Título: Classe C está pronta para comprar imóveis
Autor: Madureira, Daniele
Fonte: Valor Econômico, 19/05/2008, Empresas, p. B6

Pelo menos um em cada dez brasileiros pretende comprar a casa própria dentro de 12 meses. Dos interessados na aquisição, quase a metade está na classe C e pouco mais de um terço (35%) dos futuros proprietários têm entre 25 e 34 anos. Curiosamente, esse mesmo percentual, na mesma faixa etária, mudou de emprego nos últimos 12 meses. É o que mostra a pesquisa Target Group Index, do Ibope Mídia, voltada à medição do consumo de produtos, serviços e mídia e que, pela primeira vez, perguntou aos entrevistados quais os grandes eventos da sua vida - passados e futuros. No planejamento de curto prazo da população, ganham destaque a aquisição da casa (11% das respostas), a compra do primeiro automóvel (8%), a reforma da residência (7%), a troca de emprego (6%) e a viagem ao exterior pela primeira vez (6%). Foram ouvidas 19 mil pessoas, de nove regiões metropolitanas e do interior do Sul e do Sudeste, entre agosto de 2007 e janeiro deste ano.

Para especialistas, o brasileiro está confiante na economia e determinado a realizar os seus maiores sonhos de consumo. Por isso se mantém sintonizado com o mercado de trabalho, sempre em busca de oportunidades de ascensão sócio-econômica. "As pessoas não estão mais dispostas a se manter presas a determinado emprego, querem aproveitar o bom momento para crescer junto com o país", afirma Dora Câmara, diretora comercial do Ibope Mídia. O ícone da auto-realização é a compra do próprio teto, plano número um apontado na pesquisa do Ibope. "Quisemos investigar quais passos da vida do indivíduo são planejados e o que tem mais peso na sua história", diz Dora. Foram ouvidos consumidores de ambos os sexos, das classes AB, C e DE, de 12 a 64 anos.

A classe C é a mais disposta a comprar e reformar dentro dos próximos 12 meses, iniciativas em que as mulheres dão as cartas. "Elas decidem tudo o que fica exposto na casa, enquanto que a opinião do marido só prevalece sobre o que está escondido - fios, tubos e tijolos", brinca Mauro Florio, diretor de marketing da rede de home centers C&C. Hoje, diz ele, as mulheres já são maioria (52%) entre os freqüentadores das lojas. "Elas nos levaram a aumentar a variedade das categorias", diz. Não por acaso, no mix de 45 mil itens da C&C há cada vez mais artigos de decoração, utilidades domésticas, lavanderia, mobília e jardinagem.

Outra mudança percebida pela rede está na maior presença de consumidores da classe C. Este público, chamado de "consumidor formiga" (compra o material de construção aos pouquinhos para erguer ou reformar a casa por conta própria), sempre se abasteceu nos pequenos depósitos de construção da vizinhança, normalmente na periferia. "Mas o aumento do poder de renda o trouxe para as nossas lojas, que também passaram a oferecer itens modernos e mais acessíveis", diz Florio. Um exemplo são os chuveiros, muito procurados nessa época do ano. "Além dos modelos médios, que custam entre R$ 70 e R$ 80, o consumidor também pode encontrar duchas de R$ 28 de fabricantes tradicionais, como Lorenzetti", diz.

A recém-lançada Cytec+, resultado da parceria entre a incorporadora Cyrela e a construtora Tecnum, tem consciência da enorme demanda reprimida presente na classe C - mas que pode ser atendida até certo ponto. "Nossos imóveis são destinados a famílias com renda média mensal de cinco salários mínimos (cerca de R$ 2 mil)", afirma Yorki Estefan, sócio-diretor da Cytec+. Tecnicamente, entrariam nessa conta apenas o topo da classe C1 (renda média mensal familiar de R$ 1,44 mil), prestes a migrar para a B2 (R$ 2,47 mil). Segundo Estefan, fazem parte da clientela da Cytec+ profissionais como secretárias, enfermeiras, policiais e comerciários. "Nós ainda não chegamos à classe C de fato", afirma.

Com atuação no segmento econômico (apartamentos de R$ 70 mil a R$ 110 mil), a Cytec+ se prepara para entrar até o fim do ano no supereconômico, com casas de R$ 50 mil a R$ 70 mil. "Eles também se preocupam com segurança, querem imóveis de dois ou três dormitórios, com cozinha americana e uma área de lazer racional, que não gere novas despesas", afirma Estefan. Na Cytec+, é preciso comprovar a renda, mas o tempo de trabalho não é pré-requisito na avaliação do comprador, que em 100% dos casos opta por financiar.

Na Caixa Econômica Federal (CEF) - que iniciou dia 14 a quarta edição do Feirão Caixa da Casa Própria, em 10 capitais - o financiamento pode chegar a 100% do valor do imóvel e o prazo se estende até 30 anos. Cerca de 70% dos compradores são famílias que ganham até cinco salários mínimos e a maioria procura por imóveis de até R$ 50 mil. Para anunciar o feirão, a CEF levou ao ar uma campanha nacional com o ex-jogador Raí, criada pelaNovaS/B. O orçamento da CEF para habitação neste ano é recorde: R$ 20,3 bilhões.

Na avaliação de Eduardo Chehab, diretor da agência Standard & Poor's, a indústria imobiliária está sendo favorecida pelo bom momento do mercado de capitais no Brasil, em que levantou R$ 13,3 bilhões desde setembro de 2005, apenas com emissões primárias. "O setor já chama a atenção de fundos americanos e europeus, principalmente agora, que o país atingiu o grau de investimento", diz.