Título: Benefícios do controle de doenças
Autor: Jamison , Dean T. ; Lomborg , Bjørn
Fonte: Valor Econômico, 26/05/2008, Opinião, p. A13

Vastas partes do mundo não desfrutaram o extraordinário progresso ocorrido nas condições sanitárias ao longo do século passado. De fato, milhões de mortes nos países empobrecidos são evitáveis com opções de prevenção e tratamento que o mundo rico já usa.

Neste ano, 10 milhões de crianças morrerão em países de baixa e média renda. Se as taxas de mortalidade infantil fossem iguais às existentes nos países desenvolvidos, esse número ficaria abaixo de um milhão. Inversamente, se as taxas de mortalidade infantil fossem iguais às dos países ricos há apenas 100 anos, o número seria de 30 milhões.

A principal diferença entre agora e então não é renda, mas conhecimento técnico sobre as causas das doenças e as intervenções necessárias para evitar doenças, ou, ao menos, os sintomas mais nefastos. As ferramentas existentes hoje para melhorar a saúde pública são tão poderosas e baratas que as condições sanitárias poderiam ser razoavelmente boas até nos países pobres, mesmo se os formuladores de política gastassem relativamente pouco nos lugares certos.

Pesquisa recente conduzida para o "Copenhague Consensus" identifica seis opções com excelente relação custo-benefício que poderiam atacar alguns dos mais urgentes problemas de saúde do planeta.

O investimento mais promissor está no tratamento da tuberculose. Aproximadamente 90% das 1,6 milhão de mortes por tuberculose em 2003 ocorreram nos países de baixa e média renda. Devido ao fato de a tuberculose afetar pessoas economicamente ativas, ela pode se transformar num gatilho de pobreza familiar.

A base do controle é o tratamento imediato, usando medicamentos de primeira linha que não exigem um sistema de saúde sofisticado. Um gasto de US$ 1 bilhão com o tratamento da tuberculose em um ano poderia salvar um milhão de vidas. Considerando que a boa saúde acompanha níveis mais altos de prosperidade econômica nacional no longo prazo, os benefícios econômicos equivalem a US$ 30 bilhões.

O segundo investimento com a melhor relação custo-benefício é o enfrentamento das doenças cardiovasculares. Doenças cardíacas podem não parecer um tema urgente para os países pobres, mas representam mais de um quarto do seu número de vítimas fatais. Iniciativas para reduzir fatores de risco que não o fumo - ingestão elevada de gordura animal saturada, obesidade, consumo desenfreado de álcool, falta de atividade física e baixo consumo de frutas e vegetais - tiveram pouco sucesso.

Tratar ataques cardíacos agudos com medicamentos baratos mantém, contudo, uma boa relação custo-benefício. Um gasto de US$ 200 milhões poderia evitar centenas de milhares de mortes, produzindo benefícios 25 vezes superiores aos custos.

-------------------------------------------------------------------------------- O gasto de US$ 1 bilhão com iniciativas como imunização poderia salvar um milhão de vidas anualmente e gerar benefícios de US$ 20 bilhões --------------------------------------------------------------------------------

A terceira opção é a prevenção e o tratamento da malária. O investimento de US$ 1 bilhão ampliaria o abastecimento de mosquiteiros tratados com inseticidas e facilitaria o fornecimento de tratamento altamente eficaz. Esta ação pouparia mais de um milhão de mortes infantis e geraria benefícios econômicos equivalentes a US$ 20 bilhões. O embrionário Centro de Medicamentos Acessíveis-malária (AMFm, Affordable Medicines Facility-malaria) é um mecanismo especialmente atraente para dedicar recursos ao controle da malária.

A quarta alternativa para formuladores de política é concentrar-se em iniciativas de saúde infantil. As melhores providências são as familiares: expandir a cobertura da imunização, estímulo ao aleitamento materno, aumento do uso de tratamentos simples e baratos para diarréia e pneumonia infantil, vasta distribuição de micronutrientes importantes e a disseminação do uso de drogas anti-retrovirais e substitutos ao leite materno para prevenir a transmissão do HIV da mãe para o filho.

A expansão da imunização e a cobertura de micronutrientes são possivelmente as providências mais críticas. O gasto de US$ 1 bilhão com esse tipo de iniciativas poderia salvar um milhão de vidas anualmente e gerar benefícios econômicos equivalentes a mais de US$ 20 bilhões ao ano.

A opção seguinte é a redução do número de mortes relacionadas com o tabaco. Pelos padrões atuais, o fumo de cigarros será responsável por 10 milhões de mortes por ano até 2030, cuja maioria ocorrerá nos países pobres.

Cerca de 100 milhões dos 200 milhões de jovens fumantes do sexo masculino da China e aproximadamente 40 milhões dos 100 milhões de jovens fumantes do sexo masculino da Índia um dia morrerão de causas relacionadas com o tabaco. Uma abordagem multifacetada ao controle do fumo é uma das poucas abordagens comprovadas para a prevenção de doenças cardíacas e câncer. Um imposto do tabaco é particularmente eficaz, pelo qual um aumento de 10% no preço reduz o consumo em 4% a 8%.

Impedir a propagação do HIV/Aids é a sexta opção. Para dezenas de países em todo o mundo, a epidemia da Aids ameaça cada aspecto do desenvolvimento. Mas há também algumas boas notícias: as taxas de contaminação do HIV estão diminuindo em grandes extensões da Ásia e América Latina, o que parece refletir um (muito desigual) aumento nos programas de prevenção.

Os maiores sucessos na prevenção envolvem o que tem sido chamado de "prevenção combinada", englobando um aperfeiçoamento simultâneo e substancial de múltiplas intervenções, incluindo distribuição de camisinhas, tratamento de doenças sexualmente transmitidas, circuncisão masculina e intervenções de grupo entre prostitutas. A prevenção de dois milhões de infecções de HIV a cada ano seria relativamente cara, a um custo de US$ 2,5 bilhões, mas renderia benefícios 12 vezes maiores.

As mudanças que estamos advogando visam áreas específicas de necessidade, em vez do fortalecimento da capacidade do sistema de saúde. Mas existe uma importante exceção: o fortalecimento da capacidade cirúrgica, particularmente em hospitais locais, pode tratar condições abdominais de forma barata (e muitas vezes, decisiva). Investimentos há muito esquecidos em capacidade cirúrgica poderiam render retornos elevados.

Mesmo se os custos de todas essas iniciativas fossem três ou quarto vezes maiores do que avaliamos, essas iniciativas ainda ofereceriam oportunidades extraordinárias para a redução da desigualdade sanitária e de fazer o bem no mundo.

Dean T. Jamisoni é economista e professor na Escola de Medicina da Universidade da Califórnia, em San Francisco, e professor convidado em Saúde Pública e Desenvolvimento Internacional na Escola Kennedy e na Escola de Saúde Pública da Universidade Harvard.

Bjørn Lomborg é chefe do Copenhagen Consensus Center, professor associado na Escola de Negócios Copenhagen e autor de "O ambientalista cético" e "Cool It - muita calma nessa hora - O guia de um ambientalista cético sobre o aquecimento global". © Project Syndicate/Europe´s World, 2008. www.project-syndicate.org