Título: Câmara aprova recriação da CPMF por margem de dois votos
Autor: Jayme , Thiago Vitale
Fonte: Valor Econômico, 12/06/2008, Política, p. A5

Por apenas dois votos além do quórum exigido, a Câmara dos Deputados aprovou ontem a recriação da CPMF, extinta pelo Congresso há apenas seis meses, imposto do cheque agora denominado Contribuição Social para a Saúde. O texto precisava de 257 votos favoráveis para ser aprovado e teve 259, com 159 contra e duas abstenções. Na última vez que a contribuição foi a plenário, em outubro do ano passado, o quórum pró-CPMF foi de 333 votos. Além de instituir a CSS, o texto regulamenta a Emenda Constitucional nº 29. A contribuição sobre as movimentações financeiras terá alíquota de 0,1% e vigência a partir de janeiro de 2009.

A votação do texto ainda não terminou. Ontem, os deputados aprovaram o texto-base do projeto de lei complementar. Alguns trechos do texto foram destacados para serem votados separadamente. Apenas o artigo da CSS foi votado. Ainda estão pendente mais quatro votações do plenário para aprovar a íntegra do projeto. Se aprovada, a proposta precisa voltar ao Senado para nova votação dos senadores. Na Câmara, com o governo com ampla maioria de votos, a oposição comemorou o resultado apertado.

"É uma vitória política da oposição. o povo brasileiro não quer um novo imposto, ele será derrubado no Senado, com absoluta certeza", disse o deputado Rafael Guerra (PSDB-MG), presidente da Frente Parlamentar da Saúde. No Senado, serão necessários 41 votos para aprovar o texto. Depois de anunciar o resultado, o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), brincou: "Quem precisar de um Isordil, nós temos alguns comprimidos aqui", disse, ao citar remédio para o coração.

A CSS foi encomendada pelo governo federal aos líderes do governo na Câmara e incluída no projeto de regulamentação da Emenda nº 29, que obriga a União, os estados e os municípios a repassarem mais recursos para a Saúde.

O deputado Pepe Vargas (PT-RS) foi o autor do relatório final que prevaleceu na votação de ontem na Câmara. O texto do petista descaracterizou a proposta original, do senador Tião Viana (PT-AC), aprovada de forma unânime no Senado há pouco mais de um mês. Os senadores fixaram em 10% da receita corrente bruta o total de recursos a serem investidos pela União na Saúde.

A área econômica do governo teve calafrios ao ver a proposta aprovada no Senado. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, então, avisou aos deputados que vetaria o projeto caso não fosse aprovada uma fonte de recursos. Foi a deixa para a CPMF voltar - a prorrogação do tributo havia sido rejeitada pelo Senado no dia 13 dezembro de 2007. Em almoço na casa do líder do PTB, Jovair Arantes (GO), há um mês, a base aliada decidiu criar a Contribuição Social para a Saúde, que deverá render R$ 10 bilhões anuais à Saúde.

Além disso, houve a determinação do Planalto de que a receita corrente bruta não poderia ser usada como base de cálculo para os recursos da saúde. E assim foi feito. Os líderes, então, decidiram retomar as regras atuais: os investimentos da Saúde terão como base a variação do PIB nominal nos dois últimos anos (corrigida pela inflação). Um dado importante é que, caso a CSS passe no Senado, sua arrecadação ficará de fora da base de cálculo.

O Planalto, temendo nova derrota, simulou distância do novo imposto, mas realmente conduziu toda a ação dos líderes e a aprovação da nova CPMF, conquistando votos com a liberação de emendas e atendimento de outros pleitos dos deputados.

A Frente Parlamentar da Saúde se posicionou imediatamente contra a proposta. Os candidatos a prefeito nas eleições de outubro ficaram tensos com a possibilidade de aprovar aumento de imposto e ver o reflexo disso nas urnas. A base aliada chegou a adiar a votação uma vez com receio da derrota. Começou, então, forte pressão dos aliados.

A primeira foi a isenção incluída no texto: quem recebe até R$ 3.038,99 ficará de fora da cobrança. Os governistas argumentaram que quase 90 milhões de pessoas ficariam de fora da cobrança do imposto. A segunda pressão foi ainda mais sedutora: os líderes se comprometeram a ir ao Planalto depois da votação da CSS pedir a liberação de R$ 6 bilhões contingenciados no Orçamento para fechar as contas do Ministério da Saúde até o fim do ano.

Por fim, a pressão também veio com benefícios financeiros por meio do Orçamento. Desde o dia 2 de junho, quando começou a batalha dentro da Câmara, foram liberados R$ 92,5 milhões em emendas parlamentares - recursos reivindicados pelos deputados para obras em seus currais eleitorais.

Na votação da CSS, as traições apareceram sobretudo no PR, no PTB e no PP. Entre os petebistas, da bancada de 20 parlamentares, apenas 13 votaram com o governo. No PP, dos 40 da bancada, apenas 22 votaram favoravelmente. No PR, dos 43, só 25 se posicionaram de acordo com o governo. O PV não foi atendido em seus pleitos recentes e votou totalmente contra o governo: todos os 12 votos foram contrários à CSS. No PSC, houve racha: dos 12 da bancada, só sete votaram "sim" ao tributo.

Com a aprovação da CSS, a oposição promete obstruir a reforma tributária. O relator da reforma, deputado Sandro Mabel (PR-GO), era contra a contribuição e não participou da sessão de ontem. O presidente da comissão especial, Antonio Palocci (PT-SP), votou pela criação do tributo.