Título: Governo diz que Volo evitou falência da Varig
Autor: Rittner , Daniel
Fonte: Valor Econômico, 12/06/2008, Política, p. A10

Negada à época, a falência da Varig esteve prestes a ser decretada pelo juiz Luiz Roberto Ayoub, da 8ª Vara Empresarial do Rio, que cuidava do processo de recuperação judicial da companhia, e só foi evitada, com o consentimento do Palácio do Planalto, por causa de uma oferta de socorro da Volo do Brasil, liderada pelo empresário Lap Chan. Quatro dias antes da polêmica aprovação da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) à compra da VarigLog pela Volo, Ayoub comunicou ao governo que deveria decretar a falência da Varig no dia 23 de junho de 2006, pois a empresa não tinha dinheiro em caixa sequer para pagar seus gastos correntes - como combustível, tarifas aeroportuárias e leasing de aeronaves - e permanecer voando.

A informação está em relatório preparado às pressas pela Casa Civil, ao qual o Valor teve acesso, e enviado aos principais líderes governistas no Senado, que usaram o material para rebater as acusações da ex-diretora da agência Denise Abreu.

O juiz fez essa advertência no dia 19 de junho, uma segunda-feira, a Milton Zuanazzi, então diretor-presidente da Anac. Zuanazzi levou o alerta ao Palácio do Planalto, que determinou à agência preparar-se para o acionamento do plano de contingência, envolvendo o resgate de passageiros no exterior e a distribuição das rotas da Varig às demais companhias nacionais.

Só agora essa informação foi relevada. Na época, tanto a Justiça do Rio quanto a Anac e o governo negavam a possibilidade de falência. Era uma forma, principalmente, de evitar correria nos aeroportos e desespero entre os passageiros da Varig que se encontravam no exterior - estimava-se que de 12 mil a 15 mil brasileiros estavam na Alemanha, na Copa do Mundo, tendo usado só o bilhete de ida.

A luz amarela acendeu no Planalto naquela segunda-feira. Dois dias depois, na quarta-feira, Ayoub voltou a conversar com Zuanazzi, segundo relatório da Casa Civil. Na ocasião, informou que a Volo do Brasil havia se comprometido a aportar os recursos necessários para a Varig continuar voando, mas impunha uma condição: a aprovação da compra da VarigLog, que enfrentava obstáculos na Anac. O principal entrave era a resistência de Denise Abreu, que insistia na comprovação da origem do capital da Volo e na apresentação do Imposto de Renda de seus três sócios brasileiros - Marco Audi, Marcos Haftel e Luiz Gallo. Foram exatamente naquelas semanas as reuniões na Casa Civil mencionadas pela ex-diretora da agência.

Na sexta-feira à noite, dia 23 de junho, a diretoria colegiada da agência finalmente aprovou a venda da VarigLog à Volo do Brasil. Para líderes aliados, o governo não se colocou na posição de refém da Volo e agiu corretamente. Só com a aprovação do negócio pela Anac o fundo americano Matlin Patterson e seus três sócios brasileiros se dispunham a entrar, como VarigLog, no segundo leilão de compra da Varig, que não teve mais nenhum participante. No primeiro leilão, a associação dos funcionários da Varig, TGV, venceu a disputa, que não recebeu qualquer outra proposta. A falência tornou-se iminente porque a TGV não tinha recursos necessários para manter a Varig no ar.

"Se o depósito não fosse feito até aquela sexta-feira, a falência seria decretada", afirmou o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), que esteve na terça-feira no Planalto para estudar o assunto e receber o relatório. "O governo não queria que a Varig parasse. O governo não queria, o Congresso não queria, a torcida do Flamengo não queria. Isso era uma unanimidade e estávamos vivendo um momento decisivo", completou Jucá.

Em abril, a Anac havia rejeitado a compra da VarigLog pela Volo, baseando-se em parecer rejeitando a operação, do procurador João Ilídio. Em 23 de junho, de acordo com Denise Abreu, Zuanazzi convocou uma reunião de diretoria para analisar novamente o negócio. A votação não pôde ocorrer, em um primeiro momento, por causa de representação protocolada pelo escritório do advogado Roberto Teixeira, no Ministério da Defesa, contra Denise, além de um mandado de segurança contra os demais diretores. "O Milton (Zuanazzi) fez uma ligação e logo caiu a representação", disse a ex-diretora, em depoimento ontem no Senado, lançando a suspeita de tráfico de influência sobre o presidente da agência.

Poucas horas depois, foi retirada a ação movida por Teixeira, que já tinha decisão tomada do desembargador Souza Prudente, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, mas ainda não publicada. "O desembargador confirmava o direito da agência de investigar", afirmou Denise, referindo-se às exigências à VarigLog. À noite, derrubados todos os obstáculos, a Anac aprovou a compra da empresa pela Volo, em reunião de uma hora, encerrada às 23h. Questionada pela oposição sobre o interlocutor de Zuanazzi naquele telefonema, a ex-diretora disse que "provavelmente era a Dilma (Rousseff) ou a Erenice (Guerra)". "Acredito, e eu peço à imprensa que frise as minhas palavras, eu só tinha a impressão, por ser uma voz feminina, de que era a Erenice."