Título: Debêntures estão em ritmo de espera
Autor: Adriana Aguilar ,
Fonte: Valor Econômico, 28/05/2008, Especial, p. F4

O impacto do grau de investimento no volume de emissão de títulos privados das empresas, conhecidos por "debêntures", deve levar mais tempo. Enquanto a bolsa brasileira tem batido recordes seguidos depois que a agência de classificação de risco Standard & Poor´s concedeu o selo de grau de investimento ao Brasil, no mercado de renda fixa, a história é outra. As empresas aguardam melhores condições para emitir debêntures. Insegurança em relação ao cenário externo, elevação dos prêmios pagos àqueles que investem em debêntures e compulsório sobre os recursos repassados pelas empresas de leasing aos bancos são os três fatores que não favorecem a captação via debêntures.

"Observo que os títulos privados das empresas têm um enorme potencial, mas o mercado está captando via outros instrumentos", diz o superintendente geral da Associação Nacional das Instituições do Mercado Financeiro (Andima), Paulo Eduardo se Souza Sampaio.

Na avaliação de Sampaio, emissores e investidores institucionais estão com muita cautela após a volatilidade do mercado externo no início deste ano, decorrente da crise do subprime no mercado de hipotecas dos EUA. Diminuiu a liquidez de crédito internacional. Ainda é preciso considerar que a decisão de fundo de pensão internacional investir em debêntures de empresas brasileiras leva tempo. Há um cronograma para o conselho do fundo reunir-se para a aprovação de cada movimentação do portfólio, mesmo o Brasil sendo um "investment grade".

Até 14 de maio, havia oito operações para emissão de debêntures em análise na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), representando o volume de R$ 23,56 bilhões. Os pedidos de autorização para emissão deram entrada na autarquia em dezembro, janeiro, março e abril, quando o mercado internacional estava mais volátil, com reflexos na bolsa brasileira.

Apenas a operação da BFB Leasing, na lista de análise da CVM, corresponde ao volume de R$ 20 bilhões. Os outros R$ 3,56 bilhões referem-se às operações de empresas no setor de energia elétrica, construção civil, extração mineral, administração e participações.

"A operação da BFB Leasing, de R$ 20 bilhões, ainda não foi concretizada, apesar da autorização. Nos primeiros cinco meses deste ano, a Andima já observa a redução no volume de emissões de debêntures por parte das companhias de arrendamento mercantil ou empresas leasing", diz Sampaio. Em média, o prazo total para a conclusão da operação e captação de recursos pelas empresas leva de dois a três meses.

As instituições financeiras não podem emitir debêntures. Por isso, a emissão ocorre por meio das leasings. Na prática, após a debênture ser emitida pela empresa de leasing, o banco - do mesmo grupo -, adquire o papel privado para colocá-lo na carteira de investidores. A operação satisfaz a necessidade de recursos da empresa de leasing que é crescente devido aos recordes de venda de automóveis. Com os títulos privados em carteira, o banco também oferece o ativo aos clientes e também usa o dinheiro para financiar empréstimos.

Um dos motivos para a redução das operações de debêntures pelas empresas de leasing seria o compulsório, fixado pelo Banco Central (BC) em fevereiro passado sobre os recursos repassados pelas empresas de leasing às instituições financeiras.

Sobre o total da operação compromissada com os clientes dos bancos, passou a haver a incidência de um depósito compulsório escalonado retido pelo BC. No mês de maio, a incidência era de 5%. Passará para 10%, em julho, e 15%, em setembro. Depois, sobe para 20% em novembro. Finalmente, em janeiro de 2009, chega ao teto de 25%. "Quanto mais caro o mercado local, mais as empresas se mobilizam para captar lá fora. A indicação que temos é de que o imposto contribuiu para o mercado migrar para outros meios de captação", diz Sampaio.

Em fevereiro de 2006, o governo brasileiro zerou a alíquota de Imposto de Renda (IR) de 15% incidente sobre os ganhos com investimentos em renda fixa, incluindo as debêntures, e títulos públicos, para os estrangeiros. A iniciativa foi uma forma de evitar a bitributação do investidor de fora que já recolhe o imposto sobre o dinheiro no país de origem. No entanto, no início de 2008, o governo determinou a cobrança de 1,5% de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para o estrangeiro que aplicar em renda fixa local.

"Com isso, o estrangeiro deixa de investir aqui para comprar papéis de empresas brasileiras emitidos no exterior, fugindo do IOF. As mudanças constantes só aumentam a insegurança do investidor internacional em relação à tributação no mercado de capitais local", afirma Sampaio.

Além do IOF e do compulsório, as operações com debêntures também ficaram mais caras devido à abertura de taxas. A alta da Selic exigiu que o mercado oferecesse prêmios mais altos para o investimento em debênture - considerado título privado de maior risco.

Os bancos também têm preferido captar recursos por meio dos Certificados de Depósitos Bancários (CDBs). Em quatro meses, de janeiro a abril deste ano, o saldo de CDBs no Banco Real cresceu 11%.