Título: Riqueza oculta
Autor: Monteiro , Luciana
Fonte: Valor Econômico, 20/05/2008, EU & Investimento, p. D1
Após vários recordes consecutivos do Índice Bovespa depois de o Brasil ter obtido o selo de investimento não-especulativo, muitos se perguntam se ainda há espaço para novas altas para a bolsa. Levantamento elaborado pela gestora GAS Investimentos mostra que novas valorizações são bem possíveis, sim, graças a setores com menor representatividade no índice.
Com a forte demanda sobre as matérias-primas, boa parte da valorização do Ibovespa do ano passado para cá foi foi por conta de ações de empresas produtoras de commodities, sobretudo Petrobras e Vale . Agora, além de a expectativa continuar bastante positiva para esses dois papéis, o indicador pode ser turbinado por outros setores também importantes no índice. É o caso, por exemplo, de siderurgia, com peso de 9,79% no índice, e dos bancos, com 15,02% - o setor siderúrgico já responde pelas cinco maiores altas do Ibovespa no ano.
Sozinhas, Petrobras, Vale e Bradespar detêm 34,29% do Ibovespa e, por isso, influenciam muito o comportamento do indicador. O estudo da GAS revela que, ao se excluir Petrobras, Vale e Bradespar (holding da mineradora), o índice teria subido 319,4%, bem menos que os 444,80% registrados no período. Para fazer o levantamento, a gestora levou em conta o percentual de cada uma dessas três empresas em cada carteira teórica do Ibovespa - revisada a cada quadrimestre - de janeiro de 2001 para cá. O resultado dá indícios de que outras ações com menor peso no índice podem subir relativamente mais do que esses três papéis, avalia Silvia Sandoval, autora do estudo e responsável pela área de relações com investidores da GAS.
A concentração de alguns papéis ou segmentos no Ibovespa é tão grande que somente Petrobras, Vale, Bradespar, além de bancos e siderúrgicas, têm quase 50% do principal indicador da bolsa. E, para todos eles, as perspectivas se mostram muito boas, avalia Gabriel Vidigal, diretor de renda variável do escritório de aconselhamento financeiro Tag Investimentos. "As análises mostram que, mesmo com a alta obtida após o grau de investimento, as perspectivas para a bolsa brasileira continuam favoráveis."
No caso dos bancos, a melhora do rating soberano beneficia a percepção do risco de crédito dos bancos brasileiros ante as instituições financeiras de países que também são classificados como "investment grade". Ao avaliar a lucratividade dos bancos locais, os estrangeiros podem ser estimulados a trazer mais capital para esses ativos, avalia Vidigal. Do setor, estão presentes no Ibovespa hoje os papéis do Bradesco, Banco do Brasil, Itaú, Itaúsa (controladora do Itaú), Nossa Caixa e Unibanco.
Para a siderurgia, no caso das produtoras de aços longos, usados na construção civil, os papéis da Gerdau aparecem como destaque, dada a carência habitacional do país, diz Vidigal. Já para as produtoras de aços planos, Usiminas e CSN podem ser beneficiadas em face da venda recorde de automóveis e vagões. O executivo lembra ainda o fato de a Petrobras ter divulgado licitação para a compra de 146 navios, o que demandará muito aço.
Embora com participação relativamente pequena no Ibovespa, de 2,81%, o setor de construção e engenharia é uma das apostas da GAS. "Esse foi um segmento que sofreu bastante com a crise das hipotecas de alto risco nos Estados Unidos, pois os investidores fizeram uma analogia simplificada e, antes do 'investment grade' alguns papéis chegaram a cair 40%", lembra Silvia. Quando o grau de investimento chegou, algumas ações de construção até se recuperaram, mas a expectativa de alta dos juros para conter as pressões inflacionárias voltou a castigar os papéis. Segundo cálculos da executiva, a relação Preço/Lucro - P/L, referencial que estima em anos o tempo de retorno do investimento na ação e, portanto, quanto menor, melhor para o investidor - do setor de construção civil está em 4 vezes, enquanto que o do mercado em geral está em 12 vezes.
As ações de setores como bancos, papel e celulose, energia elétrica e telecomunicações devem dar um novo impulso para o Ibovespa num momento favorável, diz Ralph Rosenberg, gestor de renda variável da Perfin Investimentos. Além disso, segmentos com menor peso no índice como construção civil e consumo devem se beneficiar mais quando o cenário sobre o comportamento da inflação e o aumento dos juros estiverem mais claros. "Esses papéis subiram bastante após o anúncio do grau de investimento, mas voltaram a perder à espera dos impactos de perda de renda da população por conta da alta de preços", diz. "Apesar disso, acredito que esses dois setores serão as grandes vedetes do segundo semestre."
Na avaliação do executivo, mesmo com as altas recentes do Ibovespa após a obtenção do "investment grade", estimar uma valorização de 20% para o índice ainda é perfeitamente factível.
Já as empresas mais sensíveis à alta da taxa de juros devem ser afetadas, avalia Luciano Tavares, sócio da Nest Investimentos. Ele lembra que, antes do "investment grade" os papéis da Lojas Americanas estavam praticamente no preço mínimo de 2006. Após o anúncio da elevação da nota brasileira, o papel subiu 40% em dois dias, mas, diante da expectativa de juros mais altos, a ação voltou.
Já as companhias ligadas às commodities agrícolas devem continuar dando aos investidores bons resultados, diz Tavares. O setor de alimentos no Ibovespa - representado por Perdigão, Sadia e JBS - responde por 3,75% do índice. Ele cita ainda o setor de papel e celulose, com atenção especial para Aracruz. No ano, os papéis preferenciais série B da empresa acumulam alta de 17,01%, dos quais 12,08% somente neste mês.
Apesar da alta de 21,42% no ano das ações preferenciais (PN, sem direito a voto) série A da Vale, os especialistas ainda vêem um forte potencial de valorização para os papéis. Vidigal, da Tag, lembra como fator positivo para a empresa os reajustes de 65% do minério de ferro e de 86% da pelota obtidos pela empresa, que só começam a valer neste trimestre. "A ação da empresa, portanto, teria ainda muito gás pela frente", diz. Os papéis de segunda linha também são aposta de alguns gestores. De janeiro de 2007 para cá, o Índice Valor Bovespa de Ações de Segunda Linha (IVBX-2) acumula alta de 24,40%, ante ganho de 63,62% do Ibovespa no mesmo período.