Título: O grau de investimento e o crescimento sustentável
Autor: Carneiro , Luiz Henrique
Fonte: Valor Econômico, 06/06/2008, EU & Investimentos, p. D2

Estagflação, proibição de exportação de algumas commodities, controle de preços, subsídios, pressão inflacionária generalizada, preço do petróleo nas alturas e por ai vai. Estes são alguns dos temas conjunturais da economia global que colocam enormes desafios aos formuladores de política econômica e que, em alguns países emergentes, têm colocado em risco conquistas importantes em relação a sua credibilidade, ao controle inflacionário e à situação fiscal.

A inflação anual na margem, por exemplo, nos outros países que compõe o grupo dos BRICs é: China 8,5%, Rússia 14% e Índia 8%. Contrastando e se destacando neste ambiente, o Brasil acaba de receber o grau de investimento por duas agências de avaliação de risco, fruto da consistência e perseverança das políticas econômicas ao longo de anos e, em alguma medida, associadas ao persistente e positivo choque de termos de troca.

É consenso que avançamos muito em importantes áreas como na formulação e gestão da política monetária, gerando maior previsibilidade e, consequentemente, reduzindo a tendência da volatilidade nos mercados; na implementação de novas tecnologias e processos; e em tantos outros setores. Também estamos usufruindo vantagens geradas por um choque persistente e positivo dos termos de troca dos produtos exportados pelo país. Apenas citando alguns exemplos: soja, açúcar, minério de ferro. O Brasil está progredindo, está inserido e participando de maneira ativa do processo de globalização da economia mundial. Ainda assim, a produtividade da economia brasileira é cerca de um quinto da dos Estados Unidos.

O grau de investimento obtido é muito importante e a tendência é que ele tenha como conseqüência a redução do custo de capital no médio prazo como um ganho permanente para a economia brasileira. Ao atrair investidores mais qualificados, como "real money", isto e, capital que busca oportunidades de maturação mais de longo prazo - investimento em infra-estrutura, participação societária em empresas, etc -, contribui para aumentar a profundidade e estabilidade dos mercados financeiros locais, ajudando a reduzir a volatilidade e o custo do acesso das empresas a recursos/poupança.

O custo de capital mais barato impacta positivamente o investimento e, com tudo mais constante, irá gerar crescimento com consequências benéficas para a renda, o emprego e o bem-estar. É importante notar que os ajustes na Selic realizados pelo Banco Central estão mais ligados ao ciclo. Portanto, possuem caráter mais conjuntural e, sendo bem-sucedidos, devem reforçar o ambiente de estabilidade, que é um elemento fundamental para o aumento do investimento.

O momento é de otimismo em relação à economia brasileira. Então, deveríamos aproveitar esta oportunidade para consolidar os avanços obtidos, estimular o aprofundamento de reformas e não cair no risco de achar que todo o trabalho já foi feito. O desafio é avançarmos ainda mais em algumas áreas como a reforma tributária, a educação, a redução da burocracia, a melhora do ambiente de negócios e regulatório, a segurança, a saúde, a abertura da economia, o investimento em infra-estrutura, capital humano, etc.

Crescimento não deve ser encarado apenas como uma meta final, mas um objetivo a ser alcançado, que é a base para outros avanços individuais e coletivos, como reduzir ou eliminar a pobreza e outras mazelas sociais. Seria bom para o país o debate e a organização de uma agenda de trabalho. Muito oportuno e ilustrativo a este respeito é um livro recentemente lançado "Brasil Globalizado", 2008, organizado por Octavio de Barros e Fabio Giambiagi.

Crescimento sustentável, a médio prazo, depende da produtividade e da geração de poupança doméstica. A experiência histórica demonstra que depender excessivamente da poupança externa é arriscado. Deste modo, indo além do otimismo atual, o momento é favorável para o país buscar se preparar ainda mais para atender os anseios de todos por crescimento econômico sustentável e melhora das condições sociais.

Afinal de contas, "das escolhas e de quanto o país se esforçará em se preparar para esse momento, dependerá que no futuro o Brasil seja visto como o país que ganhou na Mega-Sena e usou os recursos para reformar a casa e investir ou como o típico imprevidente que venceu na loteria e perdeu tudo. A idéia de que estamos predestinados ao êxito é, certamente um erro. Por outro lado, é certamente verdade que nunca antes nesse país o destino sorriu tanto para o Brasil" (Barros, Octavio e Giambiagi, Fabio, 2008).

Luiz Henrique Carneiro é sócio da Paraty Investimentos

E-mail: lcarneiro@paraty investimentos.com.br

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