Título: CCJ mantém votação da PEC dos Precatórios apesar de pressão da OAB
Autor: Ulhôa, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 04/06/2008, Política, p. A6

As críticas da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e os apelos de adiamento da votação da proposta de emenda constitucional (PEC) que muda as regras de pagamento dos precatórios - dívidas da União, Estados e municípios determinadas por sentença judicial -, feitas em audiência pública realizada ontem, não sensibilizaram os integrantes da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. O presidente da comissão, Marco Maciel (DEM-PE), manteve a disposição de colocar a proposta em votação na reunião de hoje.

O presidente da OAB, Cézar Britto, afirmou que a entidade continuará combatendo a PEC nas próximas etapas da tramitação, se for aprovada na CCJ. A PEC terá que passar por duas votações no plenário (onde precisa receber três quintos dos votos a favor, para ser aprovada) e irá à Câmara dos Deputados.

Para Britto, o sistema atual é "arcaico" e "caótico" - o ente federado paga quando quer e não é punido por não fazê-lo -, mas a PEC irá "agravar" a situação, "fortalecendo o Estado em detrimento do cidadão". Um dos alvos do ataque é a instituição de leilão eletrônico, pelo qual o credor poderá oferecer desconto no valor de seus títulos para quitação antecipada. Para o leilão serão destinados 60% dos recursos do regime especial a ser criado.

"Hoje existe um mercado paralelo, no qual o cidadão vende seus créditos a terceiros, por preços baixos. A PEC legaliza a torpeza, reconhece o caos e possibilita que o Estado substitua o empresário corrupto, podendo comprar os débitos pelo leilão", disse. Segundo ele, com esse instrumento o Estado terá o poder de "confiscar" o bem do cidadão. "Vamos ficar reféns do Estado. A PEC vai possibilitar o confisco e a moratória oficial."

O representante da OAB também condena a alteração no critério atual de pagamento por ordem cronológica - pela PEC, passam a ter prioridade de quitação os precatórios de menor valor e, entre estes, aqueles cujos titulares têm mais de 60 anos de idade. E considera baixos os percentuais que Estados e municípios terão de destinar para pagar esses débitos.

A PEC cria regime especial que prevê uma vinculação de 0,6% a 1,5% da receita corrente líquida dos municípios e de 0,6% a 2% no caso dos Estados para o pagamento dos precatórios. "A PEC vai eternizar o pagamento dos precatórios. Com os percentuais previstos, alguns Estados levarão de 50 a 60 anos para pagar. Fala-se que o Espírito Santo levará cerca de 140 anos", afirmou o presidente da OAB.

Representantes de Estados e municípios bombardearam os argumentos. O secretário da Fazenda de Minas Gerais, Simão Cirineu Dias, negou risco de calote. "Após a aprovação da emenda, os Estados que optarem pelo pagamento em 15 anos estarão rigorosamente em dia com os precatórios, incluindo os novos, ao final dos 15 anos. Os demais Estados quitarão sua dívida entre dez e 16 anos", disse.

Segundo ele, o caso do Espírito Santo é peculiar, já que 90% do estoque está sendo contestada no Supremo Tribunal Federal (STF) com "boas perspectivas para o Estado". O secretário mineiro destaca o fato de a PEC determinar que o ente federado que descumprir as novas regras incorrerá em crime fiscal, ficando proibido de receber transferências voluntárias e contratar empréstimos.

A PEC começou a tramitar em 2006, a partir de proposta do então presidente do STF, Nelson Jobim. Era a busca de resolver o acúmulo de precatórios vencidos não pagos. Pesquisa realizada na época pelo STF mostrou que o total de precatórios não pagos alcançava o montante de R$ 61 bilhões. Hoje, fala-se em R$ 100 bilhões.

"Os prefeitos não querem dar calote. Querem pagar. Hoje, deixam de atender pela impossibilidade orçamentária. É fundamental definir um percentual do orçamento destinado ao pagamento de precatórios", afirmou a representante da Confederação Nacional dos Municípios, Helena Garrido. "Aqueles que comercializam precatórios com elevados deságios não estão interessados em mudar", acusou o representante da Frente Nacional de Prefeitos, Gilberto Perre.

César Borges (PR-BA) alertou para o risco da mudança na ordem jurídica, principalmente após o país obter o grau de investimento. Ele e Antonio Carlos Júnior (DEM-BA) pediram mais discussão da PEC. Uma representante da agência Standard and Poor´s foi convidada, mas não apareceu.

Os representantes de Estados e municípios rejeitaram o argumento. "A PEC nos dá segurança jurídica e macroeconômica", afirmou o secretário de Fazenda do Rio de Janeiro, Joaquim Levy. Para ele, a fórmula da PEC é fruto de entendimento de Estados e municípios e representa o que podem cumprir com responsabilidade.