Título: Brasil vence a UE em disputa do frango
Autor: Assis Moreira, Daniel Rittner e Alda do Amaral Roc
Fonte: Valor Econômico, 18/02/2005, Agronegócios, p. B10

Assis Moreira, Daniel Rittner e Alda do Amaral Rocha O Brasil obteve nova vitória na Organização Mundial de Comércio (OMC) nesta quinta-feira, mais uma contra a União Européia. Os juízes da entidade deram razão ao Brasil na queixa contra uma mudança na classificação do peito de frango salgado, que afeta a entrada do produto brasileiro no mercado europeu. Segundo estimativa da Abef (reúne os exportadores de frango), o Brasil deixou de exportar US$ 300 milhões por ano ao mercado europeu desde a implantação da medida em 2002. Os juízes da OMC não deram prazo para os europeus reverem a medida, considerada uma barreira pelo Brasil, deixando que as partes façam um acordo sobre isso. A decisão da OMC também favorece a Tailândia, que entrou com o Brasil na disputa. Apesar da vitória de Brasil e Tailândia na briga, fontes próximas da UE afirmam que uma brecha pode manter as restrições ao frango salgado dos dois países. O relatório preliminar do painel da OMC, instalado em novembro de 2003 para analisar o caso, foi recebido com satisfação pelo Itamaraty. A reação da diplomacia brasileira foi contida, já que o relatório é distribuído às partes interessadas em caráter confidencial, mas a manifestação do Itamaraty não deixa dúvidas sobre o resultado. "O governo brasileiro espera que o teor do relatório preliminar seja mantido em sua versão final", afirmou o coordenador-geral de contenciosos do ministério, Roberto Azevedo, acrescentando que raramente esse tipo de laudo recebe modificações importantes. Os países envolvidos têm até o dia 3 para enviar comentários aos árbitros da OMC, que divulgarão o relatório final em 24 de março. Depois disso, a União Européia irá recorrer ao Órgão de Apelação - como no caso da derrota na briga contra seus subsídios ao açúcar - e terá vários meses de prazo até a decisão. Os EUA também esperam contornar a vitória brasileira no processo do algodão, também contra subsídios. Em Genebra, a primeira avaliação de fontes próximas da União Européia foi que o Brasil "ganhou tudo juridicamente", mas a restrição ao peito salgado pode continuar por causa de uma brecha que teria sido deixada pelos juízes da OMC sobre a questão de salgamento do frango e que vai surgir quando os europeus tiverem de implementar a decisão. A decisão de Genebra condena a mudança na classificação tarifária adotada pela UE sobre o peito de frango salgado. De acordo com os compromissos europeus na Rodada Uruguai (1986-1994), a tarifa sobre o frango com teor de sal acima de 1,2% por quilo corresponde a 15,4%. Os exportadores brasileiros passaram a salgar o peito de frango congelado enviado à Europa para beneficiar-se dessa redução de imposto. Abaixo desse teor, o imposto é de 1.024 euros por tonelada, o equivalente a 75% "ad valorem". Com a estratégia dos exportadores brasileiros, os embarques do produto para a UE cresceram de 41 mil toneladas em 1997 para 183 mil toneladas em 2001. A partir de 2002, no entanto, os europeus passaram a alegar que o salgamento feito pelos exportadores não aperfeiçoava o congelamento do produto e era apenas uma saída encontrada para pagar menos imposto. Assim, o peito salgado passou a ter a mesma tarifa do produto congelado, de 75%. O Itamaraty argumentou que a reclassificação adotada pela UE contrariava os compromissos da Rodada Uruguai. Também alegou que o salgamento é importante para a conservação do produto congelado. O argumento é que o processo de descongelamento faz o frango perder cerca de 10% de seu peso líquido, com o derretimento de água. Com o uso de sal, essa perda é evitada, segundo técnicos do Itamaraty. Além disso, os europeus alegaram que o salgamento do peito de frango não garantia preservação a longo prazo. O Brasil argumentou que o sistema harmonizado de classificação de tarifas no grupo 2 sobre carne não estabelecia que salgamento deveria preservar no longo prazo. Mesmo reconhecendo a vitória "jurídica" do Brasil, fontes próximas da UE afirmaram que os árbitros não teriam tomado posição sobre as condições de salgamento do peito de frango, o que permitiria manter a restrição ao produto. No entanto, para a diplomacia brasileira, esse é um caso em que não se consegue uma "meia vitória" e não haveria brecha para UE reverter a decisão da OMC. O reconhecimento de que houve infração das regras adotadas em 1994, na análise do Itamaraty, dá ao Brasil uma vitória total nesse caso, de acordo com essa interpretação. Os exportadores de carne de frango comemoraram a decisão da OMC. Segundo Cláudio Martins, diretor da Abef, a medida deve beneficiar as exportações brasileiras para o bloco. Ele preferiu não comentar a possibilidade de uma eventual brecha. Martins afirmou que "teve certeza" de que o Brasil venceria a disputa quando o ex-comissário de comércio europeu Pascal Lamy sugeriu que o bloco poderia ampliar as cotas para frango do Brasil se o país retirasse o painel contra a UE na OMC.