Título: Licitação agita agências de relações públicas
Autor: Madureira , Daniele ; Bispo , Tainã
Fonte: Valor Econômico, 29/05/2008, Empresas, p. B3

As agências de comunicação que atuam no Brasil esperam, com ansiedade, a definição de uma licitação pública que está em curso em Brasília. Além do valor envolvido - R$ 15 milhões, uma soma significativa para as empresas do setor -, a licitação desperta interesse porque as agências vêem nela uma mudança de comportamento capaz de abrir um novo e intenso fluxo de negócios com o setor público.

"É a primeira vez que o governo federal lança uma licitação dirigida ao mercado de comunicação empresarial e esperamos que os governos estaduais e municipais façam o mesmo", diz Francisco de Carvalho, diretor no Brasil da Burson-Marsteller, multinacional de relações públicas e uma das 13 empresas habilitadas a participar da licitação.

Na prática, alguns ministérios e empresas públicas, caso da Embratur, já fazem licitações diretas para o segmento há cerca de dois anos. A grande diferença, agora, é que a licitação partiu diretamente da Secretaria de Comunicação (Secom) da Presidência da República, o que intensifica sua repercussão na esfera federal em escala nunca vista até agora. "A licitação é simbólica, pois parte da Presidência", diz Carlos Henrique Carvalho, secretário executivo da Associação Brasileira das Agências de Comunicação (Abracom).

A realização de concorrências na área de comunicação e relações públicas é uma reivindicação antiga do setor. Até agora, a prática do governo federal era fazer licitações para agências de publicidade, que tinham a permissão para subcontratar os serviços de relações públicas.

O arranjo sempre desagradou as empresas de comunicação. "Reivindicávamos uma contratação específica já que muitas agências de publicidade terceirizavam (serviços) sob critérios baseadas na amizade", diz Carvalho, da Abracom.

A mudança está relacionada ao acórdão 2062, do Tribunal de Contas da União (TCU), proferido em dezembro de 2006. Entre as várias determinações do acórdão, está a não-terceirização de serviços de relações públicas, eventos e criação de sites de internet.

A Secom entrou com uma ação de efeito suspensivo contestando vários pontos do acórdão, mas não fez nenhuma restrição à decisão de restringir a subcontratação das agências de comunicação. Ao contrário, saiu na defesa desse ponto. "Consideramos que (a medida) é correta", diz Ottoni Fernandes Junior, secretário-executivo da Secom. "Quando há subcontratação, você corre o risco de pagar uma conta mais cara. Além disso, delega a outro uma estratégia."

A nova licitação faz parte de um plano de comunicação que começou a ser desenvolvido pela Secom em maio do ano passado para promover a imagem institucional do Brasil no exterior. A decisão, cuja previsão é sair em junho, será tomada com base em dois critérios. O mais importante é a avaliação técnica, que vai responder por 60% da escolha, diz Fernandes. Os outros 40% terão como base o preço dos serviços.

O impacto no mercado pode ser enorme. No ano passado, segundo dados da Abracom, as cerca de 1,1 mil agências de comunicação existentes no país obtiveram uma receita de R$ 850 milhões, 15% superior ao faturamento de 2006. A projeção para este ano é uma evolução de 20%, mas se a contratação direta dos orgãos públicos prevalecer, a possibilidade é de que o mercado dobre de tamanho.

De olho nessa oportunidade, as agências vem se movimentando para adequar-se às exigências da licitação, cujo nível é considerado alto. Como o foco é internacional, só puderam participar companhias que tenham matriz no exterior ou um acordo operacional com uma parceira com operações nos Estados Unidos, Europa e Ásia.

"A tradução de contratos com empresas no exterior precisou ser atestada pela embaixada do respectivo país onde o cliente atua", diz João Rodarte, sócio da CDN, uma das maiores empresas de comunicação empresarial do Brasil, com receita de R$ 40 milhões em 2007. Desde 2002, a CDN tem uma parceria com Fleishman-Hillard, que atua em 22 países. A preparação para concorrer ao edital exigiu que a equipe da CDN passasse uma semana nos Estados Unidos. Depois disso, foi a vez da Fleishman mandar um grupo ao Brasil, para uma estadia de 14 dias.

A Fleishman pertence ao grupo Omnicom, que controla empresas ligadas a duas outras concorrentes ao edital: a Porter Novelli, controladora da InPress, e a Ketchum, associada à Estratégia.

"A licitação da Secom é um marco", diz Marcos Trindade, sócio da FSB. Para entrar na concorrência, a empresa fechou uma parceria específica com a Edelman, que tem escritórios em 49 países e também atua no Brasil. A FirstCom, outra agência habilitada, mantém uma parceria com dois grupos internacionais - o Ecco e o Marco de Comunicación -, com uma rede de escritórios em 52 países.

Além dos requisitos previstos na licitação, a Secom tomou medidas como a realização de uma audiência pública com os interessados, mesmo sem a exigência da lei. A legislação obriga a convocação das audiências apenas para licitações acima de R$ 150 milhões.

As agências mostram-se satisfeitas com os cuidados tomados até agora. "A Secom foi bastante cuidadosa na condução de todo o edital", diz Cristina Moretti, sócia-diretora da InPress Porter Novelli, que precisou obter atestados de clientes nos EUA e na Colômbia para participar da licitação. Ela considera "preocupante", porém, a permissão de que agências de menor porte participassem da licitação a partir de uma associação pontual com companhias estrangeiras.

A Secom vai "estimular formalmente" os órgãos do governo federal a fazer suas contratações na área a partir de editais baseados em critérios técnicos e preço, diz Fernandes. Em junho, por exemplo, está previsto o lançamento de um edital de R$ 11 milhões para contratação de serviços digitais. O objetivo é melhorar os sites da Presidência da República e criar um portal voltado para o exterior.

Entre as agências, a expectativa é de que o setor público vai ocupar um espaço bem mais relevante, como ocorre em outros países. "Se nos anos 90 a comunicação empresarial foi estimulada principalmente pelas multinacionais e, na década seguinte, pelas grandes empresas brasileiras, tudo indica que agora será a vez do governo", diz Rodarte, da CDN.

Na Burson - controlada pelo grupo britânico WPP, presente em 59 países -, os executivos já traçam metas. "Esperamos que, no futuro, todas as instâncias do governo representem entre 30% e 50% da nossa receita mensal", diz Francisco de Carvalho. Hoje, a participação do setor público é nula.