Título: Importação ameaça setores intensivos em tecnologia, aponta estudo do BNDES
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 26/05/2008, Brasil, p. A2

As indústrias de produtos eletrônicos, instrumentos médicos e de automação estão na mira do governo. Um estudo realizado pelo BNDES indica que essas são as áreas que mais sofrem a concorrência de importados e podem sucumbir a um processo de desindustrialização no longo prazo, caso não sejam realizados investimentos para a modernização e o aumento da capacidade instalada dos seus parques industriais.

Conforme o estudo, setores intensivos em engenharia e tecnologia, que incluem máquinas e equipamentos, complexo eletrônico e automação industrial, responderam por 60% do aumento das importações no período de 2004 a 2007, quando a participação de importados no consumo passou de 15,4% para 20,3%. Os setores intensivos em escala, onde se insere a indústria química, responderam por 28% do aumento do coeficiente de importação.

Entre 2004 e 2007, o complexo eletrônico, por exemplo, apresentou aumento anual de 26,4% nas importações e de 12% na produção, para atender a uma elevação no consumo de 16,9%. Na área de instrumentação médica e de automação industrial, as importações registraram incremento de 35,1% ao ano, muito superior ao aumento médio de 6% na produção. No período, o consumo aparente no país cresceu 21,2% por ano.

"O consumo de itens que têm dependência maior de importados cresceu. Não é um processo exclusivo do Brasil", afirma Fernando Puga, assessor da presidência do BNDES. Ele observa que esses setores normalmente registram saltos de crescimento no períodos em que há aumento da renda das famílias e da oferta de crédito. "Não é que haja um processo de desindustrialização. A produção no país se mantém mais ou menos no mesmo patamar de dez anos atrás. Como o consumo cresce, a participação de importados aumenta."

Para Puga, o coeficiente de importação deve apresentar mais elevações, mas em patamares inferiores aos verificados nos últimos dois anos. "Também houve aumento das importações de máquinas, que puxam o aumento da capacidade das indústrias e ajudam a reduzir a dependência de importados no longo prazo."

O segmento de máquinas e equipamentos registrou no período de 2004 a 2007 elevação anual de 11,1% no consumo, com incremento de 8,8% ao ano na produção e de 19,8% nas importações. Fernando Sarti, professor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) também considera positivo o aumento das importações com crescimento do nível de atividade, ainda que este último ocorra em escala menor. "Não é preciso internalizar todos os segmentos. Mas no setores que já têm parque industrial no país e que não têm capacidade de atender à demanda, nesses é importante estimular investimentos", afirma. Sarti cita os setores de autopeças, químico e de produtos eletrônicos como os que necessitam investimentos para ganharem competitividade.

Júlio Gomes de Almeida, consultor do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), alerta para o risco de "esvaziamento da produção". "A indústria de bens de capital está ficando oca, como a de eletrônicos. Os setores importam partes e peças para produzir máquinas e equipamentos. A produção cresce, mas o valor agregado, não. Esse movimento também ocorre em outros setores, mas agora não se sente porque o país passa por um crescimento vigoroso", avalia Almeida.

Puga, do BNDES, pondera que investimentos em máquinas e equipamentos e na cadeia automotiva devem levar a um aumento da capacidade instalada e a uma menor dependência de importados no longo prazo. No setor químico, a preocupação recai principalmente sobre a área de fertilizantes, que tem grande peso nas importações. De acordo com o estudo do BNDES, as importações do setor cresceram 10,4% ao ano desde 2004, enquanto a produção nacional, 2,6%. "Os novos investimentos da Petrobras em gás natural permitirão o incremento da produção", afirma Puga.