Título: Anatel muda regra para concentração de teles
Autor: Rittner , Daniel ; Magalhães, Heloisa
Fonte: Valor Econômico, 13/06/2008, EU & S.A., p. D6

A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) anunciou, ontem, a proposta de um novo Plano Geral de Outorgas (PGO) com as alterações necessárias para que a Oi (ex-Telemar) possa comprar a Brasil Telecom (BrT).

Porém, a redação do documento - que ainda passará por consulta pública - contém uma exigência que, segundo afirmou anteriormente o presidente da Oi, Luiz Eduardo Falco, poderia inviabilizar o negócio. A agência determinou a separação dos ativos de telefonia fixa e banda larga, das concessionárias, em empresas distintas.

Na última sexta-feira, Falco ameaçou desistir da compra caso a Anatel incluísse a exigência no PGO. O executivo afirmou que a aquisição poderia não sair, pois a medida elevaria custos de vários tipos, incluindo os de ordem tributária. Segundo ele, isso implicaria rever o preço da aquisição. A Oi anunciou, no dia 25 de abril, uma proposta para comprar o controle da BrT por R$ 5,8 bilhões.

O novo plano será colocado em consulta pública na terça-feira, por 30 dias, e ainda exige um trâmite longo, que culminará na publicação de um decreto presidencial. Isso significa que a proposta ainda poderá receber modificações.

As mudanças estavam em estudo desde 12 de fevereiro, quando a Anatel recebeu um pedido do Ministério das Comunicações para reavaliar as regras em vigência. Nas últimas semanas, o exame do novo PGO foi seguidamente adiado. Ontem, o conselho diretor aprovou uma minuta, na sua primeira reunião após a ida do presidente da agência, Ronaldo Sardenberg, ao Palácio do Planalto, no início da semana.

Sardenberg reagiu com indignação aos questionamentos sobre a eventual interferência do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, no processo. "Eu não recebi nenhum pedido de agilidade", desconversou Sardenberg, que garantiu nunca ter conversado sobre o assunto com Lula.

A votação do PGO entrou de última hora na pauta da reunião de ontem. Segundo fonte do governo, a decisão de colocar o assunto em discussão partiu dos próprios conselheiros da Anatel. Conforme esse interlocutor, havia, entre eles, a sensação de que se estava criando um desgaste interno, com Sardenberg e o conselheiro Antonio Bedran de um lado e, de outro, Pedro Jaime Ziller e Plínio Aguiar. A opção teria sido por uma solução híbrida.

A proposta de separação contábil e fiscal das estruturas de telefonia fixa (local, longa distância nacional e internacional) e de banda larga provocou polêmica entre os quatro conselheiros da agência reguladora, o que atrasou uma conclusão.

Deverão ser criadas duas empresas, sob o mesmo grupo privado, para cuidar de cada conjunto de ativos. A agência preparará, em 180 dias, uma regulamentação específica para isso. De acordo com Pedro Jaime Ziller, relator das mudanças do PGO, a medida permitirá a novos entrantes usar a infra-estrutura de banda larga que já foi montada e aumentará a competição no setor. A alteração vale não apenas para a Oi e BrT, mas também para Telefônica e Embratel, que são as duas outras concessionárias de telefonia.

Ziller e Sardenberg empenharam-se em assegurar que não houve impasse no conselho em torno da separação de ativos, contrariando informações de que estariam em lados opostos no tratamento da matéria. Segundo eles, a complexidade do assunto obrigou os conselheiros a demorar um pouco mais para tomar uma decisão. "Isso nos obrigou a trabalhar muito até encontrarmos unanimidade", afirmou Sardenberg. O presidente da Anatel garantiu que houve consenso e que "ninguém mudou de voto".

Há outras alterações significativas. O mesmo grupo controlador só poderá ter concessões em, no máximo, duas das três áreas do país. No entanto, para evitar que esses grupos escolham exclusivamente as regiões mais rentáveis para operar, a Anatel irá obrigá-los a estar presentes em todo o território nacional, por meio de uma empresa autorizada nos lugares em que não tiverem presença como concessionária.

Ziller explicou que as operadoras só terão duas opções: ou atuam em apenas uma região ou atuam nacionalmente, sem meio termo. Na prática, isso levará inevitavelmente a Oi a entrar no mercado paulista de telefonia fixa. Como a agência ainda não divulgou a minuta do PGO, não está claro se a atuação que a Oi tem hoje no segmento empresarial, em São Paulo, já é suficiente. A definição de como se dará a autorização da Anatel vai ocorrer durante a formulação do futuro Plano Geral de Metas de Competição (PGMC), que a agência começará a preparar nos próximos meses e estabelecerá obrigações adicionais aos grupos com concessão em mais de uma área.

Se quiserem vender o grupo a terceiros, os controladores terão que se desfazer das duas concessões ao mesmo tempo, jamais de maneira fatiada. Ou seja, ficam com tudo ou sem nada, mas nunca poderão negociar apenas uma das duas concessões. O novo plano de outorgas também prevê "a permanência de capital aberto para o grupo controlador como forma de garantir transparência às concessões", disse Ziller. Ele lembrou que o PGO valerá para as seis concessionárias de telefonia no país e não apenas para a "supertele" que surge da fusão das duas operadoras nacionais.

O conselho da Anatel aprovou ainda o Plano de Atualização do Marco Regulatório (PGR), que define 30 ações para aperfeiçoar as regras do setor. São normas, regulamentos e resoluções técnicas, que dispensam mudança na lei para sua aplicação.

O advogado Guilherme Ieno Costa, especialista em telecomunicações, lembrou que qualquer interessado poderá apresentar sugestões e fazer comentários na consulta pública. Segundo ele, no entanto, a Anatel costuma manter as linhas gerais de suas proposições. "É muito raro a Anatel alterar completamente. Mas essa não é uma consulta qualquer, pois traz amplas modificações para o setor. A agência vai ter toda a cautela ao analisar", disse.