Título: Demissão de ministra ecoa na imprensa internacional
Autor: Chiaretti , Daniela
Fonte: Valor Econômico, 16/05/2008, Política, p. A6

O Ministério das Relações Exteriores terá trabalho. Ontem de manhã, antes que a ex-ministra Marina Silva fizesse o balanço de sua gestão e desse seu motivo salomônico de ter abandonado a pasta - ponderando não ter mais eco no Planalto e preferindo "deixar o filho vivo no colo de outra" -, o britânico "The Independent" cravava em editorial que é preciso salvar os "pulmões do planeta", que se deve pagar por isto e que "esta parte do Brasil (a Amazônia) é muito importante para ser deixada aos brasileiros". O Príncipe Charles deu entrevista à BBC com discurso mais moderno. Pediu o fim do desmatamento das florestas tropicais e falou que funcionam como o "ar condicionado do mundo".

A demissão da ministra ecoou na imprensa internacional. "The New York Times" disse que a Amazônia está vulnerável depois da renúncia. O "El País" afirmou "Lula dá as costas à maior defensora da Amazônia". Foi notícia na mídia alemã, nos jornais franceses, nos argentinos, no "El Mercúrio" chileno. Ambientalistas no Brasil contavam que nunca haviam dado tanta entrevista para jornalistas estrangeiros. Na coletiva em Brasília, Marina, elegante, não comentou a repercussão mundo afora. Ainda deu uma canja - afirmou, publicamente, seu apoio aos biocombustíveis. "São uma grande oportunidade social e ambiental."

A resposta ao ex-chefe e companheiro Lula veio com luva de pelica. No dia anterior, o presidente assegurou a continuidade da política ambiental "porque não é política de ministro, é política de Estado". Marina fez uma pequena alteração. "É política de governo, não política de Ministério". Na filigrana, a ex-ministra reforçava o que perseguiu desde o início da gestão - a transversalidade da agenda ambiental entre os Ministérios -, e que nunca conseguiu.

Marina Silva desfilou suas vitórias rumo ao desenvolvimento sustentável do país. Antes da polêmica, o lago de Santo Antônio e Jirau teria sido "oito vezes maior". Listou o projeto de desenvolvimento sustentável da BR-163 como um trunfo, o que é verdade. Meses depois do mero anúncio da pavimentação da estrada, o desmatamento explodiu nas bordas. O projeto foi discutido e desenhado por comunidades e ONGs. Só falta a sua implementação, disse Marina. Falta a infra de saúde, educação e outras pontas deixadas por outras pastas.

É verdade que na sua gestão foram criados milhões de hectares de unidades de conservação, muito mais que em qualquer outro lugar do mundo. Marina lembrou a cifra, mas disse que no último ano a demarcação reduziu o ritmo. O que ela não disse é que na Casa Civil há uns 15 casos de parques e reservas que não vão para frente.

Marina falou pelas entrelinhas. Ao mencionar o "penhor florestal" se referia a um mecanismo de vanguarda, que sinaliza dar valor de verdade à floresta em pé. Está na medida provisória da renegociação da dívida rural. Quem quiser reflorestar terras degradadas ou tiver um plano de manejo, poderá dar a floresta como garantia. O pacote é inacreditável: juros de 4%, carência de 12 anos e prazo, 20 anos.

Marina Silva disse que o tempo mostrará se sua gestão teve mais vitórias ou derrotas. Se a MP sair como foi acordada entre técnicos do Serviço Florestal e da Embrapa, numa parceria inédita conhecida no MMA como Romeu e Julieta (pelos Montecchio e Capuleto, as famílias que se odiavam), a ex-ministra terá conseguido o que sempre quis - dar valor à floresta. Resta saber se a política ambiental, realmente, não mudará.