Título: China dá últimos retoques à Olimpíada 'high tech'
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 09/06/2008, Empresas, p. B2

O nadador italiano Filippo Magnini mandou um recado provocador aos seus rivais dos 100 metros livres. Perguntado, dias atrás, sobre seu treinamento para Pequim, Magnini, que é campeão mundial na modalidade, disse que a prova "não será vencida pelo mais forte, mas por aquele que possa contar com a melhor tecnologia". Empolgado, o nadador falou sobre a roupa - ainda em fase de testes - que usará nas competições, uma invenção da empresa italiana Arena que vai ajudá-lo a "largar em condição igual à dos demais".

Dos maiôs de natação, passando pelos materiais usados nos novos estádios, até o arsenal de sistemas de informação e de segurança para combate a ataques terroristas, os Jogos Olímpicos da China transpiram tecnologia. Em Pequim, o tema ganhou relevância a ponto de o governo chinês propalar a idéia de que irá realizar a primeira Olimpíada "high tech" da história.

Os esforços tecnológicos consumiram boa parte dos investimentos previstos pelo Partido Comunista. As estimativas dão conta de que, de 2001 para cá, os chineses gastaram cerca de US$ 430 milhões com sistemas e parafernálias eletrônicas. O orçamento total da Olimpíada, antes previsto em US$ 1,6 bilhão, teve de ser atualizado. Recentemente, o Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos de Pequim (Bocog, na sigla em inglês), refez suas contas e informou que gastará mais de US$ 2 bilhões. Ainda assim, disse Liu Jingmin, vice-presidente do Bocog, será menos que o desembolsado em 2004 por Atenas - US$ 2,4 bilhões.

Alguns exemplos ajudam a entender porque o orçamento de tecnologia aumentou tanto. Para ampliar a cobertura dos jogos e obter informações sobre o clima, os chineses decidiram mandar dois satélites para o espaço. Parte das transmissões, informou o Bocog, será levada a 17 mil ônibus e 30 mil táxis, além das linhas de metrô do país, por meio da TV digital.

A malha tecnológica que envolve o evento é formada por uma rede de empresas de diversos países. A Microsoft fornecerá milhares de licenças do sistema operacional Windows Vista e de seu pacote de programas Office 2007; a Ericsson vai apoiar a rede de telefonia fixa sobre internet; a Samsung distribuirá 15 mil celulares de terceira geração aos organizadores; e a Lenovo entregou 9 mil computadores para o Comitê Olímpico. Participam ainda Kodak, Omega, Panasonic, China Mobile e Sohu.

A maior responsabilidade, no entanto, pesa sobre a integradora de sistemas Atos Origin. A companhia francesa detém o maior contrato de TI já firmado com o Comitê Olímpico Internacional (COI). Até 2012, a Atos Origin responderá pela concepção, desenvolvimento e gerenciamento de toda infra-estrutura e sistemas usados durante as competições. O contrato começou em 2002.

Em Pequim, o trabalho está nas mãos de Jeremy Hore, um australiano de 37 anos que chefia a integração de sistemas da Olimpíada pela Atos Origin. Sob seu comando está uma equipe de mais de 400 pessoas que, somada ao pessoal do Bocog, supera o número de mil funcionários.

Em entrevista exclusiva ao Valor, Hore explica que, durante os Jogos, a expectativa é que mais de 9,9 milhões de transações diárias vão trafegar pelos sistemas gerenciados por sua equipe. Para suportar as operações, serão ligados mais de mil servidores (os computadores que administram os recursos de rede) e 10 mil PCs.

Qualquer dado relacionado às competições - como medição de provas, controle dos resultados, gestão da base de dados e distribuição de informações - está sob a guarda de sua equipe. "Nosso papel é cuidar do pano de fundo dessa enorme infra-estrutura que compõe a Olimpíada. Por isso, nada pode sair errado", diz.

No mês passado, o time de TI realizou o primeiro simulado tecnológico dos Jogos Olímpicos de Pequim. Foram testados sistemas, pessoal de suporte técnico e processos que rodarão nas 37 instalações esportivas, entre os dias 8 e 24 de agosto. Um teste final, segundo Hore, ocorrerá neste mês.

A Atos Origin montou duas centrais de comando para gerenciar as operações. Uma estrutura, batizada de PC Factory, tem a função de configurar e distribuir os equipamentos de TI que serão usados nos locais dos jogos. Em outro prédio está o laboratório de integração, onde rodam os programas usados durante as competições.

Em Pequim, comenta Hore, o momento é de acertar os últimos detalhes. Ao redor do Estádio Nacional, mais conhecido como o "ninho", centenas de pedreiros ainda trabalham em galpões. Jardins e flores são espalhados por todo lado numa tentativa de minimizar o efeito do céu cinzento. Na última semana, Pequim chegou a registrar recordes de poluição, e entidades advertiram as pessoas para que não saíssem nas ruas.

De seu lado, o Bocog também aposta na tecnologia. Durante os jogos, mais de 500 carros "verdes", alimentados por energia elétrica e bateria, farão traslados entre as instalações da comunidade olímpica. Dezenas de sistemas para captar luz solar e água da chuva também foram espalhados pela cidade com o intuito de economizar energia e reciclar água.

Enquanto tenta limpar a cara de uma das cidades mais poluídas do mundo, o Bocog treina milhares de pessoas e testa sistemas para outra operação vital : a segurança. Ao todo, cerca de 80 mil policiais estarão a postos para manter o evento sob controle. Segundo o Bocog, mais de 500 táticas de segurança - que terão o apoio da Interpol - estarão à disposição. Outra vez, na retaguarda dessas operações, estará a equipe de Hore. "Durante os jogos teremos de ficar 24 horas no ar para atender a qualquer eventualidade."

Por enquanto, comenta Hore, o cronograma segue tranqüilo. Fã de natação, ele conta que, de vez em quando, até sobra um tempinho para dar um pulo na piscina. "Ainda não estou rápido o suficiente para brigar por uma medalha de ouro, mas já é o suficiente para ficar em forma."