Título: Dilma rebate acusação de ex-diretora da Anac
Autor: Daniel Rittner e Lyra , Paulo de tarso
Fonte: Valor Econômico, 05/06/2008, Política, p. A10

A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, voltou ao centro do tiroteio político e procurou rebater de imediato as acusações de que favoreceu os compradores da VarigLog, em 2006. Insistindo em que "são falsas" as informações reveladas pela ex-diretora da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) Denise Abreu ao jornal "O Estado de S. Paulo", Dilma viu-se constrangida a usar a entrevista coletiva de balanço do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para repudiar as denúncias.

A ministra disse que sua atuação no caso esteve circunscrita pela preocupação do governo com a falência da Varig e com a situação dos passageiros da companhia aérea. "O governo manteve a legislação, respeitamos a lei. Mas vou reiterar: isso foi decidido no âmbito da Anac e do processo (judicial) de falência", afirmou Dilma, recusando-se a dar respostas após a terceira pergunta sobre o assunto.

Denise reiterou ao Valor suas afirmações. Segundo ela, os quatro diretores da Anac à época - Milton Zuanazzi (então diretor-presidente), Leur Lomanto e Jorge Velozo, além dela - participaram de uma reunião no gabinete de Dilma, com a presença da ministra e de sua secretária-executiva, Erenice Guerra, para discutir a compra da VarigLog pela Volo do Brasil, do empresário Lap Chan, que representava o fundo americano Matlin Patterson. "Era uma pressão para aprovar a operação", relatou Denise, que rejeitava o negócio por entender que não havia comprovação sobre a origem do dinheiro investido pela Volo - a legislação brasileira impõe um limite de 20% à participação de estrangeiros em companhias aéreas.

O Valor apurou, junto a outros integrantes da cúpula da agência no período, que a interferência do Palácio do Planalto foi decisiva para garantir a aprovação do negócio pela Anac. Na manhã do dia 23 de junho, quando a diretoria colegiada do órgão regulador deu sinal verde à aquisição da VarigLog, Dilma telefonou a Zuanazzi e falou sobre a necessidade de aprovar a transação. "Confia em mim, estou construindo isso", respondeu Zuanazzi, em seu gabinete, diante de assessores. O governo tinha interesse em avalizar a operação porque a Volo, por meio da VarigLog, havia adquirido a Varig e era a última esperança do Planalto para evitar a paralisação da empresa.

Por meio do ofício 058/06, de 28 de abril, a Anac alertou à Receita Federal e às juntas comerciais envolvidas que não podia concretizar nenhum ato constitutivo da compra da VarigLog pela Volo, pela falta de validade da autorização prévia concedida pelo extinto Departamento de Aviação Civil, antecessor da Anac na regulação do setor. O foco era a falta de provas da origem do capital.

Em 23 de junho, dia da aprovação do negócio pela Anac, o procurador-geral da agência, João Elídio, assinou parecer com teor oposto. Segundo ele, não competia ao órgão manifestar-se sobre isso. A tese do procurador prevaleceu e, sob influência da Casa Civil, segundo Denise, a diretoria acabou dando aval à operação.

No Planalto, a avaliação preliminar é de que as denúncias contra a ministra não têm consistência. Ministros palacianos insistem que todo o procedimento de compra da Varig foi acompanhado por um juiz, o que daria o devido grau de transparência para o caso. "O governo não vai se pronunciar sobre a questão da Denise Abreu", resumiu um auxiliar do presidente. Sobre a proximidade de Lula com o advogado Roberto Teixeira, assessores presidenciais afirmam que a amizade de ambos nunca foi oculta e que, por isso, não há razões para desconforto.

Outro assessor presidencial não entende as razões que levaram à ex-diretora da Agência a, de repente, deixar o ostracismo no qual se encontrava. "Ela deixou a diretoria da agência sob intenso tiroteio mas, aparentemente, depois que saiu do cargo, as coisas se acalmaram para ela. A quem interessa, nesse momento, que um assunto desses volte à tona"? questionou. Integrantes do governo não vêem, neste caso, motivações políticas para atacar Dilma. Nem o fortalecimento do nome dela como pré-candidata do PT poderia ser razão para isso. "Se eu fosse inimigo da ministra Dilma, guardaria munição para ser usada lá na frente. Num país como o nosso, é impossível alguém assegurar candidatura a uma distância tão grande das eleições", defendeu um governista.

O presidente nacional do DEM, deputado Rodrigo Maia (RJ), classificou como "grave" a denúncia feita por Denise Abreu. "Demonstra mais uma vez o crime de tráfico de influência dentro do governo pelo advogado Roberto Teixeira, que já havia sido citado na ocasião do mensalão", disse o parlamentar. "A denúncia demonstra o presidente Lula operando junto aos seus ministros para que se envolvam em questões de interesse privado", completou.

O presidente do DEM avisou que o partido pretende convocar Dilma, Denise Abreu e Roberto Teixeira para prestar depoimento no Congresso. A estratégia ainda não foi definida. O vice-líder do PSDB, Bruno Araújo (PE), segue a mesma linha. "As denúncias devem ser explicadas imediatamente. São informações de muita gravidade, porque mostra como o Estado tem sido aberto aos interesses privados", afirmou.

O líder do PT na Câmara, Maurício Rands (PE), minimizou as denúncias. "Não é verdade aquela atribuição dada pela Denise à ministra. Tudo leva a crer que ela age com certo ressentimento pela saída da agência", disse o deputado. Ontem, logo pela manhã, Dilma telefonou para o petista para tratar do assunto. "É tudo mentira", garantiu.

O secretário-geral do PT, deputado José Eduardo Cardozo (SP), também tentou não dar importância ao tema. "A ministra Dilma já deu reiterados exemplos de lisura na sua atuação no ministério. Denúncias de pessoas ressentidas com o governo ou com pessoas do governo não deve ser levadas em conta", diz.

O fundo Matlin Patterson afirmou, em nota, que "em momento algum houve qualquer tipo de favorecimento ilegítimo às empresas" e citou "imensas dificultadas criadas pela Anac, à época, para a ressurreição da Varig". O escritório do advogado Roberto Teixeira, que atuou no caso tendo a Volo do Brasil como cliente, também negou favorecimentos e acusou a Anac de ter criado obstáculos para aprovar o negócio. (Colaborou Thiago Vitale Jayme)