Título: Com ou sem FSB, meta de superávit sobe para 4,3%
Autor: Ribeiro, Alex
Fonte: Valor Econômico, 04/06/2008, Finanças, p. C8

O governo tomou a decisão política de fazer um esforço fiscal adicional de 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB), independente da aprovação ou não do Fundo Soberano Brasileiro (FSB) pelo Congresso Nacional. Fontes da área econômica informam que, enquanto o fundo soberano não for aprovado no Congresso - e caso a proposta seja rejeitada -, a economia fiscal será incorporada ao superávit primário, elevando a meta deste ano de 3,8% para 4,3% do PIB. Se a proposta for aprovada, o esforço fiscal adicional será transferido ao fundo soberano, e a meta de superávit primário retornará a 3,8% do PIB.

A expectativa inicial era de que já nesta semana o projeto de lei, que está sendo finalizado conjuntamente pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e pela Casa Civil, pudesse ser apresentado a lideranças políticas, dentro da reunião do conselho político. Ficou para mais tarde porque, neste momento, a prioridade na agenda política é a aprovação da Contribuição Social sobre a Saúde (CSS).

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, vê no fundo soberano um mecanismo que, em horizontes mais longos do que um ano, irá conferir maior solidez à política fiscal do governo. Está contemplada a hipótese inclusive de, caso as recentes descobertas de petróleo gerem um aumento das receitas em dólares, utilizar o fundo soberano como um mecanismo para lidar com o déficit previdenciário, seguindo modelo adotado na Noruega.

O fundo soberano é a resposta adequada, na visão da Fazenda, a uma das fragilidades apontadas por críticos da política fiscal: a de que o superávit primário não é sustentável, já que está sendo construído a partir do excesso de arrecadação produzido pelo ciclo econômico favorável. Alguns especialistas calculam que, caso haja uma virada no ciclo econômico, derrubando a arrecadação, o governo teria maiores dificuldades para entregar um primário consistente com a queda da dívida líquida do setor público.

Para a Fazenda, o fundo soberano lida com esse problema porque representa um mecanismo fiscal anticíclico. O governo aproveita para fazer poupança quando a arrecadação está mais alta, assegurando que, em um momento menos favorável do ciclo econômico, o primário de 3,8% do PIB será entregue. De quebra, alivia a sobrecarga da política monetária, ao conter o gasto público quando o Banco Central procura controlar uma aceleração da inflação que se explica, em parte, pelo excesso de aquecimento da economia.

A Fazenda avalia que a criação de um fundo soberano traria benefícios maiores do que se a decisão fosse , pura e simplesmente, aumentar a meta de primário deste ano de 3,8% para 4,3% do PIB. Pelos cálculos da área econômica, a meta atual já é suficiente para que, em 2010, o país atinja o déficit nominal zero.

Além de formar um colchão anticíclico, o fundo soberano poderá, caso a evolução da economia seja melhor do que o previsto, ser usado para melhorar a percepção fiscal. Um dos principais passivos do país, que não está explicito nas contas públicas, são os compromissos previdenciários. A Fazenda antevê um cenário em que as descobertas recentes de petróleo aumentem as receitas federais, permitindo apartar recursos para a Previdência dentro do fundo e, ao mesmo tempo, fazer a desoneração da folha de pagamentos.

Críticas ao fundo soberano são creditadas, pela Fazenda, à falta de conhecimento da operação do fundo e dos complexos mecanismos de contabilidade fiscal. O fundo soberano será composto de duas pernas, um fundo com ativos financeiros e o chamado Fundo Fiscal de Investimentos e Estabilização (FFIE). Serão consideradas despesa primária as transferências de recursos feitas ao FFIE, mas o dinheiro efetivamente não será gasto. Os recursos irão compor o patrimônio do FFIE e serão investidos em títulos públicos, aquisição de dólares e papéis do BNDES no exterior. O patrimônio do FFIE poderá ser sacado no futuro, representando uma receita primária.

O primário é calculado com base em variações da dívida líquida do setor público. O FFIE não irá compor a contabilidade da dívida líquida, que inclui ativos e passivos do governo, porque será um fundo de natureza privada. O FFIE será gerido por um banco federal e terá o governo como o seu cotista exclusivo.

A outra perna do fundo soberano é o fundo de ativos financeiros, cuja principal função é operar como linha auxiliar da política cambial. Nesse caso, o Tesouro irá, de um lado, levantar recursos com a venda de títulos públicos no mercado ou pela desmobilização de disponibilidades financeiras e, de outro, comprar dólares, que serão aplicados no fundo de ativos financeiros. Grosso modo, é uma operação semelhante à das reservas internacionais. A diferença é que as aplicações das reservas são, por natureza, mais conservadoras, e o fundo poderá investir de modo um pouco mais arriscados, conforme interesses estratégicos do país.