Título: Brasil lidera ranking de certificados na AL
Autor: Giardino, Andrea
Fonte: Valor Econômico, 11/06/2008, EU & Investimento, p. D10

O crescimento do mercado de capitais no Brasil, que viveu um boom de IPOs (da sigla em inglês para oferta pública inicial de ações) no ano passado, não só tem atraído investidores estrangeiros como despertado o interesse de analistas de finanças. Tanto que o CFA Institute, uma das maiores entidades certificadoras de profissionais do setor financeiro americano, decidiu incluir o país na rota de suas apostas.

Em rápida visita por países da América Latina, o diretor-geral da instituição, Raymond J. DeAngelo, desembarcou essa semana em São Paulo. Trouxe na agenda a missão de costurar alianças com universidades brasileiras de primeira linha para a criação de cursos de mestrado em finanças. "Viemos falar com possíveis interessados em parcerias", afirma.

O CFA Institute é uma entidade sem fins lucrativo, criada nos Estados Unidos há 61 anos. Está presente em 55 países e seu certificado tornou-se uma espécie de passaporte para bons profissionais na hora de serem contratados pelas empresas, sobretudo nas americanas. Ele possui convênio com cerca de 60 universidades, muitas delas de prestígio, a exemplo da Universidade de Oxford, na Inglaterra e da Cornell, nos Estados Unidos.

"Mas nossa meta é trabalhar com um total de 100 universidades em todo o mundo". Essa estratégia de expansão envolve, sobretudo, mercados emergentes, hoje principal foco do CFA. E não é para menos. A Ásia já supera os Estados Unidos no número de inscritos para os testes que são realizados anualmente. Este ano, eles tiveram 42,8 candidatos, enquanto os americanos representaram um total de 38 mil. Apesar de ter uma participação ainda pequena, o Brasil lidera a América Latina em relação ao volume de candidatos da região, com 640 inscritos em 2008.

"Há um enorme potencial de crescimento desses países, que nos próximos cinco anos devem superar o principal mercado, os Estados Unidos", prevê DeAngelo. Atualmente, do total de 81 mil profissionais certificados no mundo, 70% estão concentrados nos EUA. Para falar sobre as ações que o CFA vêm traçando na conquista dos mercados emergentes e os investimentos no Brasil, De Angelo concedeu entrevista ao Valor. Leia os principais trechos:

Valor: Por que o Brasil entrou mais forte na mira do CFA?

Raymond DeAngelo : Nos últimos quatro anos, o Brasil tem apresentado uma economia mais estável, sem aqueles índices de inflação exorbitantes. Cenário que contribui para o desenvolvimento do mercado de capitais no país. Só em meio a um ambiente estável poderemos ter um mercado de capitais mais dinâmico, tanto que os reflexos foram vistos na conquista do grau de investimento. No entanto, é preciso apostar na formação dos gestores, porque o próprio mercado exige profissionais qualificados, mais preparados para atender a essa nova demanda.

Valor: Entre os países emergentes, quem está na frente em relação ao nível dos profissionais?

DeAngelo: China e Índia, sem dúvida. Em ambos já vimos um amadurecimento do mercado de capitais, enquanto aqui as mudanças são recentes. E é natural que exista um "gap" na formação desses profissionais, que começam a se mexer só depois que existe demanda. Por essa razão, tanto na China quanto na Índia a valorização dos profissionais de investimento acontece há mais tempo. Na Ásia, por exemplo, vemos uma cultura de educação muito mais forte do que em alguns outros países do mundo. Tem sido prioridade do governo local nos últimos anos.

Valor: De que forma o CFA atua?

DeAngelo: Somos uma entidade certificadora que se tornou passaporte para aqueles que querem dar um salto na carreira e ter um diferencial no mercado. Para obter o título, o candidato precisa se submeter a três etapas de testes. O nível 1 é mais básico, envolvendo ferramentas para análise de contabilidade, economia, ética e estatística. O nível 2 ensina o profissional a avaliar ativos e definir o preço justo de uma ação, além de abordar toda a parte de análise de demonstrações financeiras. Já o nível 3 aprofunda questões ligadas às melhores práticas para gestão de portfólio de renda fixa e variável.

Valor: O que destaca um profissional com a certificação CFA?

DeAngelo: A bagagem de formação que ele adquire. Prova disso é que o CFA - Chartered Financial Analyst-, se tornou um critério de seleção para muitas empresas americanas. Dificilmente você encontrará um gestor nos Estados Unidos que não tenha um CFA. E olha que somos bastante rígidos no processo de aprovação. Além do profissional passar pelos três níveis de testes, ele precisa comprovar que possui, pelo menos, quatro anos de experiência no mercado de capitais para ter o CFA nas mãos. Mas se olharmos para o mercado, vemos que 30% trabalham em assets, 6% em fundos de hedge, 7% em bancos, 4% em companhias de seguro, 7% em bancos de varejo, 9% em instituições especializadas em gestão de fortunas, 2% em fundos de pensão e 16% em bancos de de investimento. Todos em importantes grupos, como o Citigroup, Merrill Lynch, Goldman Sachs, ABN Amro e JP Morgan.

Valor: Vocês possuem convênios com universidades em vários países. Quais os planos para o Brasil?

DeAngelo: O CFA tem parceria com 60 universidades ao redor do mundo, entre as quais a Universidade de Oxford, na Inglaterra; a HSE, na França; a Cornell University, nos Estados Unidos e a San Andrés, na Argentina. Queremos chegar a 100, expansão que acontecerá nos países emergentes. Aí, incluímos o Brasil. Minha visita deve-se, especialmente, para fazer contatos com universidades de renome interessadas em oferecer cursos de mestrado com conteúdo totalmente desenvolvido pelo CFA.

Valor: Os mercados emergentes são, então, o grande foco do CFA?

DeAngelo: Sim. Um termômetro disso é o número de inscritos para as provas - que são sempre aplicadas no primeiro dia de junho- deste ano. A Ásia teve 42,8 mil candidatos, superando os Estados Unidos, com 38 mil. A Índia vem crescendo, com 4 mil e o Brasil, apesar de sua presença incipiente, de 640 inscritos, começa a ter maior relevância. O Brasil lidera o ranking da América Latina, já que na Argentina tivemos 160 inscritos, no México, 160; no Chile, 85 e na Colômbia, 60. No mundo são 81 mil profissionais com o título, dos quais 70% estão concentrados nos Estados Unidos. No entanto, com o avanço acelerado dos emergentes, acreditamos que essa proporção deva mudar em cinco anos.

Valor: Como funciona o CFA no país?

DeAngelo: O braço local é responsável por dar crivo aos aprovados, atestando se eles possuem a experiência exigida. Hoje temos 250 associados, todos certificados.