Título: Mais fiscais dos minoritários
Autor: Valenti , Valenti Vieira e Graziella
Fonte: Valor Econômico, 15/05/2008, EU & Investimentos, p. D1

A disputa que opõe acionistas minoritários e controladores pela instalação de conselho fiscal em companhias abertas esquentou com recente decisão da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) num curioso embate de Villares contra Villares. O tema foi levado à autarquia em consulta da Villares Investimentos e Participações, dos ex-controladores e atuais minoritários da Aços Villares.

O novo entendimento do regulador pode mudar o cenário para instalação de conselhos fiscais em empresas abertas, facilitando a vida de minoritários. Pela decisão da semana passada da diretoria da CVM, a partir de agora, o investidor que detém ações ordinárias (com direito a voto) pode indicar um conselheiro fiscal próprio, para eleição separada do controlador, em qualquer companhia que tenha pelo menos 10% das ações votantes em circulação no mercado, ou seja, fora do bloco de controle.

Até então, a maioria dos participantes do mercado entendia que era necessário reunir, pelo menos, 10% dos detentores de ações ordinárias na assembléia para obter esse direito. Os detentores de preferenciais já não precisavam de percentual mínimo para ter seu representante, pois a Lei das Sociedades Anônimas dispensa esse requisito.

Para Marcos Pinto, diretor da autarquia e relator da decisão, é preciso analisar a legislação diante da evolução do mercado. "Até algum tempo, a maioria das empresas emitia preferenciais, mas a situação se inverteu nos últimos anos", disse ele no voto, endossado pelos outros diretores da autarquia. Das 64 empresas que fizeram ofertas públicas iniciais em 2007, apenas 15 emitiram preferenciais.

Ele admite que o entendimento terá impacto significativo, principalmente, porque muitas companhias optam por listar ações no Novo Mercado, ambiente que só admite ordinárias. Nessas companhias, muitos investidores poderiam entender, antes dessa decisão, que apenas conseguiriam eleger participantes no conselho fiscal com a organização de 10% dos acionistas não controladores. O diretor explica, porém, que o entendimento só vale daqui para frente, para as próximas eleições.

Atualmente, poucas companhias do Novo Mercado possuem conselho fiscal instalado. Das 99 que compõem o espaço especial da bolsa, só 30 ativaram esse colegiado, de acordo com levantamento preliminar feito pelo conselheiro fiscal profissional Jorge Lepeltier, após a rodada de assembléias gerais desse ano. Em 2007, esse número era de 26, para um total de 62 empresas listadas. Para ele, que atua como representante de minoritários há mais de 15 anos, a decisão da CVM é uma grande oportunidade de mudança desse cenário, pois muitos controladores ainda têm receio da formação desse colegiado pelos investidores. A tendência é de aumento no número de empresas com conselho fiscal.

A tese da Villares Participações, acatada pelo colegiado da CVM, se apóia em parecer do ex-presidente da autarquia Luiz Leonardo Cantidiano. O argumento defende que o requisito de 10% previsto na Lei das S.A. diz respeito ao número de ações de titularidade dos minoritários e não ao número detido pelos não controladores que comparecerem à assembléia geral.

A Aços Villares reelegeu o conselho fiscal que já estava instalado, no fim de março. De acordo com a ata da assembléia, a antigo controlador quis indicar representante mas não pôde, por não ter 10% do capital votante. A empresa analisa agora a nova decisão da CVM.

A atual disputa está enovelada em briga mais antiga, entre a Previ, fundo de pensão do Banco do Brasil, e a Souza Cruz. A fundação se manifestou no processo da Villares como "terceiro interessado" e apresentou parecer que apóia o minoritário, elaborado pelo advogado Calixto Salomão Filho, da Universidade de São Paulo (USP).

A Souza Cruz, por sua vez, se uniu aos controladores da Aços Villares, contra os investidores. Para isso, apoiou-se em pareceres de Alfredo Lamy Filho e Luiz Gastão Paes de Barros Leães. Os controladores chegaram a ganhar uma batalha no ano passado, quando a Superintendência de Relações com Empresas (área técnica da CVM) se manifestou contra a tese dos minoritários. Mas eles enviaram recurso ao colegiado.

Para o diretor de participações da Previ, Renato Chaves, a nova decisão da CVM é emblemática. "Corrige uma distorção que existia no mercado. Já houve caso em que um acionista com pouquíssimas preferenciais elegeu representante no conselho fiscal, enquanto nós, que temos investimento de milhões em ordinárias, não conseguimos."

A disputa entre a Previ e a Souza Cruz data de 2004, quando o fundo, o maior detentor de participações em companhias abertas no país, iniciou campanha pela instalação de conselhos fiscais permanentes. Por encontrar resistência na Souza Cruz - que se apoiava no entendimento de que a prerrogativa para tal era dos preferencialistas - a Previ decidiu ir à CVM. A companhia acabou instalando o conselho este ano. Porém, os minoritários não elegeram representantes.