Título: Governadores da Amazônia ausentam-se de posse de Minc
Autor: Costa , Raymundo ; Rittner , Daniel
Fonte: Valor Econômico, 28/05/2008, Política, p. A9

Marina troca agrados com Dilma: "Eu não tenho mágoa, graças a Deus. O meu gesto visava constituir um novo acordo" Sem a presença dos nove governadores da Amazônia Legal, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu posse ontem ao novo ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc. Lula disse que em seu governo não existe política de "ministro A ou ministro B", mas que a política ambiental é aquela que está no programa que o fez ganhar as eleições de 2002 e de 2006. A resolução sobre a concessão de crédito oficial na Amazônia, no entanto, está sendo revisada e o assunto deve tomar conta da reunião que os nove Estados da região marcaram para esta sexta-feira, em Belém (PA).

A reunião causa apreensão no Palácio do Planalto, onde o ministro das Relações Institucionais, José Múcio Monteiro, articula para que ela ocorra sem incidentes. Além dos governadores, é prevista a presença dos ministros Mangabeira Unger (Assuntos Estratégicos) e do recém-empossado Carlos Minc, autor de duras críticas ao governador de Mato Grosso, Blairo Maggi. O presidente Lula encarregou Múcio de convencer Minc a cessar com as críticas ao governador, que é considerado um aliado importante do Planalto. Minc vai amanhã a Boon para uma convenção das Nações Unidas sobre biodiversidade (Cop-9) e volta a tempo de participar da reunião com os governadores.

O senador Tião Viana (PT-AC), aliado da ministra demissionária Marina Silva, tentou descaracterizar a ausência dos governadores da Amazônia como um boicote ao novo ministro ou à política ambiental do governo. Seu irmão, Jorge Viana, que foi cotado para o cargo de ministro do Meio Ambiente, também compareceu à posse. Mas, segundo Tião, os governadores não foram a Brasília por problemas de agenda - a posse estava marcada há uma semana. Apenas dois governadores estiveram no Planalto: Wellington Dias, do Piauí, e Sérgio Cabral, do Rio de Janeiro, patrono da indicação de Carlos Minc.

A resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN) está entre os principais desafios do início da gestão do novo ministro. Ela foi editada para restringir o crédito oficial a produtores rurais sem comprovação de regularidade fundiária e ambiental, mas cresce no governo a defesa de que a medida seja relaxada.

Minc também terá, logo de cara, duas pendências para resolver na área de licenciamento: o parecer ambiental sobre a usina nuclear de Angra 3 e as mudanças feitas na hidrelétrica de Jirau, no rio Madeira. Para a presidência do Ibama, ele promoveu o diretor de licenciamento, Roberto Messias Franco, ex-superintendente da autarquia em Minas Gerais e ligado ao PT do Estado.

Para o cargo de secretária-executiva, levou a bióloga Izabella Teixeira, funcionária de carreira do Ibama e uma auxiliar próxima na Secretaria do Ambiento do Rio. Izabella fez mestrado em Planejamento Energético pela Coppe, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e sua tese "Indicadores Ambientais para o Monitoramento de Florestas Ambientais no Brasil" recebeu orientação de Maurício Tolmasquim, presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e braço-direito da ministra Dilma Rousseff no setor elétrico. No doutorado, Izabella estudou a avaliação ambiental e estratégica na exploração de petróleo. Prometeu usar essa experiência para "abrir processos de negociação e identificar claramente onde estão gargalos do licenciamento".

Após tomar posse, Minc rechaçou com ironia o rótulo de facilitador de licenças ambientais sem rigor. "Não sou um carimbador maluco", afirmou o ministro, apreciador de música, em referência à canção de Raul Seixas. Ele garantiu que trabalhará em harmonia com a chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. "Tive uma longa conversa com a Dilma e nos entendemos muito bem. A nossa música é 'dois-pra-lá e dois-pra-cá'. Duas licenças e dois PACs ambientais."

Como de hábito nas despedidas de seus colaboradores mais próximos, Lula aproveitou o discurso para elogiar a trajetória política de Marina no Acre e desempenho dela como ministra, além de garantir não ter ficado aborrecido com sua carta de demissão, que o teria pegado de surpresa. "Posso te dizer, Marina: o carinho, o respeito e a nossa relação de amizade fazem com que, nos momentos em que a gente teve maior divergência, a nossa amizade fosse inabalável." Ele rechaçou ainda a idéia de que a saída de Marina representará uma derrota do movimento ambientalista lembrando que a contusão de Pelé na Copa de 1962 não impediu o bicampeonato brasileiro, já que foi substituído por Amarildo.

O presidente defendeu o etanol brasileiro, criticou indiretamente os Estados Unidos por não terem assinado o Protocolo de Kyoto e ressaltou a tese de que não há preservação sem desenvolvimento. Mas buscou estender a questão ambiental para além da Amazônia. "As duas precisam ser preservadas, a praia de Copacabana e a floresta amazônica", disse Lula, que deu um conselho a Minc: "Quando tiver dúvida, não tenha vergonha: telefone para a Marina, que será sua parceira".

Sem despejar sorrisos, apesar dos afagos de Lula e de repetidos gestos de carinho de Dilma, a ex-ministra voltou a alertar sobre o risco de retrocesso na agenda verde do governo. Para evitar isso, defendeu a manutenção da resolução sobre crédito oficial. "Essa medida precisa ser inegavelmente implementada", frisou. Sobre a saída do governo, garantiu: "Eu não tenho mágoa, graças a Deus. Disse o tempo todo que o meu gesto visava constituir um novo acordo".

O presidente ironizou o estilo do novo ministro. "O Minc já falou em uma semana mais do que a Marina em cinco anos e meio".(Colaborou Daniela Chiaretti, de São Paulo).