Título: BC deve evitar seguir o pessimismo do mercado
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Fonte: Valor Econômico, 09/06/2008, Opinião, p. A10

Foi bem recebido no mercado financeiro o aperto monetário de 0,5 ponto percentual feito pelo Banco Central na semana passada, que aumentou a taxa básica de juros para 12,25% ao ano. Alguns analistas econômicos, porém, apostavam em uma alta de 0,75 ponto percentual e acham que o combate à inflação está sendo negligenciado. O curioso é que, há alguns meses, as críticas ao BC eram pelo excesso de conservadorismo, ao antecipar uma aceleração inflacionária que poucos percebiam.

A descrença na política monetária, ainda que restrita a alguns segmentos do mercado, causa preocupação porque poderá levar à deterioração adicional nas expectativas inflacionárias de 2009, que até agora são consistentes com a meta. O Banco Central deve evitar, entretanto, vincular sua ação aos humores de mercado, que responde com exagero aos indicadores correntes de atividade econômica e de inflação.

O guia adequado para a política monetária é o cenário prospectivo de inflação, ou seja, a evolução dos preços esperada para os próximos trimestres. Existem dúvidas sobre o estado atual da economia, sobre a evolução dos indicadores econômicos e sobre como o aperto monetário em curso vai atingir a inflação. Num ambiente incerto, recomenda-se ao BC não se desviar de sua estratégia gradualista.

Nos últimos meses, o BC antecipou-se à aceleração inflacionária e seria pouco razoável acusá-lo de falta de firmeza. Em janeiro, quando ele indicou pela primeira vez que poderia ser necessário um aperto monetário preventivo para conter o avanço da inflação, boa parte do mercado viu exageros. Só em fins de março, diante de indicadores menos favoráveis, firmou-se o consenso entre os analistas de que seria preciso elevar os juros básicos.

Nas últimas semanas, começou a se disseminar o processo inverso: um excesso de pessimismo. O consenso ainda é uma alta total de 2,5 ponto percentual nos juros básicos neste ano, porém um número considerável de observadores econômicos aposta em um ajuste de até 4 pontos percentuais.

A exemplo do que aconteceu no primeiro trimestre, quando o mercado traçava um cenário excessivamente otimista sem se preocupar com a dinâmica futura da inflação, agora as indicações são de que os prognósticos sombrios são formados com base em indicadores passados. De fato, os índices de preços tiveram variação maior do que o esperado. Mas seria prematuro extrapolar automaticamente para o futuro o que aconteceu nos últimos meses, mesmo porque hoje a política monetária é restritiva.

A aceleração inflacionária se explica, em boa medida, por choques adversos de oferta, como a alta de preços de alimentos e de energia. São eventos negativos, mas não se deve superdimensioná-los. Cabe ao BC zelar para que esses aumentos temporários e pontuais de preços não se tornem permanentes, além de corrigir os aparentes descompassos entre a oferta e a demanda.

A tarefa, deve-se notar, já vem sendo desempenhada pelo BC com razoável energia. A curva de juros futuros sofreu forte inclinação desde o início do ano e, neste exato momento em que alguns analistas econômicos pedem uma dose mais forte, os mecanismos de transmissão da política monetária estão em plena operação. Em breve, vão chegar à atividade econômica e à inflação.

A experiência brasileira mostra que os agentes econômicos nem sempre conseguem perceber os efeitos da política monetária em curso. Chegou-se a levantar dúvidas sobre se o aperto monetário iniciado em setembro de 2004 iria chegar à atividade e a inflação. Aquele ciclo de alta de juros levou, em 2006, à inflação mais baixa registrada nesta década. Texto publicado em 2005 em um relatório de inflação do BC descreve como ocorreram episódios semelhantes de descrença em 2001, 2002 e 2003.

A julgar pelo que aconteceu nesses quatro últimos movimentos da política monetária, há indicações de que em breve iremos assistir a alguma desaceleração na demanda. A oferta, de outro lado, segue em robusta expansão, em decorrência da maturação dos investimentos feitos nos últimos anos. A persistência do gradualismo será fundamental para evitar que a expansão da economia fique bem abaixo de seu potencial.