Título: Palocci e Mabel temem que volta da contribuição contamine reforma tributária
Autor: Izaguirre , Mônica
Fonte: Valor Econômico, 21/05/2008, Política, p. A7

O presidente e o relator da comissão especial da reforma tributária na Câmara, deputados Antonio Palocci (PT-SP) e Sandro Mabel (PR-GO), anunciaram ontem que são contra um eventual aproveitamento da respectiva proposta de emenda constitucional (PEC) para recriar um tributo sobre movimentação financeira, semelhante ao que era a CPMF. Levada em conta pela base governista, a posição assumida pelos dois parlamentares abortou a apresentação, ontem, pelo PT, de uma emenda nesse sentido à PEC da reforma.

Segundo o deputado Cláudio Vignatti (PT-PR), uma reunião com objetivo de discutir a possível emenda chegou a ser convocada pela liderança do partido para o fim da tarde de ontem, mas acabou sendo cancelada. A base governista não desistiu de criar um substituto para a CPMF para financiar gastos com Saúde. Isso ainda é considerado importante para viabilizar o aumento de recursos previstos no projeto de regulamentação da Emenda Constitucional 29, de autoria do senador Tião Viana (PT-AC), já aprovado pelo Senado. Porém, para não contaminar nem emperrar o debate da reforma tributária, a idéia agora é usar outra proposição legal, específica sobre o financiamento da Saúde.

"Incluir uma nova CPMF na PEC seria trazer um inimigo para dentro da reforma tributária", disse Sandro Mabel. Diante disso, ele descartou a possibilidade de seu substitutivo, prometido para 20 de junho, acatar qualquer emenda nesse sentido. "Não seria adequado", concordou Antonio Palocci, deixando claro seu apoio ao relator, durante audiência pública realizada ontem pela comissão.

Ambos fizeram questão de ressaltar, por outro lado, que não têm poder de impedir que uma eventual emenda criando uma nova CPMF seja acolhida pela comissão, ao votar destaques ao substitutivo do relator. Se a maioria da comissão, dominada pelos governistas, quiser acolher um destaque nesse sentido, "não teremos o que fazer", desculpou-se preventivamente Sandro Mabel. Ouvido ontem pela comissão, o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, também defendeu que é melhor não misturar o debate da reforma com CPMF.

No fim da audiência pública, Sandro Mabel anunciou que pretende, com o seu substitutivo, alterar o trecho da PEC que trata da base de incidência do Imposto sobre Valor Adicionado Federal (IVA-F, que vai substituir Cofins, PIS, Cide e Salário-Educação). A idéia é construir um texto que assegure, efetivamente, que só sejam tributadas pelo IVA-F operações com bens e serviços que hoje são objeto de PIS-Cofins.

O relator fez o anúncio depois que dois tributaristas ouvidos pela comissão alertaram para o perigo de o futuro imposto servir para tributar "qualquer coisa", inclusive movimentações financeiras e patrimônio. Conforme Everardo Maciel, ex-secretário da Receita Federal, e Antônio Carlos do Amaral, representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), do jeito que está, a PEC dá um "cheque em branco" para que esse ou futuros governos façam do IVA-F (cujo nome oficial é outro) um tributo sobre bens tangíveis ou intangíveis, móveis ou imóveis. Na avaliação de Amaral, até pessoas físicas poderão ser alvo de tributação pelo imposto, se não houver uma definição mais precisa da base de incidência, definida na PEC como operações com bens e serviços. "Potencialmente, esse imposto pode ser usado para tributar pessoas jurídicas e físicas em todas as suas vertentes", disse o representante da OAB. Virtualmente, portanto, abre um espaço para aumento "infinito" de carga tributária, alertou.

Everardo Maciel concordou com Antônio Carlos do Amaral e disse que a definição prevista na PEC "não serve para compreender o conceito" de valor adicional, isto é, de um tributo não cumulativo. Ambos também defenderam que muitos pontos propostos, inclusive a reforma do Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICMS), que é o ´coração´ da PEC, não necessitaria de emenda constitucional. Para eles, bastaria lei complementar . A PEC do governo também foi bastante criticada por outro ex-secretário da Receita Federal, Osiris Lopes Filho. Ele vê retrocesso, entre outros pontos, no fim das contribuições vinculadas à seguridade social (Cofins e CSLL, esta última a ser absorvida pelo IR das empresas). O presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), Gilberto Luiz do Amaral, também fez críticas mas apresentou uma série de sugestões de aperfeiçoamento, entre elas a inclusão de um dispositivo que permita, na regulamentação, cobrar alíquotas diferenciadas do IVA-F e do ICMS de acordo com o impacto ambiental de cada produto. Também participou do debate de ontem Antônio Trevisan, presidente da Academia Brasileira de Ciências Contábeis. Ele vê avanço na PEC, principalmente por reduzir o número de tributos e unificar a legislação do ICMS.