Título: No atacado, principal pressão está fora dos alimentos
Autor: Bouças , Cibelle ; Durão Saveedra Vera
Fonte: Valor Econômico, 16/05/2008, Brasil, p. A3

A inflação atingiu seu ponto mais alto em maio e não há perspectivas de desaceleração ainda neste semestre. O Índice Geral de Preços -10 (IGP-10), apurado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) apontou alta de 1,52% no intervalo de 11 de abril a 10 de maio, e reforçou a participação de outros preços na composição da inflação.

Em maio, a principal causa para a aceleração no atacado não foram os alimentos. Conforme levantamento da Rosenberg Consultores Associados, o grupo alimentos foi responsável por 0,79 do Índice de Preços no Atacado (IPA), que subiu 1,91%, ante 0,35% em abril. Combustíveis, outro item que preocupou analistas por conta do reajuste no início do mês, respondeu por 0,21 da alta do IPA no período. A maior participação, de 0,91 ponto percentual, ficou com os demais itens que constituem os preços do atacado. "O grupo alimentos continua tendo força no IPA mas já não é mais o principal fator de pressão", afirmou Luís Fernando Azevedo, economista da Rosenberg.

A variação do IGP-10é também a mais alta registrada para o mês de maio desde 1995. Em 12 meses, o IGP-10 acumula alta de 10,71%. Em maio, 75% da alta registrada no IGP-10 adveio da inflação no atacado. O Índice de Preços ao Consumidor (IPC) variou 0,67%, 0,06 ponto acima do apurado na leitura de abril, e o Índice Nacional de Custo da Construção (INCC) apontou alta de 0,85% ante 0,73% em abril.

Azevedo observou que alimentos deixaram de ser o principal fator de pressão no IPA desde fevereiro, mas a diferença de peso em relação aos demais itens se acentuou em maio. Conforme Salomão Quadros, coordenador de análises econômicas da FGV, a influência dos produtos alimentares na inflação industrial ficou em torno de 23%. "Minério de ferro sozinho respondeu por 16% do IPA; derivados de petróleo tiveram impacto de 0,14 ponto percentual; produtos químicos, de 0,29 ponto. Os alimentos tornaram-se um elemento de pressão no mesmo nível que outros."

Para o IGP-M, que apura a inflação até o dia 20, Azevedo prevê aceleração, com a absorção do reajuste nos preços do minério ocorrida no início deste mês e com novas altas em preços agrícolas. "Em anos anteriores, o reajuste no minério de ferro foi sempre forte em abril, mas a variação já era absorvida no mesmo mês. O que se observa neste ano é que os reajustes estão ocorrendo aos poucos, de 10% a 15% em cada mês, o que está provocando essa aceleração por um período mais prolongado", disse.

Quadros, da FGV, também ressaltou que, por conta da aceleração recente em itens como o minério de ferro (que subiu 15,51% no mês) e adubos e fertilizantes (9,43%), o IPA industrial atingiu variação de 2,01% em maio, a maior alta desde novembro de 2004. "O repasse dessas altas aos produtos finais continua ocorrendo", disse, observando que o item bens finais subiu 1,24% em maio, ante 0,27% em abril.

Para as próximas semanas, Quadros prevê melhora nos preços das matérias-primas, mas aceleração do IPC, com o repasse de algumas altas para o varejo, opinião que é compartilhada por Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados. "A alta de arroz, trigo, soja e leite que ocorreu no atacado ainda não foi totalmente repassada ao varejo", afirmou. Ainda segundo o economista, o reajuste nos planos de saúde pode trazer alguma pressão ao IPC em substituição aos farmacêuticos, que deixam de influenciar o grupo de preços administrados.

Os IGPs da Fundação Getúlio Vargas (FGV) foram até pouco tempo indexadores de diversos serviços públicos e, na época do dólar valorizado, chegaram a puxar os preços administrados para as alturas. Hoje, esses indicadores entram no cálculo das tarifas de energia elétrica, mas são adotados para o reajuste de vários contratos, como aluguéis e planos de saúde. "No caso do aluguel, não tem uma regra de correção. Depende do locador e o IGP-M ainda é usado com bastante freqüência nos contratos entre as partes pelas imobiliárias", diz Quadros. O indexador também é o preferido para serviços prestados entre empresas e disseminado em muitos setores não regulados pelo governo, avalia o economista da FGV.

Quadros não faz previsões sobre inflação. Mas ele acredita que este ano certamente o IPCA deverá superar a meta de 4,5%. E neste caso, a arma mais poderosa para derrotar o dragão da inflação é, na sua avaliação, a política monetária. Ele espera nova alta dos juros na próxima reunião do Copom, na faixa de 50 pontos, no mínimo. "O BC anunciou que quer fazer um ajuste rápido e pode querer acelerar a alta da Selic no próximo mês". A outra opção, que acha difícil de acontecer, seria a redução dos gastos públicos.