Título: STF limita uso de MPs para créditos extraordinários
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 19/05/2008, Opinião, p. A10

A partir da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que restringiu o poder de o presidente da República abrir créditos extraordinários ao Orçamento por medidas provisórias, créditos adicionais só poderão ser criados de forma extraordinária para atender a despesas imprevisíveis e urgentes - guerra, comoção interna ou calamidade pública, conforme define o parágrafo 2° do artigo 167 da Constituição.

A decisão, aprovada na quinta-feira por 6 votos a 5, encerrou o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade do PSDB contra a MP 405, que liberou R$ 5,45 bilhões para a Justiça Eleitoral e diversos órgãos do Executivo. Ela foi convertida na lei 11.658 em abril, o dinheiro já foi gasto e não será devolvido. Mas o que está na Constituição, lembrou o STF, é para ser respeitado.

De dezembro de 2007 até agora o DEM e o PSDB contestaram, em oito ações diretas de inconstitucionalidade, a liberação de R$ 25,1 bilhões em créditos por MPs. O orçamento da União deste ano, que se aprovado no final do ano passado, conforme se espera do Legislativo, teria evitado tantos pedidos de abertura de crédito, só foi aprovado pelo Congresso no dia 12 e sancionado no dia 24 de março.

O entendimento do STF, desta vez, contrariou outras duas manifestações do próprio Supremo, em 2001 e 2005. Nestas ocasiões, o tribunal entendeu que não caberia ao Supremo analisar a imprevisibilidade da abertura de créditos por medidas provisórias, tarefa política de competência do Executivo com posterior apreciação do Legislativo.

Daqueles anos para cá, o governo exacerbou no uso desse expediente, levando a que parte substancial do orçamento seja gasto sem passar pela aprovação do Congresso, cuja função essencial é discutir as prioridades e aprovar os gastos da União para o exercício seguinte.

Neste ano, o governo já editou 23 medidas provisórias para liberar R$ 62,5 bilhões, segundo cálculos citados pelo ministro Celso de Mello, durante a votação - valor que corresponde a 10% do orçamento no período. "Em outras palavras, tem-se na prática um orçamento paralelo", criticou o ministro do STF.

O governo pode abrir créditos adicionais ao orçamento por três caminhos. O crédito suplementar, que se refere ao complemento de recursos a dotações já existentes, pode ser aberto por decreto. O especial, para incluir novos programas no orçamento já aprovado, deve ser solicitado mediante projeto de lei. E o extraordinário pode ser aberto por medida provisória, desde que atendo-se a casos imprevisíveis e urgentes, como enchentes ou qualquer outro tipo de calamidade pública.

Diante da morosidade ou falta de empenho do Congresso para aprovar medidas provisórias, que estão sistematicamente trancando a pauta, e para votar projetos de lei, o Executivo passou a legislar por MP sem qualquer cerimônia, a despeito da questionável relevância ou urgência dos temas, não só orçamentários mas de natureza diversa, conforme o artigo 62 da Constituição.

Desde 1995 foram abertos 139 créditos extraordinários num valor total de R$ 232,2 bilhões. Nos oito anos do governo de Fernando Henrique Cardoso, foram editadas 59 MPs envolvendo liberação de R$ 191,1 bilhões. A grande maioria desses atos (73%) se referiram a despesas imprevisíveis. Em 2002, o governo tucano, atendendo à solicitação do governo de transição, editou 13 medidas provisórias de crédito extraordinário, reunindo, nestas, os pedidos de crédito suplementar e os de créditos especiais que tramitavam no Congresso.

Entre 2003 e março deste ano, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva editou 80 MPs com pedidos de créditos extraordinários, num valor total de R$ 113 bilhões. Desses, apenas 1,2% teria atendido ao quesito da imprevisilibidade. Segundo dados coletados pelo PSDB que sustentaram a ação, 98,8% dos recursos orçamentários liberados por MPs nesse período foram destinados a suplementação de verbas por ausência de planejamento governamental.

O fato é que cabe ao poder Executivo elaborar o orçamento do modo mais realista possível. E ao Legislativo aprová-lo, com as mudanças que considerar necessárias e de forma tempestiva, pois esta é uma das suas funções mais nobres.