - assim como a ampliação da produção doméstica também contribuiu nesse sentido, impedindo que o aumento firme da demanda provocasse pressões inflacionárias de monta. Agora, porém, existem indícios preocupantes de que o Brasil passou a "importar" inflação.

O caso mais inquietante é o dos bens comprados da China, que durante mais de uma década garantiram o crescimento da economia mundial sem inflação, graças aos baixos custos de produção. E isso valeu também para o Brasil. De 1993 até 2006, os preços dos produtos vindos da China recuaram 22%. Mas essa situação mudou, como mostrou reportagem de Raquel Landim, na edição do dia 13 último do Valor. Os preços dos produtos importados da China subiram, em média, 4,7% no ano passado e 13% no primeiro trimestre em relação a janeiro-março de 2007 - em igual período, o real se valorizou 10,7% ante o yuan. Os preços dos equipamentos eletrônicos subiram 13% no período, enquanto as máquinas aumentaram 10%, os elementos químicos, 27%, têxteis, 15% e calçados, 11%. Na maioria dos setores, a valorização do real compensou apenas parte da perda e os produtos chineses devem ficar mais caros nas prateleiras do país, depois de um longo período de preços baixos. Apesar da alta dos preços acima da variação cambial, o Brasil segue comprando com apetite do fornecedor asiático, graças ao mercado interno aquecido. De janeiro a março, em relação ao primeiro trimestre de 2007, o volume de importações da China subiu 50%.

O problema do aumento dos custos, dos preços, da inflação não é exclusividade chinesa. Todo o planeta enfrenta a volta do fenômeno dos preços em elevação. Por isso, o Brasil não pode mais contar com o axioma de que os importados irão, com certeza, ajudar a segurar a inflação - facilitando, por conseqüência, a tarefa do Banco Central de apertar a liquidez por meio de juros altos para brecar esse processo de elevação dos preços.