Título: Entre o prêmio e o risco
Autor: Cotias,Adriana
Fonte: Valor Econômico, 10/06/2008, EU & Investimentos, p. D1

A alta de 0,5 ponto percentual imposta ao juro básico, a Selic, na semana passada provocou um aumento instantâneo nas taxas longas projetadas no mercado futuro e tornou a remuneração garantida pelos títulos públicos prefixados mais apetitosa. No Tesouro Direto, o sistema de negociação de papéis federais pela internet, Letras do Tesouro Nacional (LTN, com remuneração determinada no momento da compra) com vencimento em julho de 2010 esbarram num retorno anual de 14,84%, bem acima da Selic corrente, de 12,25%, e da taxa primária estimada para daqui a dois anos, na casa dos 11% ao ano. No jargão do mercado, isso quer dizer que há prêmios para quem quiser agora prefixar seus investimentos emprestando parte da sua poupança para o governo. Mas será que vale o risco?

Num papel pré levado até o vencimento, não há exatamente como o investidor perder o capital aplicado como ocorre na renda variável. O pior dos mundos está, entretanto, na possibilidade de o Banco Central (BC) ser obrigado a elevar a Selic acima daquilo que o mercado está prevendo, a fim de conter as pressões inflacionárias. "Se a gente dá credibilidade à política econômica do governo, que os aumentos da taxa feitos pelo BC serão eficientes e vão surtir efeito na inflação de 2009, é hora de prefixar os investimentos", diz o superintendente de Tesouraria do Banif Banco, Rodrigo Trotta. Ele lembra, porém, que tal opção representa uma aposta e um risco e só no vencimento é que o aplicador saberá se foi ou não um bom negócio.

O Brasil tem condições de acomodar os choques inflacionários originados no front externo e as commodities, mesmo que continuem em alta, tendem a subir menos do que em 2007, espera o economista-chefe da Gradual Corretora, Pedro Paulo da Silveira. Considerando-se que o país ainda tem taxas de juros reais elevadas e acabou de ser alçado a grau de investimento não-especulativo, é de se esperar que o BC não tenha de subir tanto a Selic, argumenta. "Vai aumentar muito a demanda por títulos da dívida pública ao longo do tempo", diz, referindo-se ao capital externo.

Com o selo conferido pelas agências Standard & Poor's e Fitch Ratings, muitos fundos globais poderão endereçar parcela de seus recursos para o mercado brasileiro. Em tese, a maior procura pode significar preços mais altos, e, conseqüentemente, retornos menores para os títulos do Tesouro Nacional. Assim, o investidor local que se antecipasse à entrada desse dinheiro teria condições de levar para casa um ativo com remuneração melhor do que aquela que estará em vigor lá na frente.

Acertar qual o melhor momento para assumir exposição direta em taxas de juros (o chamado risco de mercado) não é uma tarefa corriqueira, adverte Silveira, da Gradual. Pode ocorrer de o investidor predeterminar o seu ganho agora e, daqui a duas semanas, esse retorno ficar comparativamente pequeno ao que a mesma LTN estará garantindo. Para quem quer evitar esse descompasso, a busca por um fundo de renda fixa ativo pode ser a melhor alternativa, sugere. O problema são os custos, já que, em geral, o investidor de varejo não consegue ter acesso a carteiras com taxas de administração baixas, pagando até 4%, 5% ao ano para delegar a administração da sua poupança a um gestor profissional.

No Tesouro Direto, há desde corretoras que não cobram pelo serviço, como Banif, Codepe, Socopa e Spinelli, até aquelas em que o custo é tão elevado quanto num fundo de varejo, caso de Itaú (4% ao ano) e Bradesco (4% mais R$ 25,00 por operação). Entre as corretoras dos grandes bancos, as taxas mais competitivas estão no HSBC (0,30%), Unibanco Investshop (0,35%), ABN Amro Real e Caixa Econômica Federal (0,40%), além do Banco do Brasil (0,50%). Em todos os casos, há ainda o custo de 0,40% ao ano da Companhia Brasileira de Liquidação e Custódia (CBLC).

No Unibanco há todo um incentivo para o investidor diversificar seu portfólio também com o Tesouro Direto. Tanto que, a exemplo do que fez o BB (que lidera o último ranking dos agentes de custódia), está em construção o acesso à compra e venda de títulos públicos pelo internet banking, conta o diretor da Unibanco Investshop Corretora, André Lissker. Junto com a tecnologia, ele sabe que será preciso semear a cultura de que a aplicação, apesar de ser de renda fixa, não é isenta de risco. "O aplicador tem de aprender que, no longo prazo, se ele não estiver num papel que segue o CDI, o investimento também está sujeito a solavancos", afirma.

Lissker considera o cenário atual ainda benigno. O Brasil tem trilhado o caminho da disciplina fiscal e mesmo com a balança comercial dando sinais de reversão, não há uma situação de risco para as contas públicas ou externas que coloquem em xeque a solvência do governo, pondera. Em meio às pressões correntes sobre o custo de vida e em pleno ciclo de aumento de juros, ele prefere os títulos atrelados ao Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o indicador que baliza o sistema de metas perseguido pelo BC. Isso porque numa Nota do Tesouro Nacional série B (NTN-B, corrigida pelo índice oficial), os juros de longo prazo já incorporaram um ajuste significativo na Selic. "Os prefixados não seriam a minha primeira opção porque não embutem nenhum ganho real." Ontem, a NTN-B Principal (que paga juros e principal só no vencimento) garantia retorno de 6,94% ao ano, mais a inflação.

As Letras Financeiras do Tesouro (LFT, pós-fixadas), que acompanham a Selic na alta ou na baixa, são a opção mais conservadora no momento, diz o gerente da Coinvalores, Otávio Sant'Anna. Mas não custa nada ao investidor fazer um mix com as diversas alternativas disponíveis no Tesouro Direto. "Assim como numa carteira de ações, em que o portfólio pode ser composto com papéis mais arriscados e outros menos, o mesmo pode ser feito na parcela dos recursos destinada à renda fixa", compara. Para o perfil menos afeito a riscos, ele sugere de 70% a 80% em papéis pós, dividindo o restante em prefixados e títulos de inflação.

Lissker, da Unibanco Investshop, ainda lembra que tão importante quantos os custos e a remuneração é o prazo do investimento. Com papéis de menor duração, a aplicação fica mais suscetível a eventos inflacionários transitórios, seja nos prefixados, seja nos ativos indexados ao IPCA. Títulos com vencimento em mais de dois anos, sem pagamento de juros semestrais, também passam a se beneficiar da melhor alíquota da tabela regressiva de imposto de renda, que começa em 22,5% para intervalos de até 180 dias; 20% para investimentos entre 181 e 360 dias; 17,5% para prazos entre 361 e 720 dias, caindo a 15% nas aplicações em período superior.