Título: Brasil registra menos patentes no exterior
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 13/06/2008, Brasil, p. A6

A queda de 13% no número de patentes brasileiras obtidas no USPTO, o escritório de marcas e patentes do Departamento de Comércio dos Estados Unidos, no triênio 2005-2007 reacendeu no país o debate sobre a eficácia das políticas de incentivo à inovação tecnológica no país. A aceitação pelo USPTO é a referência mundial na área de patentes. O físico Roberto Nicolsky, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e diretor da Sociedade Brasileira Pró-Inovação Tecnológica (Protec) entende que o resultado brasileiro reflete erro de foco nas políticas públicas de apoio, apesar das boas intenções. Ele considera que os incentivos deveriam ser universais e não direcionados a setores.

Justamente no primeiro triênio de vigência da política industrial instituída em março de 2004, e da Lei de Inovação, de dezembro do mesmo ano, os números do USPTO compilados pela Protec não são animadores. O Brasil, que havia obtido o registro de 332 patentes no triênio anterior, reduziu o número para 288. Além disso, o país levou de goleada dos concorrentes asiáticos, sendo ultrapassado pela pequena Malásia, cujo número de registros saltou de 185 para 359, um aumento de 94%, na mesma comparação.

O confronto com os dois gigantes asiáticos que compartilham com o Brasil e a Rússia a badalada sigla Bric então, é ainda mais desolador. Índia e China, que já estavam muitos corpos à frente em números absolutos de patentes registradas no triênio 2002-2004, no período encerrado em 2007 aumentaram, respectivamente, 48% e 53% seus registros, atingindo 1.411 e 2.764 registros. O número chinês é praticamente dez vezes o brasileiro.

"É a única medida quantitativa que temos (do crescimento tecnológico). Não há dúvida de que o governo está fazendo força e quer acertar, mas temos que olhar os resultados e parar de ver apenas a oferta (de recursos)", disse Nicolsky. Para ele, o tema do apoio à inovação no Brasil "é cheio de mitos", entre eles o de que "a universidade é a grande geradora de inovação, quando esse papel é da empresa".

Com base nessa última afirmação, o físico diz que um dos erros das políticas tecnológicas brasileiras é que a universidade fica com uma fatia excessiva dos recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT). Do orçamento de R$ 2,55 bilhões da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), principal destino dos recursos do FNDCT, para este ano, as linhas voltadas para as empresas ficam com R$ 1,1 bilhão, enquanto as instituições de pesquisa ficam com o restante.

O presidente da Finep, Luis Fernandes, disse que o problema levantado pelo diretor da Protec "aponta para um problema real que é a desconexão entre a capacidade tecnológica do país e as empresas". Segundo Fernandes, enquanto os depósitos de patentes brasileiras em escritórios internacionais não passam de 0,2% do total, as publicações de artigos em revistas científicas, outro indicador do grau de conhecimento de um país, alcançam 1,9%, um número compatível com o tamanho do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro em relação ao mundial. Fernandes disse que é essa dicotomia que o governo vem tentando combater com a sua política de inovação. ]

Outra crítica do diretor da Protec é quanto ao incentivo da Lei do Bem que permite a dedução do Imposto de Renda (IR) dos investimentos em inovação. Como o benefício só é extensivo às empresas que pagam o IR com base no lucro real, Nicolsky disse que ela acaba beneficiando apenas as grandes empresas, que representariam cerca de 6% do universo total de empresas do país. Aquelas que pagam IR sobre o lucro presumido ou pelo mecanismo do Simples - que a maioria das empresas - ficam de fora. Essas, na opinião do cientista, são justamente as que mais precisam da ajuda do governo para inovar.

Para Nicolsky, o grande mecanismo de apoio à inovação, praticado por todos países que deram certo, é o compartilhamento do risco entre Estado e empresa. No Brasil, esse sistema está expresso, principalmente, na linha de subvenção da Finep, iniciada em 2006. O físico entende que a instituição de fomento está no caminho certo, mas reclama do baixo valor disponibilizado (R$ 450 milhões no último edital, sendo R$ 324,5 milhões do orçamento para este ano).

Nicolsky propõe ainda a universalização da oferta dos recursos para subvenção, em vez de concentrá-los em setores pré-determinados. Na sua visão, enquanto as empresas e seus produtos não forem o foco principal das políticas de fomento, a indústria de transformação brasileira vai tender a um crescimento menor do que o do Produto Interno Bruto (PIB) do país, reduzindo sua participação relativa na economia brasileira.

Segundo Fernandes, da Finep, as críticas de Nicolsky à política de subvenções não correspondem à realidade. Primeiro, porque a subvenção para a empresa contratar pessoal para projetos de desenvolvimento tecnológico é universal, para qualquer segmento econômico. Essas políticas são traçadas em parceria com os Estados. Ele disse também que os recursos do FNDCT estão equilibrados entre o apoio direto às empresas, o apoio a parcerias entre universidades, institutos tecnológicos e empresas e o apoio a pesquisas básicas sem interação com as empresas.

Quanto ao edital nacional da subvenção, que elege áreas (são seis no último edital) beneficiadas, o presidente da Finep disse que ele está de acordo com a Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP), a nova política industrial do governo. "Buscou-se nos seis setores identificar tecnologias críticas para desenvolvimento do país", disse Fernandes, acrescentando que abrir mão dessa escolha seria "não ter uma política estratégica de desenvolvimento".

Fernandes disse ainda que é preciso levar em conta que as políticas de estímulo à inovação no país são recentes. "A Lei de Inovação é de 2004, com efeitos em 2006. A Lei do Bem veio depois", ressaltou. Segundo ele, o interesse da Finep é buscar dentro do governo espaço para que os incentivos sejam cada vez mais amplos, especialmente aqueles referentes aos incentivos da Lei do Bem.

Em relação aos atuais recursos da Finep, o presidente da estatal disse que embora somente um terço seja destinado diretamente para as operações com as empresas, incluindo subvenções, mais um terço vai para o apoio a projetos de parceria entre universidades, institutos tecnológicos e empresas e apenas a outra terça parte fica com a pesquisa básica, sem interação direta com o mercado.