Título: Projetos de conservação crescem no país
Autor: Capela , Maurício
Fonte: Valor Econômico, 16/05/2008, Empresas, p. B6

A valorização histórica do preço do petróleo e o aquecimento global colocaram a energia no centro do debate mundo afora. Muitas são as propostas sobre como melhorar o uso desse insumo. Vão desde a busca crescente por novas fontes de energia, como a geração do etanol a partir do milho, até o desenvolvimento de maquinário com tecnologias de maior eficiência. Mas pouco se discute sobre a conservação de energia.

No país, um levantamento feito pela Associação Brasileira das Empresas de Conservação de Energia (Abesco) mostra que o desperdício por aqui chega a R$ 10 bilhões por ano. E inclui desde um equipamento industrial altamente consumidor do insumo, passando por um sistema obsoleto de ar-condicionado de um condomínio comercial, até um sistema ineficiente de iluminação pública e privada.

"O aumento do preço do megawatt/hora e a diversificação de fontes de energia vão impulsionar a busca por conservação. Mas não vejo este cenário ainda no país", conta Aldemir Spohr, diretor da APS Engenharia, que está há 15 anos neste mercado. "Viabilizar esses R$ 10 bilhões é uma decisão empresarial, que será impulsionada por incentivos para que as distribuidoras de energia invistam em projetos de eficiência e na disponibilização de linhas de financiamento", afirma Marco Donatelli, superintendente da Light Esco, braço da distribuidora fluminense Light para a comercialização de megawatts no mercado livre e também para a execução de projetos de conservação de energia.

Ricardo da Silva David, presidente da Abesco, informa ao Valor que o mercado de conservação de energia no Brasil movimentou R$ 650 milhões no ano passado. A previsão, diz o executivo, é que este ano fature R$ 800 milhões, fruto da crescente procura por projetos de conservação. "Nesta cifra, estão os programas institucionais do governo, como o Reluz que melhora o consumo da iluminação pública, e as iniciativas de distribuidoras, companhias de engenharia que desenham estes projetos para a indústria e comércio", diz.

Nesta semana, por exemplo, a Eletrobrás, a AES Eletropaulo e a prefeitura de São Bernardo do Campo (SP) assinaram um contrato para implantação do Programa Nacional de Iluminação Pública e Sinalização Semafórica Eficientes na cidade. O programa, que vai demandar R$ 7 milhões, objetiva reformar 13,6 mil pontos de iluminação pública do município em um ano, o que equivale a 34% do total. Em geral, as obras vão substituir as lâmpadas de mercúrio por lâmpadas de vapor de sódio de alta pressão, que têm o dobro de vida útil. A economia de energia prevista ao cabo do projeto é de 25%.

O consenso é que este mercado no Brasil só não é maior hoje por falta de informação entre o grande comércio - shopping centers, supermercados e outros - e indústria. Além disso, as companhias que vendem os serviços reclamam da falta de uma legislação específica que criasse alguma obrigatoriedade, como a cidade de São Paulo fez com relação ao uso da energia solar. Em junho deste ano, entra em vigor uma lei na capital paulista que obriga os edifícios residenciais novos com quatro banheiros por apartamento a adotarem o aquecedor solar de água.

De acordo com os cálculos da Abesco, os projetos de conservação de energia costumam propiciar um redução de 15% quando aplicados em indústria, de 30% no comércio e de até 45% no setor público. "O valor médio de um projeto desse tipo é de R$ 700 mil e seu prazo de retorno é de 36 meses em média", conta o presidente da entidade.

A julgar pelo exemplo da APS Engenharia, faz sentido. O diretor da companhia conta que implementou um projeto de conservação de energia em uma cerâmica de Santa Catarina, que trouxe uma economia próxima dos 90%. Em linhas gerais, a APS pegou o gás da queima da cerâmica nos fornos e o utilizou na estufa usada para secar o produto na sua fase de pós-polimento. Antes disso, a estufa usava gás natural. E, segundo o executivo da APS, a companhia ceramista catarinense desembolsou ao redor de R$ 250 mil e seu investimento se pagou em pouco mais de 8 meses. A APS faturou R$ 15 milhões no ano passado e estima crescer 50% em 2008.

Outro exemplo da conservação de energia aplicada na prática vem da Light Esco. Segundo o superintendente da companhia, Marco Donatelli, um projeto de conservação que mire somente a central de água gelada usada também no abastecimento do ar-condicionado de um condomínio de escritórios pode demandar investimento entre R$ 1 milhão e R$ 2 milhões. Já em sistemas de iluminação, a alocação de recursos oscila entre R$ 200 mil e R$ 600 mil. Em outras palavras, se uma empresa resolve implantar as duas ações, a economia em energia poderá chegar a 50% e o retorno do investimento será visto em meia década.

"Há uma maior procura por eficiência energética, porque existe uma conscientização sobre o custo da energia. Basta ver o preço do insumo no mercado livre", diz o executivo da Light Esco, que faturou R$ 36 milhões no ano passado e projeta R$ 80 milhões para 2008. O preço médio da energia no mercado livre foi de R$ 502 em janeiro, caindo para R$ 127 em março de 2008.

Apesar do bom desempenho do ano passado e da projeção de incremento em 2008, a maior parte da receita ainda virá da comercialização no mercado livre, algo como 80%. E os 20% outros sairão dos projetos de conservação de energia.